Felisbela Lopes defende divisão pelos vários canais
A professora da Universidade do Minho Felisbela Lopes afirma que o serviço público de televisão deve ter desporto, mas defende uma divisão pelos vários canais consoante as competições. Em entrevista ao DM, a especialista em televisão considera que os blogues podem ser importantes para que a RTP se aperceba do pensamento dos telespectadores. A docente entende que é fulcral que os cidadãos se mantenham vigilantes em relação à sede da RTPN, uma vez que a sua transferência para Lisboa pode reduzir o pluralismo/diversidade ao nível dos plateaux de debate. (Entrevista publicada a 22/07/2008, no Diário do Minho. Foto: Direitos Reservados)
O serviço público de televisão deve ter desporto?
Sim, deve ter desporto. Deve ter futebol e outras modalidades. No futebol, deve ter os grandes desafios e os outros jogos. O deporto é parte integrante da nossa vida enquanto cidadãos. Se nós gostamos de desporto, porque é que a RTP deve subtrair essa área? Não deve. A visão contrária a esta é demasiado elitista e restrita do que é um serviço público. A televisão de serviço público não deve ser a preto e branco, direccionada para as elites, com uma programação que ninguém vê. Devemos dar às pessoas aquilo de que elas gostam, mas com conteúdos de qualidade.
Em que canal deve passar o futebol?
Quando estamos a falar da RTP, estamos a falar de vários canais. Os grandes jogos devem passar no Canal 1. A RTP deve bater-se pelos jogos da Selecção, porque são momentos de congregação de nós próprios enquanto nação. A RTP deve disputar esses jogos, podendo ganhar, ou não, essa disputa. Este ano perdeu o Europeu para TVI. Esta estação de televisão limitou-se a transmitir os jogos, sem qualquer enquadramento. Fez muitos cortes publicitários – o que significa que vendeu bem os jogos –, mas esqueceu-se do essencial, que era contextualizá-los. A TVI limitou-se, no final dos desafios, a fazer entrevistas à frente de um painel com marcas publicitárias. Contrastando com esta cobertura, a RTPN fez algo de mais interessante, que foi juntar nas "Noites do Euro", com Carlos Daniel e Luís Freitas Lobo, dois convidados que sabiam de futebol e conseguiam explicar o desenrolar do Europeu.
A RTP deve bater-se com os outros canais pela transmissão dos jogos?
Há tectos a partir dos quais um serviço público não deve ir, porque a RTP não tem muito dinheiro. Com orçamentos tão apertados, ao gastar muito dinheiro numa das áreas, é evidente que as outras se vão ressentir. E quando falamos dos outros sectores, estamos a falar quase de imediato da informação.
E em relação à Primeira Liga?
A RTP deve bater-se pela Liga até determinado tecto, tal como na Selecção. Em relação aos principais clubes, não me repugna que os principais jogos estejam no Canal1, se esse canal tiver uma programação diversificada. O futebol seria, assim, um programa entre outros.
Esses têm de ser jogos de competições internacionais ou jogos entre os grandes? Também se admite um jogo-treino?
Um jogo-treino não é tão admissível como um jogo dos grandes, dos importantes. Um jogo-treino no Canal 1 não será fácil de enquadrar no tal serviço público generalista, destinado a todos os portugueses.
E os outros clubes?
Todos os clubes querem a transmissão dos seus jogos, porque isso significa receitas para eles. Quando os clubes pequenos reclamam cobertura mediática, estão a reclamá-la por uma questão de visibilidade pública, mas também por uma questão de receitas. A este nível, penso que esses jogos não devem ser emitidos em canal aberto, porque já não abrangem um público assim tão diversificado. Porque é que se emite um jogo do Braga ou do Guimarães e não um desafio da Académica ou de outro clube? É muito difícil fazer este equilíbrio. O que a RTP poderia fazer era apostar num formato tipo "Liga dos Últimos" para os clubes intermédios. Poder-se-ia criar um formato regular que repescasse os clubes intermédios, com imagens dos jogos, tal como, num passado recente, fazia o "Domingo Desportivo". Por que não algo deste género para a RTP 2, que é direccionada para públicos segmentados?
Pode-se exigir o mesmo às estações privadas?
Não, porque elas não cumpririam isso. Os canais privados têm grande dificuldade em aceitar regras de engenharia de programação. Eles têm contratos pontuais com marcas e uma engenharia de programação com muitas regras não lhes dá flexibilidade de negociação.
Que avaliação é que faz do cumprimento do serviço público em matéria desportiva?
A RTP poderia fazer mais relativamente às outras modalidades. Elas poderiam ter maior visibilidade no serviço público de televisão. As outras modalidades estão na RTP 2, mas nem sempre nos horários mais adequados.
Eventualmente no Canal 1?
Aí, talvez ao nível dos noticiários. O "Telejornal" poderia dar mais atenção às outras modalidades. Mas se estamos a pensar no canal generalista público para a transmissão de eventos desportivos dessas modalidades, isso já não faz muito sentido. Estamos a falar de segmentos de mercado, pelo que as modalidades de públicos segmentados estarão mais vocacionadas para a RTP 2 ou para a RTPN. E isso pode aplicar-se até mesmo à Volta a Portugal em Bicicleta, só devendo estar no Canal 1 finais de percursos ou algo mítico como a subida à torre.
Os eventos desportivos podem ser pretextos para um trabalho mais aprofundado?
Um evento deste tipo pode fazer com que os programas de entretenimento montem palco num desses lugares, podendo também desencadear outra noticiabilidade nos telejornais. No Europeu, a SIC aproveitou as equipas que estavam no exterior a cobrir o evento para fazerem reportagens no local, como por exemplo do português que trabalha lá fora ou de determinada comunidade.
sexta-feira, 25 de julho de 2008
«Assinaria uma petição que reclamasse mais presença do país na RTP»
Iniciativas como a petição lançada pelos blogues Avenida Central e Vimaranes podem ter algum reflexo na forma como a RTP é conduzida?
Eu acho muito positivo este tipo de petição, embora defenda que estas iniciativas deveriam ser mais do que reparos pontuais à TV que temos. Era preciso que se dissesse: nós não gostamos da TV que temos, precisamos de uma TV que nos desse isto ou aquilo. Enquanto cidadãos, temos a obrigação de apontar caminhos à RTP. O país real deveria ser mais ruidoso junto da RTP. Por seu turno, a RTP também tem de ouvir os cidadãos, e este é um exercício que merece aprendizagem de ambas as partes. Não é só através do Provedor que a RTP pode ouvir aquilo que os telespectadores pensam.
Eu não assinaria esta petição tal como ela está, mas assinaria uma que reclamasse mais presença do país que somos na antena da RTP. E quando digo o país, digo o país a Norte. Nota-se que ultimamente que a RTPN tem feito um grande esforço para fomentar o debate público com convidados diversificados. É preciso continuar esse caminho. É muito importante. A RTP, como a SIC e a TVI, tem tendência a estar centralizada em Lisboa e tem de haver um esforço para uma maior descentralização. A este nível, a força dos cidadãos é fulcral.
A RTP emite para todo o país, mas cobre apenas uma parte do território?
Eu acho que há algo que deveria merecer mais atenção dos poderes político, cultural, económico… e também dos cidadãos em geral: a reivindicação de canais de TV com redacções fora de Lisboa. Pelo contrato de concessão do serviço público, a RTPN deve ser um canal de vocação regional. E é importante que a sua sede continua a norte. Se a RTPN tiver sede em Lisboa, os debates e as entrevistas vão ser feitos com interlocutores da capital. Isso significaria o empobrecimento da diversidade que este canal tem à noite. Mais do que me preocupar se a RTP transmite jogos do Sporting ou do Benfica, eu preocupar-me-ia em perceber a importância da localização das redacções dos canais de TV. Será que precisamos de um canal por cabo com sede no Porto? Será que isso é importante para o Norte, para o Minho?
Olhando para o Canal 1, a cobertura que faz do país é equilibrada?
O "Jornal da Tarde" é mais equilibrado. Sendo um programa emitido a partir de Gaia, as reportagens são feitas sobretudo no Norte. O local onde a redacção está é importante. Às vezes não percebemos isso, mas como o noticiário trabalha com horários muito apertados, o factor proximidade é importante. Isto faz com o Jornal da Tarde seja mais equilibrado do que o dos outros canais.
Fica-se com ideia de que as delegações regionais da RTP não existem ou passam muito tempo sem produzir...
Eu também tenho essa percepção. Creio que as delegações regionais poderiam dar mais eco do país real.
Há queixas de diversas localidades em relação à cobertura da RTP....
Uma coisa que eu acho bacoca é, por exemplo, dizer-se que a RTP não liga ao São João de Braga. Alguém disse que, em Braga, se passa alguma coisa que merece ser notícia? O que Braga deveria pensar é em ser notícia e fazê-la chegar da melhor forma aos meios de comunicação social nacionais. Braga tem de ser mais pró-activa. Braga nunca mostra que pode ter uma palavra a dizer em relação ao serviço público de TV. Não sei se para a RTP Braga conta muito. Não há muita coisa em Braga que seja promovida à escala nacional. Também Braga não tem elites muito pró-activas. Quando se começou a falar numa eventual saída da RTPN para Lisboa, autarcas, forças económicas, elites culturais movimentaram-se muito em oposição a essa medida. Não vi ninguém de Braga a fazer isso. Posso ter andado distraída… Por outro lado, Braga ainda olha para os canais de TV como se estes estivessem noutra dimensão. Os jornalistas de órgãos regionais e os jornalistas de órgãos nacionais, especialmente os da TV, não são tratados da mesma maneira. É um sinal de algum provincianismo que ainda nos afecta de quando em vez.
Os que reivindicam a atenção do serviço público também têm de fazer alguma coisa para ser notícia...
Achar que a RTP enquanto serviço público deve vir cobrir as iniciativas mais anedóticas e insignificantes é bacoco. Um serviço público existe para ter programas de informação que tenham notícias e não para responder a quotas, embora as algumas directivas da ERC apontam nesse sentido... Enquanto sociedade, devemos ter um escrutínio muito atento em relação ao que a RTP faz relativamente ao poder político que está a governar o país, mas não faz sentido ditar quotas ao serviço público de televisão sem ter em conta se o que está em causa é ou não notícia. Dividir o noticiário por quotas é um mau princípio.
Temos uma audiência muito amorfa?
Um pouco. Faz falta que os telespectadores digam à RTP que existem enquanto público. A intervenção dos blogues pode ser muito positiva, mas estes também devem ser mais pró-activos relativamente à RTP: fazer com que os textos que publicam sejam conhecidos do operador público. É necessário que a RTP saiba o que os blogues andam a fazer.
Há um certo autismo da RTP em relação ao que o público tem a dizer?
Também é verdade. A RTP deveria apostar mais em canais de ligação com as pessoas. Por exemplo, disponibilizar os e-mails dos jornalistas ou pensar em programas com maior interactividade. Um programa em directo deveria disponibilizar um endereço electrónico que permitisse às pessoas dizerem o que pensam. O jornalista Carlos Daniel experimentou isso no "Trio de Ataque" e recebia muitos e-mails. Poderia experimentar-se noutros programas.
O provedor é importante, mas não resolve tudo?
É verdade. A intervenção do provedor é circunscrita. O programa é semanal e tem uma duração reduzida. Os temas não se esgotam e a opinião dos cidadãos acaba por ter um espaço pequeno porque as questões são complexas e é preciso ouvir as duas partes, existindo ainda o condicionalismo de o programa ser feito a partir de Lisboa. O local onde os programas são pensados é de tal forma importante que é preciso uma grande reflexão sobre isso.
Eu acho muito positivo este tipo de petição, embora defenda que estas iniciativas deveriam ser mais do que reparos pontuais à TV que temos. Era preciso que se dissesse: nós não gostamos da TV que temos, precisamos de uma TV que nos desse isto ou aquilo. Enquanto cidadãos, temos a obrigação de apontar caminhos à RTP. O país real deveria ser mais ruidoso junto da RTP. Por seu turno, a RTP também tem de ouvir os cidadãos, e este é um exercício que merece aprendizagem de ambas as partes. Não é só através do Provedor que a RTP pode ouvir aquilo que os telespectadores pensam.
Eu não assinaria esta petição tal como ela está, mas assinaria uma que reclamasse mais presença do país que somos na antena da RTP. E quando digo o país, digo o país a Norte. Nota-se que ultimamente que a RTPN tem feito um grande esforço para fomentar o debate público com convidados diversificados. É preciso continuar esse caminho. É muito importante. A RTP, como a SIC e a TVI, tem tendência a estar centralizada em Lisboa e tem de haver um esforço para uma maior descentralização. A este nível, a força dos cidadãos é fulcral.
A RTP emite para todo o país, mas cobre apenas uma parte do território?
Eu acho que há algo que deveria merecer mais atenção dos poderes político, cultural, económico… e também dos cidadãos em geral: a reivindicação de canais de TV com redacções fora de Lisboa. Pelo contrato de concessão do serviço público, a RTPN deve ser um canal de vocação regional. E é importante que a sua sede continua a norte. Se a RTPN tiver sede em Lisboa, os debates e as entrevistas vão ser feitos com interlocutores da capital. Isso significaria o empobrecimento da diversidade que este canal tem à noite. Mais do que me preocupar se a RTP transmite jogos do Sporting ou do Benfica, eu preocupar-me-ia em perceber a importância da localização das redacções dos canais de TV. Será que precisamos de um canal por cabo com sede no Porto? Será que isso é importante para o Norte, para o Minho?
Olhando para o Canal 1, a cobertura que faz do país é equilibrada?
O "Jornal da Tarde" é mais equilibrado. Sendo um programa emitido a partir de Gaia, as reportagens são feitas sobretudo no Norte. O local onde a redacção está é importante. Às vezes não percebemos isso, mas como o noticiário trabalha com horários muito apertados, o factor proximidade é importante. Isto faz com o Jornal da Tarde seja mais equilibrado do que o dos outros canais.
Fica-se com ideia de que as delegações regionais da RTP não existem ou passam muito tempo sem produzir...
Eu também tenho essa percepção. Creio que as delegações regionais poderiam dar mais eco do país real.
Há queixas de diversas localidades em relação à cobertura da RTP....
Uma coisa que eu acho bacoca é, por exemplo, dizer-se que a RTP não liga ao São João de Braga. Alguém disse que, em Braga, se passa alguma coisa que merece ser notícia? O que Braga deveria pensar é em ser notícia e fazê-la chegar da melhor forma aos meios de comunicação social nacionais. Braga tem de ser mais pró-activa. Braga nunca mostra que pode ter uma palavra a dizer em relação ao serviço público de TV. Não sei se para a RTP Braga conta muito. Não há muita coisa em Braga que seja promovida à escala nacional. Também Braga não tem elites muito pró-activas. Quando se começou a falar numa eventual saída da RTPN para Lisboa, autarcas, forças económicas, elites culturais movimentaram-se muito em oposição a essa medida. Não vi ninguém de Braga a fazer isso. Posso ter andado distraída… Por outro lado, Braga ainda olha para os canais de TV como se estes estivessem noutra dimensão. Os jornalistas de órgãos regionais e os jornalistas de órgãos nacionais, especialmente os da TV, não são tratados da mesma maneira. É um sinal de algum provincianismo que ainda nos afecta de quando em vez.
Os que reivindicam a atenção do serviço público também têm de fazer alguma coisa para ser notícia...
Achar que a RTP enquanto serviço público deve vir cobrir as iniciativas mais anedóticas e insignificantes é bacoco. Um serviço público existe para ter programas de informação que tenham notícias e não para responder a quotas, embora as algumas directivas da ERC apontam nesse sentido... Enquanto sociedade, devemos ter um escrutínio muito atento em relação ao que a RTP faz relativamente ao poder político que está a governar o país, mas não faz sentido ditar quotas ao serviço público de televisão sem ter em conta se o que está em causa é ou não notícia. Dividir o noticiário por quotas é um mau princípio.
Temos uma audiência muito amorfa?
Um pouco. Faz falta que os telespectadores digam à RTP que existem enquanto público. A intervenção dos blogues pode ser muito positiva, mas estes também devem ser mais pró-activos relativamente à RTP: fazer com que os textos que publicam sejam conhecidos do operador público. É necessário que a RTP saiba o que os blogues andam a fazer.
Há um certo autismo da RTP em relação ao que o público tem a dizer?
Também é verdade. A RTP deveria apostar mais em canais de ligação com as pessoas. Por exemplo, disponibilizar os e-mails dos jornalistas ou pensar em programas com maior interactividade. Um programa em directo deveria disponibilizar um endereço electrónico que permitisse às pessoas dizerem o que pensam. O jornalista Carlos Daniel experimentou isso no "Trio de Ataque" e recebia muitos e-mails. Poderia experimentar-se noutros programas.
O provedor é importante, mas não resolve tudo?
É verdade. A intervenção do provedor é circunscrita. O programa é semanal e tem uma duração reduzida. Os temas não se esgotam e a opinião dos cidadãos acaba por ter um espaço pequeno porque as questões são complexas e é preciso ouvir as duas partes, existindo ainda o condicionalismo de o programa ser feito a partir de Lisboa. O local onde os programas são pensados é de tal forma importante que é preciso uma grande reflexão sobre isso.
«Os jornalistas cometem grandes pecadilhos»
O jornalismo desportivo é um “mundo à parte” ou deve obedecer exactamente aos mesmos critérios que noutras áreas?
O desporto é sobretudo um jogo de emoções, que não se mediatiza sem os adjectivos. Isso comporta grandes riscos, pois pode-se estar a ser parcial ao adjectivar.
Os jornalistas cometem grandes pecadilhos. Basta olhar para os títulos dos jornais desportivos para ver que os juízos de valor são extremamente frequentes, perigosos e parciais. Muitas vezes, sobretudo nos jornais, os jornalistas fazem o jogo dos empresários. Os artigos sobre os passes dos jogadores normalmente não têm fontes. O jornalista adivinhou? Mesmo nas redacções, a secção de desporto é um mundo à parte.
Os meios de comunicação social têm uma importância fundamental na mediatização do desporto?
Há uma economia fortíssima do futebol, porque existem meios de comunicação social. As marcas que estão a patrocinar os jogos só estão lá porque existem as televisões, embora agora esteja a surgir com alguma força a Internet. Mais importante do que o futebol ou o jogo propriamente dito é a economia do jogo. Trata-se de uma verdadeira indústria que tem cruzamentos com as áreas do entretenimento, da música, das marcas, da moda... Não é por acaso que temos uma marca da selecção. Saímos à rua porque somos pela selecção, mas também porque existe uma economia muito poderosa à sua volta.
O desporto é sobretudo um jogo de emoções, que não se mediatiza sem os adjectivos. Isso comporta grandes riscos, pois pode-se estar a ser parcial ao adjectivar.
Os jornalistas cometem grandes pecadilhos. Basta olhar para os títulos dos jornais desportivos para ver que os juízos de valor são extremamente frequentes, perigosos e parciais. Muitas vezes, sobretudo nos jornais, os jornalistas fazem o jogo dos empresários. Os artigos sobre os passes dos jogadores normalmente não têm fontes. O jornalista adivinhou? Mesmo nas redacções, a secção de desporto é um mundo à parte.
Os meios de comunicação social têm uma importância fundamental na mediatização do desporto?
Há uma economia fortíssima do futebol, porque existem meios de comunicação social. As marcas que estão a patrocinar os jogos só estão lá porque existem as televisões, embora agora esteja a surgir com alguma força a Internet. Mais importante do que o futebol ou o jogo propriamente dito é a economia do jogo. Trata-se de uma verdadeira indústria que tem cruzamentos com as áreas do entretenimento, da música, das marcas, da moda... Não é por acaso que temos uma marca da selecção. Saímos à rua porque somos pela selecção, mas também porque existe uma economia muito poderosa à sua volta.
sábado, 12 de julho de 2008
Filhos e dependência económica adiam ruptura do ciclo das agressões
Antónia (nome fictício) sentia-se totalmente dependente do marido que a agredia, tal como um ramo em relação à árvore. Durante muito tempo sofreu em silêncio, viu o olhar dos filhos a ficar cada vez mais triste e tentou suicidar-se. Um dia decidiu tomar as rédeas da sua vida e saiu de casa. Agora, faz contas para conseguir matar a fome, mas sente-se viva. De ramo passou a tronco. E os filhos voltaram a sorrir.
Esta santomense casou jovem. Durante os primeiros tempos de convivência com o marido viveu em permanente lua-de-mel com um homem «amoroso, carinhoso, companheiro». Mas depois tudo mudou. O homem de sonho deu lugar a uma pessoa que se exaltava à mínima coisa. Um objecto fora do sítio era motivo mais do que suficiente para uma cena. Com os ciúmes infundados, em Julho de 1998, a agressão física passou a acompanhar a violência psicológica. «Ai Jesus...», suspira.
Antónia amava-o muito e queria estar ao lado dele. Sentia-se sozinha em Portugal, longe da família e com dois filhos nos braços. «Tinha consciência de que ele me fazia mal, mas eu procurava pensar na parte boa para manter a família – ou melhor, aquilo que aparentava ser uma família – unida», conta.
Esta mulher «tinha esperança» que o João (nome fictício) mudasse. Acreditava quando ele serenava. Mas tudo acabava por voltar a ser turbulento. «Não podia falar com ninguém, não podia conviver, porque ele tinha medo que eu contasse a alguém. Vivia num meio muito fechado, isolada dos amigos», afirma.
Em desespero, tentou o suicídio. Queria desaparecer. Enquanto estava internada, uma amiga confrontou-a com o seu acto. Queria entender o que se estava a passar. Queria perceber o motivo da tristeza profunda e constante. Ela acabou por contar. O homem foi «chamado à razão». Antónia voltou para casa e ouviu o marido dizer: «Achas bem o que fizeste? Coitado do teu filho...».
A mulher descobriu «de maneira dolorosa» que o homem com quem vivia não era o homem que amava. «Deixei tudo para vir ter com ele e fiquei sozinha, sem amor e sem amigos», revela. As agressões eram uma constante. No hospital mantinha as mentiras, mesmo quando o médico lhe dizia que era impossível que o que ela dizia fosse verdade.
O ponto de ruptura deu-se no ano passado, quando João agrediu uma vizinha que se encontrava a falar com Antónia. Foi ao hospital e à Polícia. No dia seguinte, foi a vez dele apresentar queixa dela na esquadra. A mulher contactou a linha de emergência social e informou-se sobre o que tinha de fazer. Era chegado o tempo de pegar nos filhos e nalgumas coisas e de sair de casa. Durante três dias esteve num alojamento, depois deram-lhe dinheiro para um mês de renda. Estava na altura de pôr as suas asas à prova e voar sozinha.
«Nos primeiros tempos, a luta é muito complicada. Tem de se pensar muito bem para conseguir pagar a renda, a água, a luz. Quando se pensa em fazer a denúncia tem de se reflectir muito bem, porque às vezes as mulheres querem-se ver livres do problema e esquecem-se doutro que está a chegar: o das contas para pagar. Os apoios da Segurança Social tardam a chegar», adverte. Antónia ainda tentou ir a casa buscar mais coisas, mas João já tinha mudado a fechadura.
Esta jovem já pensou se não valeria a pena pôr de lado o orgulho e voltar para «a toca do lobo», como lhe chama, mas recusou a ideia porque lá em casa mora «o mesmo monstro» do qual fugiu. «Eu não tinha vida própria. Era um complemento dele, uma ramificação doutra vida, um ramo que não conseguia viver sem esse tronco. Agora tenho vida própria. Eu existo», afirma. Depois de conhecer o sabor da liberdade, recusa a possibilidade de «voltar para a prisão pelo próprio pé».
Antónia não consegue pensar só em si. Os meninos estão primeiro. O mais velho também foi vítima de agressões e o mais novo assistia ao que se passava em casa. «Os meus filhos tinham tudo, menos um sorriso. O mais velho nem conseguia olhar as pessoas nos olhos», diz, sublinhando que «não há nada mais gratificante» do que ver os miúdos felizes, apesar dos «meios limitados».
A refazer a vida, esta mulher pretende retomar o curso universitário que interrompeu, se conseguir arranjar dinheiro. O que se propõe é trabalhar, cuidar dos filhos e estudar. Sabe que não será fácil, mas está disposta a arriscar porque aprendeu que é capaz de algumas proezas reservadas às heroínas. «Estou feliz por ver os meus filhos felizes», assegura. O resto virá por acréscimo.
Obstáculos à denúncia
A “estória” de Antónia é reveladora das estratégias usadas pelos agressores para dificultarem a denúncia. Apesar da unanimidade acerca do aumento da intolerância em relação à violência doméstica, a verdade é que os filhos, a dependência económica, o isolamento social das vítimas que os agressores vão acentuando e as ameaças, muitas vezes de morte, tornam-se obstáculos que adiam a ruptura.
Eva Ferreira, coordenadora do Projecto Atena, salienta que uma parte considerável das vítimas que procuram os centros de informação e acompanhamento «não têm muitas qualificações» e possuem rendimentos reduzidos. «Algumas mulheres são vítimas de violência doméstica há vários anos, mas aguentam por causa dos filhos ou porque têm medo de não terem rendimentos para aguentar sozinhas, sobretudo quando têm filhos», acrescenta.
Teresa Sofia Silva, do Gabinete de Braga da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), tem uma experiência semelhante. Algumas mulheres chegam desesperadas em busca de alternativas, mas acabam por voltar para casa e para o agressor. «O ciclo da violência é assim mesmo. As mulheres acreditam que os companheiros vão mudar porque depois da agressão vem o pedido de desculpas e a fase de lua-de-mel. Posteriormente, vem novamente a agressão e um novo pedido de desculpa. As mulheres acreditam que é desta que eles se vão emendar», refere a responsável pela estrutura bracarense da APAV.
A técnica diz que se estas mulheres voltarem a pedir ajuda, recomeça-se o processo, com a apresentação das várias opções que se colocam. «A decisão é sempre da vítima», assegura.
A permanência em casa pode, no entanto, revelar-se perigosa, dado que basta que, um dia, um dos filhos se sinta compelido a defender a mãe e acabe ferido ou mesmo morto. Sem que haja qualquer premeditação, o pior pode acontecer. E aí, quem permitiu o arrastar da situação de violência pode transformar-se indirectamente no responsável pelo destino trágico de uma criança.
Esta santomense casou jovem. Durante os primeiros tempos de convivência com o marido viveu em permanente lua-de-mel com um homem «amoroso, carinhoso, companheiro». Mas depois tudo mudou. O homem de sonho deu lugar a uma pessoa que se exaltava à mínima coisa. Um objecto fora do sítio era motivo mais do que suficiente para uma cena. Com os ciúmes infundados, em Julho de 1998, a agressão física passou a acompanhar a violência psicológica. «Ai Jesus...», suspira.
Antónia amava-o muito e queria estar ao lado dele. Sentia-se sozinha em Portugal, longe da família e com dois filhos nos braços. «Tinha consciência de que ele me fazia mal, mas eu procurava pensar na parte boa para manter a família – ou melhor, aquilo que aparentava ser uma família – unida», conta.
Esta mulher «tinha esperança» que o João (nome fictício) mudasse. Acreditava quando ele serenava. Mas tudo acabava por voltar a ser turbulento. «Não podia falar com ninguém, não podia conviver, porque ele tinha medo que eu contasse a alguém. Vivia num meio muito fechado, isolada dos amigos», afirma.
Em desespero, tentou o suicídio. Queria desaparecer. Enquanto estava internada, uma amiga confrontou-a com o seu acto. Queria entender o que se estava a passar. Queria perceber o motivo da tristeza profunda e constante. Ela acabou por contar. O homem foi «chamado à razão». Antónia voltou para casa e ouviu o marido dizer: «Achas bem o que fizeste? Coitado do teu filho...».
A mulher descobriu «de maneira dolorosa» que o homem com quem vivia não era o homem que amava. «Deixei tudo para vir ter com ele e fiquei sozinha, sem amor e sem amigos», revela. As agressões eram uma constante. No hospital mantinha as mentiras, mesmo quando o médico lhe dizia que era impossível que o que ela dizia fosse verdade.
O ponto de ruptura deu-se no ano passado, quando João agrediu uma vizinha que se encontrava a falar com Antónia. Foi ao hospital e à Polícia. No dia seguinte, foi a vez dele apresentar queixa dela na esquadra. A mulher contactou a linha de emergência social e informou-se sobre o que tinha de fazer. Era chegado o tempo de pegar nos filhos e nalgumas coisas e de sair de casa. Durante três dias esteve num alojamento, depois deram-lhe dinheiro para um mês de renda. Estava na altura de pôr as suas asas à prova e voar sozinha.
«Nos primeiros tempos, a luta é muito complicada. Tem de se pensar muito bem para conseguir pagar a renda, a água, a luz. Quando se pensa em fazer a denúncia tem de se reflectir muito bem, porque às vezes as mulheres querem-se ver livres do problema e esquecem-se doutro que está a chegar: o das contas para pagar. Os apoios da Segurança Social tardam a chegar», adverte. Antónia ainda tentou ir a casa buscar mais coisas, mas João já tinha mudado a fechadura.
Esta jovem já pensou se não valeria a pena pôr de lado o orgulho e voltar para «a toca do lobo», como lhe chama, mas recusou a ideia porque lá em casa mora «o mesmo monstro» do qual fugiu. «Eu não tinha vida própria. Era um complemento dele, uma ramificação doutra vida, um ramo que não conseguia viver sem esse tronco. Agora tenho vida própria. Eu existo», afirma. Depois de conhecer o sabor da liberdade, recusa a possibilidade de «voltar para a prisão pelo próprio pé».
Antónia não consegue pensar só em si. Os meninos estão primeiro. O mais velho também foi vítima de agressões e o mais novo assistia ao que se passava em casa. «Os meus filhos tinham tudo, menos um sorriso. O mais velho nem conseguia olhar as pessoas nos olhos», diz, sublinhando que «não há nada mais gratificante» do que ver os miúdos felizes, apesar dos «meios limitados».
A refazer a vida, esta mulher pretende retomar o curso universitário que interrompeu, se conseguir arranjar dinheiro. O que se propõe é trabalhar, cuidar dos filhos e estudar. Sabe que não será fácil, mas está disposta a arriscar porque aprendeu que é capaz de algumas proezas reservadas às heroínas. «Estou feliz por ver os meus filhos felizes», assegura. O resto virá por acréscimo.
Obstáculos à denúncia
A “estória” de Antónia é reveladora das estratégias usadas pelos agressores para dificultarem a denúncia. Apesar da unanimidade acerca do aumento da intolerância em relação à violência doméstica, a verdade é que os filhos, a dependência económica, o isolamento social das vítimas que os agressores vão acentuando e as ameaças, muitas vezes de morte, tornam-se obstáculos que adiam a ruptura.
Eva Ferreira, coordenadora do Projecto Atena, salienta que uma parte considerável das vítimas que procuram os centros de informação e acompanhamento «não têm muitas qualificações» e possuem rendimentos reduzidos. «Algumas mulheres são vítimas de violência doméstica há vários anos, mas aguentam por causa dos filhos ou porque têm medo de não terem rendimentos para aguentar sozinhas, sobretudo quando têm filhos», acrescenta.
Teresa Sofia Silva, do Gabinete de Braga da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), tem uma experiência semelhante. Algumas mulheres chegam desesperadas em busca de alternativas, mas acabam por voltar para casa e para o agressor. «O ciclo da violência é assim mesmo. As mulheres acreditam que os companheiros vão mudar porque depois da agressão vem o pedido de desculpas e a fase de lua-de-mel. Posteriormente, vem novamente a agressão e um novo pedido de desculpa. As mulheres acreditam que é desta que eles se vão emendar», refere a responsável pela estrutura bracarense da APAV.
A técnica diz que se estas mulheres voltarem a pedir ajuda, recomeça-se o processo, com a apresentação das várias opções que se colocam. «A decisão é sempre da vítima», assegura.
A permanência em casa pode, no entanto, revelar-se perigosa, dado que basta que, um dia, um dos filhos se sinta compelido a defender a mãe e acabe ferido ou mesmo morto. Sem que haja qualquer premeditação, o pior pode acontecer. E aí, quem permitiu o arrastar da situação de violência pode transformar-se indirectamente no responsável pelo destino trágico de uma criança.
Cancro já não é sinónimo de sentença de morte
A palavra ainda provoca terror. Os olhos baixam-se e o sobrolho franze-se quando se ouve falar em cancro. Quase todos têm um caso triste para contar, seja de um familiar, de um amigo ou de um conhecido. Mas também há inúmeros relatos de quem enfrentou este temível inimigo, venceu e continuou a viver. Esta doença é, cada vez mais, feita de esperança. Globalmente, há cura para metade dos casos e, ao contrário do que muitas vezes se pensa, em Portugal há praticamente os mesmos tratamentos que nos países tidos como de referência. Enquanto se continua a aguardar pela cura total, a história desta patologia faz-se a partir dos testemunhos de quem sobreviveu, de quem viu partir os seus entes queridos e de quem diariamente assiste médica e espiritualmente os doentes oncológicos. (Reportagem publicada no Diário do Minho em Março de 2008)
Gonçalo (nome fictício) tem 24 anos. As pequenas rugas que tem na cara tornam-se mais evidentes e as palavras menos fluentes quando começa a falar do linfoma que o tornou «eventualmente» numa pessoa «talvez um bocadinho mais calma e ponderada».
Nas férias de Verão de 2006 descobriu um gânglio abaixo do pescoço e ficou preocupado. Foi ao médico, que o mandou fazer uma ecografia e um raio-X. Teve consciência de que «poderia ser algo grave». Acabou por lhe ser retirado o gânglio para fazer o exame histológico. O jovem foi-se apercebendo aos poucos do que tinha, até pelo facto de possuir conhecimentos na área da saúde. Soube que tinha uma doença do foro oncológico sem que alguém lhe tivesse dito.
«Pensava em viver um dia de cada vez. Sem conhecer o resultado do exame não valia a pena pensar no que é que iria acontecer depois de conhecer o resultado. Isso seria sofrer por antecipação. É uma fase da vida em que não vale a pena fazer muitos planos. Todas as hipóteses estão em aberto e até termos a certeza absoluta da realidade não vale a pena estarmos a sofrer por antecipação», revela.
O mais difícil foi ultrapassar as três semanas entre a retirada do gânglio e o diagnóstico do tipo de neoplasia. Disso dependia ter uma perspectiva de vida de dois ou três anos ou uma esperança média muito aproximada à das outras pessoas. Continuou a ir às aulas, mas também foi passear. Quase não mudou os seus hábitos pessoais, apesar de «pensar muito leve e inconscientemente em todos os cenários». «Fiz uma vida normal», assegura.
Sempre encarou o problema de frente. Deteve-se «cinco segundos» a pensar na pergunta «porquê a mim?». «Não vale a pena perguntar porquê. É uma perda de tempo ocuparmo-nos com o que são as evidências. Eu tinha um problema e tinha de resolvê-lo e isso passava por ir ao médico, obter uma proposta terapêutica, cumprir o tratamento e aguardar», explica.
Tinha, afinal, «o mais brando» dos vários tipos de linfomas, o que foi um factor adicional de motivação para o tratamento. No entanto, admite que o tempo em que fez radioterapia e quimioterapia foi difícil, sobretudo porque o tratamento foi extenuante do ponto de vista físico. «A quimioterapia causa sintomas que são algo desagradáveis, mas com os quais ao longo dos tempo nos vamos habituando a lidar», conta.
Com os tratamentos veio «o estigma da queda do cabelo», como lhe chama. «É, obviamente, um factor adicional de sofrimento e de confronto diário com a nossa condição de doentes. Antes da queda do cabelo é mais fácil esquecermos a doença. Depois temos essa evidência cada vez que olhamos para o espelho. Ainda que possamos sentir náuseas e vómitos, não os vemos, não os temos perante os nossos olhos, que são um potente estimulador de emoções», admite.
Os que lhe estavam próximos reagiram pior do que ele. Gonçalo tinha «uma forma muito própria de brincar com a situação, o que num ou noutro momento chegou a ofender algumas pessoas». «Houve pessoas que desapareceram por uns tempos e que mandaram mensagens a pedir desculpa porque não tinham coragem para me encarar transfigurado pelos tratamentos altamente debilitantes», afirma.
As reacções fora do círculo mais próximo foram de compreensão. «O cancro é uma doença que ainda tem um enorme impacto social, por gerar a sensação de pena, mas também por não motivar juízos de valor que tantas vezes destroem a compaixão que devemos ter por todos os doentes. A sociedade organiza-se muito bem para apoiar as pessoas com cancro, quer através das condições nas unidades de saúde, quer da ajuda psicológica», declara.
Ao longo de nove meses passou pelo Hospital de São Marcos, em Braga, e pelo Instituto Português de Oncologia do Porto. Chorou três vezes. Agora, que «o prognóstico é excelente», elogia a forma como foi tratado. «Em Portugal existem excelentes condições para o tratamento do doente oncológico, o que contrasta com as condições às vezes deficientes para o tratamento de outros tipos de doenças», salienta.
Com uma pequena gargalhada algo forçada, define cancro como «uma doença semelhante a muitas outras, cuja imagem terrífica que a sociedade ainda lhe empresta é cada vez mais exagerada. Há doenças com consequências que são mais nefastas e os tratamentos mais incipientes, para as quais a sociedade ainda não está sensibilizada».
Portugal tem 99 por cento dos tratamentos doutros países
O oncologista do Hospital de S. Marcos Herlander Marques refere que «o cancro ainda é uma doença com um potencial de mortalidade elevado», mas na qual já se conseguem curar 50 por cento das pessoas. «Conseguimos elevadas taxas de cura utilizando a cirurgia, a quimioterapia, a radioterapia e mais recentemente alguns fármacos que actuam activando o sistema imunológico. Algumas doenças são curáveis quase a cem por cento e outras menos», explica.
O médico diz que «há a ideia errónea de que o cancro está a aumentar e de que está a crescer fruto da poluição, da má alimentação, quando isso pode contribuir apenas marginalmente para que se registem mais casos». «Mesmo que conseguíssemos fazer desaparecer todos os factores de risco relacionados com o cancro, ele continuava a aparecer. As doenças malignas têm vindo a aumentar em todo o mundo essencialmente devido ao envelhecimento da população», afirma.
O clínico salienta que os principais factores de risco são o envelhecimento e o tabagismo. Há algumas infecções, como a síndroma da imunodeficiência adquirida, mais conhecida por sida, que, ao diminuírem a imunidade, aumentam o risco de cancro. Outro grupo de factores prende-se com as doenças que obrigam ao transplante de órgãos: como as pessoas ficam a tomar imunosupressores, têm a imunidade baixa pelo que há maior risco de doenças oncológicas.
Em relação aos tratamentos, o oncologista declara que «99 por cento são semelhantes aos que se fazem em qualquer parte do mundo, quer na Europa, quer nos EUA». «Há uma pequena percentagem de tratamentos, que são novos e experimentais, que estão apenas a ser testados nos EUA e alguns países europeus. Esses são tratamentos em que não se sabe quais vão ser os resultados a longo prazo. Em termos de tratamento standard, fazemos tudo o que se faz nas outras partes do mundo», assegura.
No tocante às estruturas de saúde, diz que as condições têm vindo a melhorar significativamente ao longo dos últimos 20 anos, existindo uma rede oncológica que ainda continua a ser melhorada. «As expectativas das pessoas aumentaram, mas tem havido uma resposta à altura», afiança.
Referindo-se ao S. Marcos, sustenta que as condições de ambulatório são boas e que o internamento só poderá melhorar com as novas instalações. O número de casos de cancro que chegam a esta unidade tem aumentado, mas sem que isso signifique que a doença tem subido entre população. Este acréscimo dá-se porque o hospital é um centro de referência. Na área das doenças malignas do sangue, há cerca de 120 novos casos por ano, sendo que globalmente há uma cura na ordem dos 50 por cento.
Herlander Marques perspectiva que, nos próximos anos, vai ser preciso aumentar o número de oncologistas, para que seja possível manter a proximidade na relação com os doentes. «A quantidade de doentes por médico é tal que começa a faltar o tempo necessário para um diálogo profundo com os pacientes. E se o doente não esclarece as todas as suas dúvidas pode ficar angustiado», adianta.
Em seu entender, as pessoas que, em Portugal, trabalham na área da oncologia são «muito ligadas aos doentes, muito interessadas pelo seu bem-estar». «Se a determinado momento não conseguem aumentar a quantidade de vida, pelo menos melhoram a qualidade», frisa. Da mesma forma, também os doentes e as respectivas famílias acabam por ter uma ligação muito forte com os clínicos, porque se apercebem que tudo é feito por eles.
Segundo os indicadores de saúde por município apresentados no Anuário Estatístico da Região Norte de 2006, com dados relativos a 2005, a taxa de mortalidade por tumores malignos no Minho-Lima foi de 2,5 por cento, no Ave de 1,7 por cento e no Cávado de 1,6 por cento, com valores inferiores à taxa de mortalidade por doenças do aparelho respiratório, que surgem com, respectivamente, 4,4 por cento, 2,3 por cento e 2,2 por cento.
Gonçalo (nome fictício) tem 24 anos. As pequenas rugas que tem na cara tornam-se mais evidentes e as palavras menos fluentes quando começa a falar do linfoma que o tornou «eventualmente» numa pessoa «talvez um bocadinho mais calma e ponderada».
Nas férias de Verão de 2006 descobriu um gânglio abaixo do pescoço e ficou preocupado. Foi ao médico, que o mandou fazer uma ecografia e um raio-X. Teve consciência de que «poderia ser algo grave». Acabou por lhe ser retirado o gânglio para fazer o exame histológico. O jovem foi-se apercebendo aos poucos do que tinha, até pelo facto de possuir conhecimentos na área da saúde. Soube que tinha uma doença do foro oncológico sem que alguém lhe tivesse dito.
«Pensava em viver um dia de cada vez. Sem conhecer o resultado do exame não valia a pena pensar no que é que iria acontecer depois de conhecer o resultado. Isso seria sofrer por antecipação. É uma fase da vida em que não vale a pena fazer muitos planos. Todas as hipóteses estão em aberto e até termos a certeza absoluta da realidade não vale a pena estarmos a sofrer por antecipação», revela.
O mais difícil foi ultrapassar as três semanas entre a retirada do gânglio e o diagnóstico do tipo de neoplasia. Disso dependia ter uma perspectiva de vida de dois ou três anos ou uma esperança média muito aproximada à das outras pessoas. Continuou a ir às aulas, mas também foi passear. Quase não mudou os seus hábitos pessoais, apesar de «pensar muito leve e inconscientemente em todos os cenários». «Fiz uma vida normal», assegura.
Sempre encarou o problema de frente. Deteve-se «cinco segundos» a pensar na pergunta «porquê a mim?». «Não vale a pena perguntar porquê. É uma perda de tempo ocuparmo-nos com o que são as evidências. Eu tinha um problema e tinha de resolvê-lo e isso passava por ir ao médico, obter uma proposta terapêutica, cumprir o tratamento e aguardar», explica.
Tinha, afinal, «o mais brando» dos vários tipos de linfomas, o que foi um factor adicional de motivação para o tratamento. No entanto, admite que o tempo em que fez radioterapia e quimioterapia foi difícil, sobretudo porque o tratamento foi extenuante do ponto de vista físico. «A quimioterapia causa sintomas que são algo desagradáveis, mas com os quais ao longo dos tempo nos vamos habituando a lidar», conta.
Com os tratamentos veio «o estigma da queda do cabelo», como lhe chama. «É, obviamente, um factor adicional de sofrimento e de confronto diário com a nossa condição de doentes. Antes da queda do cabelo é mais fácil esquecermos a doença. Depois temos essa evidência cada vez que olhamos para o espelho. Ainda que possamos sentir náuseas e vómitos, não os vemos, não os temos perante os nossos olhos, que são um potente estimulador de emoções», admite.
Os que lhe estavam próximos reagiram pior do que ele. Gonçalo tinha «uma forma muito própria de brincar com a situação, o que num ou noutro momento chegou a ofender algumas pessoas». «Houve pessoas que desapareceram por uns tempos e que mandaram mensagens a pedir desculpa porque não tinham coragem para me encarar transfigurado pelos tratamentos altamente debilitantes», afirma.
As reacções fora do círculo mais próximo foram de compreensão. «O cancro é uma doença que ainda tem um enorme impacto social, por gerar a sensação de pena, mas também por não motivar juízos de valor que tantas vezes destroem a compaixão que devemos ter por todos os doentes. A sociedade organiza-se muito bem para apoiar as pessoas com cancro, quer através das condições nas unidades de saúde, quer da ajuda psicológica», declara.
Ao longo de nove meses passou pelo Hospital de São Marcos, em Braga, e pelo Instituto Português de Oncologia do Porto. Chorou três vezes. Agora, que «o prognóstico é excelente», elogia a forma como foi tratado. «Em Portugal existem excelentes condições para o tratamento do doente oncológico, o que contrasta com as condições às vezes deficientes para o tratamento de outros tipos de doenças», salienta.
Com uma pequena gargalhada algo forçada, define cancro como «uma doença semelhante a muitas outras, cuja imagem terrífica que a sociedade ainda lhe empresta é cada vez mais exagerada. Há doenças com consequências que são mais nefastas e os tratamentos mais incipientes, para as quais a sociedade ainda não está sensibilizada».
Portugal tem 99 por cento dos tratamentos doutros países
O oncologista do Hospital de S. Marcos Herlander Marques refere que «o cancro ainda é uma doença com um potencial de mortalidade elevado», mas na qual já se conseguem curar 50 por cento das pessoas. «Conseguimos elevadas taxas de cura utilizando a cirurgia, a quimioterapia, a radioterapia e mais recentemente alguns fármacos que actuam activando o sistema imunológico. Algumas doenças são curáveis quase a cem por cento e outras menos», explica.
O médico diz que «há a ideia errónea de que o cancro está a aumentar e de que está a crescer fruto da poluição, da má alimentação, quando isso pode contribuir apenas marginalmente para que se registem mais casos». «Mesmo que conseguíssemos fazer desaparecer todos os factores de risco relacionados com o cancro, ele continuava a aparecer. As doenças malignas têm vindo a aumentar em todo o mundo essencialmente devido ao envelhecimento da população», afirma.
O clínico salienta que os principais factores de risco são o envelhecimento e o tabagismo. Há algumas infecções, como a síndroma da imunodeficiência adquirida, mais conhecida por sida, que, ao diminuírem a imunidade, aumentam o risco de cancro. Outro grupo de factores prende-se com as doenças que obrigam ao transplante de órgãos: como as pessoas ficam a tomar imunosupressores, têm a imunidade baixa pelo que há maior risco de doenças oncológicas.
Em relação aos tratamentos, o oncologista declara que «99 por cento são semelhantes aos que se fazem em qualquer parte do mundo, quer na Europa, quer nos EUA». «Há uma pequena percentagem de tratamentos, que são novos e experimentais, que estão apenas a ser testados nos EUA e alguns países europeus. Esses são tratamentos em que não se sabe quais vão ser os resultados a longo prazo. Em termos de tratamento standard, fazemos tudo o que se faz nas outras partes do mundo», assegura.
No tocante às estruturas de saúde, diz que as condições têm vindo a melhorar significativamente ao longo dos últimos 20 anos, existindo uma rede oncológica que ainda continua a ser melhorada. «As expectativas das pessoas aumentaram, mas tem havido uma resposta à altura», afiança.
Referindo-se ao S. Marcos, sustenta que as condições de ambulatório são boas e que o internamento só poderá melhorar com as novas instalações. O número de casos de cancro que chegam a esta unidade tem aumentado, mas sem que isso signifique que a doença tem subido entre população. Este acréscimo dá-se porque o hospital é um centro de referência. Na área das doenças malignas do sangue, há cerca de 120 novos casos por ano, sendo que globalmente há uma cura na ordem dos 50 por cento.
Herlander Marques perspectiva que, nos próximos anos, vai ser preciso aumentar o número de oncologistas, para que seja possível manter a proximidade na relação com os doentes. «A quantidade de doentes por médico é tal que começa a faltar o tempo necessário para um diálogo profundo com os pacientes. E se o doente não esclarece as todas as suas dúvidas pode ficar angustiado», adianta.
Em seu entender, as pessoas que, em Portugal, trabalham na área da oncologia são «muito ligadas aos doentes, muito interessadas pelo seu bem-estar». «Se a determinado momento não conseguem aumentar a quantidade de vida, pelo menos melhoram a qualidade», frisa. Da mesma forma, também os doentes e as respectivas famílias acabam por ter uma ligação muito forte com os clínicos, porque se apercebem que tudo é feito por eles.
Segundo os indicadores de saúde por município apresentados no Anuário Estatístico da Região Norte de 2006, com dados relativos a 2005, a taxa de mortalidade por tumores malignos no Minho-Lima foi de 2,5 por cento, no Ave de 1,7 por cento e no Cávado de 1,6 por cento, com valores inferiores à taxa de mortalidade por doenças do aparelho respiratório, que surgem com, respectivamente, 4,4 por cento, 2,3 por cento e 2,2 por cento.
«Não é por tirar um peito que a vida acaba»
Voluntárias apoiam vítimas de cancro de mama a vencer e viver
O Movimento Vencer e Viver apoia mulheres vítimas de cancro de mama. A ausência do seio, a queda do cabelo e a relação com os companheiros são questões difíceis de ultrapassar.
Joana (nome fictício) chega com uma passada segura em cima dos tacões finos para mais um dia de voluntariado no Hospital de S. Marcos. Pousa o saco e veste a bata branca. Dá um jeito com a cabeça para que o cabelo impecavelmente arranjado fique direito. Foi justamente o cabelo um dos principais motivos de sofrimento quando soube que tinha cancro da mama. Recusou-se a aceitar o diagnóstico durante algum tempo. Chegou a perder a vontade de viver. Mas as voluntárias do Movimento Vencer e Viver deram-lhe alento para continuar. A experiência foi de tal forma marcante que hoje é ela que dá o seu testemunho. Porque nada melhor do que uma mulher elegante, com um busto invejável, para motivar as outras.
Sentiu um módulo na mama, mas deixou andar na esperança de que passasse. Foi por insistência da irmã que foi à médica, que a mandou fazer os exames habituais. Quando foi fazer a ecografia, disseram-lhe que tinha de tirar o peito. «Foi como se me tivessem tirado o chão debaixo dos pés. Eu gritava, eu chorava, eu estava desesperada. Foi um choque muito grande», conta. Esteve uma semana sem se alimentar. Metia a comida na boca, mas não passava. Não conseguia sair da cama. Até que um dia saiu. Mas o caminho da aceitação da realidade ainda só ía a meio. Recusou-se a assinar a autorização para a operação. «Estava a contar com um milagre», admite.
Um dia encontrou as voluntárias do Movimento Vencer e Viver e ficou impressionada. Afinal, aquelas mulheres tinham vencido e não eram menos femininas por terem tirado uma mama. O ponto de viragem foi quando a coordenadora do grupo, Maria Helena Sousa, lhe contou uma história de um homem que vivia numa casa que começou a ficar inundada. O homem recusou todas as ajudas, desde os bombeiros até ao helicóptero, mesmo quando já se encontrava no telhado para fugir à água, porque tinha a convicção de Deus o iria salvar. Acabou por morrer e por ir ter com Deus para tirar satisfações. Deus retorquiu-lhe que o tentou salvar, mas ele não quis a ajuda de quem o estava a tentar resgatar. Joana percebeu que estava a desperdiçar as ajudas. E que, tal como o homem, poderia acabar por morrer por sua própria culpa. «E o milagre aconteceu», afirma.
A queda do cabelo foi dramática, apesar de admitir que a peruca até era interessante. Não permitia que o marido a visse desfigurada. Deitava-se com um lenço na cabeça. Compensava com baton e com lingerie bonita. Acabou por aceitar a doença e por seguir em frente. O filho de cinco anos foi uma motivação para lutar.
Agora, já fez a reconstrução mamária, mamilo incluído. Diz que é mais feliz do que era antes. Que já não é qualquer coisa que a derruba. E que tem a certeza de que a vida pode ser mais do que a existência medíocre que por vezes levamos. A missão que se auto-propôs é ajudar as outras mulheres com cancro, tal como a apoiaram a ela. Com um sorriso e elegância. Porque não é por tirado um peito que é menos mulher. Antes pelo contrário.
«O mundo desabou»
Pelo caminho até à cura Joana encontrou Lucinda Costa, que fazia voluntariado no São Marcos. Há sete anos, esta cabeleireira começou a emagrecer e rapidamente passou dos 55 para os 45 quilos. Fez vários exames, mas não se sabia exactamente o que tinha. Deu entrada no hospital para ser operada ao apêndice, mas acabou a falar com a enfermeira sobre um pequeno nódulo. Foi chamado um médico, que a mandou fazer uma biopsia. Era suposto o resultado só ser conhecido dali 15 dias, mas no dia seguinte estavam a telefonar-lhe para casa. Tinha um tumor maligno.
O mundo desabou quando chegou ao carro, que estava no parque junto ao S. Marcos. Chorou compulsivamente. Pensou que ia morrer. Pensou em suicidar-se para poupar o marido e os três filhos. A pergunta “porquê eu” martelava-lhe na cabeça. Não conseguia compreender.
Acabou por encarar o problema. Tirou uma mama. Depois da operação, saiu do hospital desorientada, porque naquela altura ainda não havia quem lhe desse muito apoio. Foi tentar comprar uma prótese, mas era muito cara. Meteu algodão. Não sabia se podia trabalhar, mas trabalhou. Sofreu com a queda do cabelo, mas não desistiu de ser bonita. Passou a arranjar-se mais. Conseguiu umas lentes coloridas. Contudo, mesmo assim, ficava pensativa quando via mulheres atraentes na televisão. A praia era um motivo de aflição. Melindrava-se com qualquer coisa que o marido lhe dizia, mesmo que claramente não fosse por mal.
Não voltou a pensar em desistir. «Ganha-se uma nova força de viver. Chega-se ao fim do dia e pensa-se que foi mais um dia que passou», afirma. Com o tempo foi ganhando consciência de que «não é por tirar um peito que a vida acaba. Se calhar uma operação à barriga é bem mais grave, mas ninguém liga porque não é tão visível e não está tão ligada à feminilidade», explica. Recuperou a alegria de viver. Trabalha, faz roupa para o Carnaval da sua aldeia e gosta de ir à discoteca. Usa decotes e roupa justa.
O Movimento Vencer e Viver apoia mulheres vítimas de cancro de mama. A ausência do seio, a queda do cabelo e a relação com os companheiros são questões difíceis de ultrapassar.
Joana (nome fictício) chega com uma passada segura em cima dos tacões finos para mais um dia de voluntariado no Hospital de S. Marcos. Pousa o saco e veste a bata branca. Dá um jeito com a cabeça para que o cabelo impecavelmente arranjado fique direito. Foi justamente o cabelo um dos principais motivos de sofrimento quando soube que tinha cancro da mama. Recusou-se a aceitar o diagnóstico durante algum tempo. Chegou a perder a vontade de viver. Mas as voluntárias do Movimento Vencer e Viver deram-lhe alento para continuar. A experiência foi de tal forma marcante que hoje é ela que dá o seu testemunho. Porque nada melhor do que uma mulher elegante, com um busto invejável, para motivar as outras.
Sentiu um módulo na mama, mas deixou andar na esperança de que passasse. Foi por insistência da irmã que foi à médica, que a mandou fazer os exames habituais. Quando foi fazer a ecografia, disseram-lhe que tinha de tirar o peito. «Foi como se me tivessem tirado o chão debaixo dos pés. Eu gritava, eu chorava, eu estava desesperada. Foi um choque muito grande», conta. Esteve uma semana sem se alimentar. Metia a comida na boca, mas não passava. Não conseguia sair da cama. Até que um dia saiu. Mas o caminho da aceitação da realidade ainda só ía a meio. Recusou-se a assinar a autorização para a operação. «Estava a contar com um milagre», admite.
Um dia encontrou as voluntárias do Movimento Vencer e Viver e ficou impressionada. Afinal, aquelas mulheres tinham vencido e não eram menos femininas por terem tirado uma mama. O ponto de viragem foi quando a coordenadora do grupo, Maria Helena Sousa, lhe contou uma história de um homem que vivia numa casa que começou a ficar inundada. O homem recusou todas as ajudas, desde os bombeiros até ao helicóptero, mesmo quando já se encontrava no telhado para fugir à água, porque tinha a convicção de Deus o iria salvar. Acabou por morrer e por ir ter com Deus para tirar satisfações. Deus retorquiu-lhe que o tentou salvar, mas ele não quis a ajuda de quem o estava a tentar resgatar. Joana percebeu que estava a desperdiçar as ajudas. E que, tal como o homem, poderia acabar por morrer por sua própria culpa. «E o milagre aconteceu», afirma.
A queda do cabelo foi dramática, apesar de admitir que a peruca até era interessante. Não permitia que o marido a visse desfigurada. Deitava-se com um lenço na cabeça. Compensava com baton e com lingerie bonita. Acabou por aceitar a doença e por seguir em frente. O filho de cinco anos foi uma motivação para lutar.
Agora, já fez a reconstrução mamária, mamilo incluído. Diz que é mais feliz do que era antes. Que já não é qualquer coisa que a derruba. E que tem a certeza de que a vida pode ser mais do que a existência medíocre que por vezes levamos. A missão que se auto-propôs é ajudar as outras mulheres com cancro, tal como a apoiaram a ela. Com um sorriso e elegância. Porque não é por tirado um peito que é menos mulher. Antes pelo contrário.
«O mundo desabou»
Pelo caminho até à cura Joana encontrou Lucinda Costa, que fazia voluntariado no São Marcos. Há sete anos, esta cabeleireira começou a emagrecer e rapidamente passou dos 55 para os 45 quilos. Fez vários exames, mas não se sabia exactamente o que tinha. Deu entrada no hospital para ser operada ao apêndice, mas acabou a falar com a enfermeira sobre um pequeno nódulo. Foi chamado um médico, que a mandou fazer uma biopsia. Era suposto o resultado só ser conhecido dali 15 dias, mas no dia seguinte estavam a telefonar-lhe para casa. Tinha um tumor maligno.
O mundo desabou quando chegou ao carro, que estava no parque junto ao S. Marcos. Chorou compulsivamente. Pensou que ia morrer. Pensou em suicidar-se para poupar o marido e os três filhos. A pergunta “porquê eu” martelava-lhe na cabeça. Não conseguia compreender.
Acabou por encarar o problema. Tirou uma mama. Depois da operação, saiu do hospital desorientada, porque naquela altura ainda não havia quem lhe desse muito apoio. Foi tentar comprar uma prótese, mas era muito cara. Meteu algodão. Não sabia se podia trabalhar, mas trabalhou. Sofreu com a queda do cabelo, mas não desistiu de ser bonita. Passou a arranjar-se mais. Conseguiu umas lentes coloridas. Contudo, mesmo assim, ficava pensativa quando via mulheres atraentes na televisão. A praia era um motivo de aflição. Melindrava-se com qualquer coisa que o marido lhe dizia, mesmo que claramente não fosse por mal.
Não voltou a pensar em desistir. «Ganha-se uma nova força de viver. Chega-se ao fim do dia e pensa-se que foi mais um dia que passou», afirma. Com o tempo foi ganhando consciência de que «não é por tirar um peito que a vida acaba. Se calhar uma operação à barriga é bem mais grave, mas ninguém liga porque não é tão visível e não está tão ligada à feminilidade», explica. Recuperou a alegria de viver. Trabalha, faz roupa para o Carnaval da sua aldeia e gosta de ir à discoteca. Usa decotes e roupa justa.
Hospital entregou 78 próteses em 2007
O Movimento Vencer e Viver dá apoio no S. Marcos há seis anos. Maria Helena Sousa explica que as quatro voluntárias, que já tiveram cancro da mama e que já fizeram a reconstrução, ajudam as mulheres quando são operadas, entregam-lhes livros explicativos, dão concelhos e, sobretudo, o seu exemplo de vida.
Logo após a amputação, as mulheres recebem uma prótese provisória, feita de malha de algodão. Um mês depois, recebem a prótese de silicone e um soutien dados pelos serviços sociais da unidade hospitalar. Em 2007, houve 78 mulheres que receberam próteses e 76 que receberam soutiens.
Com 62 anos, esta voluntária diz que as mulheres chegam ao hospital imersas numa miríade de emoções. O medo predomina. Muitas vezes não conseguem comunicar o que sentem. Estão petrificadas. É-lhes, então, explicado que «é bonito viver» e que têm muitos motivos pelos quais se agarrar à vida. Algumas apercebem-se que são «cabeças de casal», que sem elas a família dificilmente conseguiria aguentar-se, mesmo do ponto de vista financeiro. Para outras mulheres, começa a luta contra a discriminação, por exemplo na subscrição de seguros.
Maria Helena Sousa diz que, apesar, de tudo «é preciso muita coragem», porque «há uma carga psicológica enorme inerente ao cancro da mama». Muitas recusam-se a aceitar o diagnóstico. Metem os papéis na gaveta à espera que passe. Também há mulheres que não dizem a doença que têm. Afirmam que tiraram um nódulo quando, na verdade, tiraram uma das mamas. A queda do cabelo e a relação física com os companheiros são as questões também muito delicadas.
A voluntária salienta que, muitas vezes, as doentes acabam por ser os esteios da família. São elas que dão apoio aos maridos e aos filhos, frequentemente alvo de troça na escola pelo facto de a mãe ter sido operada ou por usar cabeleira. «Elas vão encontrar força para arrastar a família», afirma. Para poder continuar o seu trabalho, o Movimento precisa de voluntárias, preferencialmente mulheres que tenham sobrevivido a cancro de mama, que estejam na casa dos 50 anos e que tenham a vida estabilizada.
Logo após a amputação, as mulheres recebem uma prótese provisória, feita de malha de algodão. Um mês depois, recebem a prótese de silicone e um soutien dados pelos serviços sociais da unidade hospitalar. Em 2007, houve 78 mulheres que receberam próteses e 76 que receberam soutiens.
Com 62 anos, esta voluntária diz que as mulheres chegam ao hospital imersas numa miríade de emoções. O medo predomina. Muitas vezes não conseguem comunicar o que sentem. Estão petrificadas. É-lhes, então, explicado que «é bonito viver» e que têm muitos motivos pelos quais se agarrar à vida. Algumas apercebem-se que são «cabeças de casal», que sem elas a família dificilmente conseguiria aguentar-se, mesmo do ponto de vista financeiro. Para outras mulheres, começa a luta contra a discriminação, por exemplo na subscrição de seguros.
Maria Helena Sousa diz que, apesar, de tudo «é preciso muita coragem», porque «há uma carga psicológica enorme inerente ao cancro da mama». Muitas recusam-se a aceitar o diagnóstico. Metem os papéis na gaveta à espera que passe. Também há mulheres que não dizem a doença que têm. Afirmam que tiraram um nódulo quando, na verdade, tiraram uma das mamas. A queda do cabelo e a relação física com os companheiros são as questões também muito delicadas.
A voluntária salienta que, muitas vezes, as doentes acabam por ser os esteios da família. São elas que dão apoio aos maridos e aos filhos, frequentemente alvo de troça na escola pelo facto de a mãe ter sido operada ou por usar cabeleira. «Elas vão encontrar força para arrastar a família», afirma. Para poder continuar o seu trabalho, o Movimento precisa de voluntárias, preferencialmente mulheres que tenham sobrevivido a cancro de mama, que estejam na casa dos 50 anos e que tenham a vida estabilizada.
«Isto é para vencer»
Força de vontade ajuda a ultrapassar adversidades
Não há consenso sobre a relação entre o estado psicológico e a evolução da doença. Mas certo é que a motivação ajuda na colaboração com o tratamento, o que é muito importante.
Joaquina sorri. Sorri muito e de uma forma descontraída, que lhe faz aparecer duas covinhas na cara. Garante que só chorou uma vez desde que descobriu que tinha cancro de mama. Sofreu com a queda do cabelo, talvez mais do que com a ausência de um seio. Agora está a fazer reconstrução e já mostrou a «mama nova» ao marido, que sempre esteve ao seu lado. Tem 51 anos.
Ao tomar banho descobriu um talo. Como não sentia dores, adiou a ida ao centro de saúde. Por mostrar ao médico estavam uns exames feitos há dois anos, quando uma operação ao pulmão se tornou a prioridade do momento. Um mês depois, foi ao médico. E foi fazer exames. Ao fazer a ecografia mamária, disseram-lhe que tinham detectado qualquer coisa. Chamaram outro profissional. Perguntaram-lhe se queria fazer imediatamente a biopsia. Disse que sim. Ficou na sala a aguardar.
Uma amiga da filha que trabalhava naquele centro de diagnóstico viu-a e foi saber mais pormenores. Ficou transtornada. Tentou telefonar à amiga. Como não conseguiu, ligou a uma colega, que por sua vez conseguiu falar com a outra filha de Joaquina. A jovem telefonou para o centro e, a chorar, falou com a mãe. Joaquina apercebeu-se de que algo estava errado. E chorou. Foi a única vez.
Passou o fim-de-semana. Segunda-feira foi ao Hospital de S. Marcos. Terça voltou para fazer uma biopsia. Fez três biopsias e nada. Não havia diagnóstico. Acabou por ser internada por causa de uma anemia. Voltou para casa para acabar de recuperar. Regressou, depois, à unidade de saúde para ser «operada ao peito e à barriga». «Explicaram-me tudo. Disseram que iam tirar o nódulo para analisar. Se fosse mau, que tiravam a maminha toda e que se não fosse que só tiravam o talo. Eu disse que estava preparada para tudo. Nem chorei», conta.
Tiraram-lhe o peito todo. Joaquina sublinha que nunca se deixou ir abaixo, porque sempre encarou tudo com força. Viu outras mulheres irem-se abaixo. E sentiu no interior de um peito dilacerado a importância do apoio das voluntárias do movimento Vencer e Viver. Criou-se uma rede de solidariedade. Muitas vezes brincavam. «Nem parecia que estávamos num hospital», admite. Acabou por ficar internada mais tempo por causa de complicações na área da urologia.
Oriunda de uma família com um longo historial de doença oncológicas – desde cancros de rim até cancro no cérebro, passando pelo cancro cólon-rectal – encarou a doença com a serenidade possível. «Sou uma lutadora, uma ganhadora», diz, sem falsas modéstias. Foi com esta atitude que encarou a doença. «Isto é para vencer», eis o lema.
Seguiu-se a quimioterapia. «A pior coisa foi perder o cabelo. A médica tinha-me prevenido para cortar o cabelo pequenino para não notar tanto, mas mesmo assim foi um choque quando comecei a ver a almofada cheia de cabelo e quando ele começou a cair às manadas durante o banho», relata. Estava surpreendida. Era suposto o cabelo só cair ao fim de dois meses e ainda só tinha passado um. Ficou a tremer, perante o riso carinhoso de uma das filhas.
Arranjaram-lhe uma cabeleira parecida com o cabelo dela. Houve até quem não se apercebesse e elogiasse o penteado impecável. Joaquina sentia-se incomodada. Andava sempre a puxar a peruca com medo de que estivesse fora do sítio. Em casa, preferia os «lenços bonitos» que arranjou. Se por infelicidade tiver de voltar a passar pelo mesmo, dispensa a peruca.
Olhar-se ao espelho foi doloroso. «Ai meu Deus, que cena. Pareço um ET: careca, sem peito e com uma cicatriz em forma de cruz na barriga», foi o que lhe passou pela cabeça. Não deixou que o marido a visse assim. Não tirou fotografias. Mas lamenta não ter uma recordação de quando o cabelo começou a crescer e ficou cheio de caracóis. Ela, que tem o cabelo liso, sentia-se «tão bonita» com os caracóis...
Às vezes, quando estava sozinha, questionava-se sobre o motivo da doença nela, que nunca tinha feito mal a ninguém. Suspeitava que Deus lhe queria mostrar alguma coisa. Havia momentos mais tristes, que combatia com energia. Varria os «maus pensamentos» e seguia em frente.
Pensou em não fazer reconstrução mamária. Afinal, já tinham passado quatro anos desde a operação. Hesitou, mas avançou. Como sempre faz. Com a mesma determinação. Só depois do início da reconstrução é que se mostrou ao marido. Confessa que está ansiosa por ter «mamas novas». Sim, porque também lhe vão retocar a outra para ficarem iguais. Lembra-se do busto de uma das voluntárias e sorri.
Com sentido de humor, conta que se recusou a ir para a piscina com a prótese. «O fato de banho é composto, mas mesmo assim imagine-se que o silicone caía na piscina e que toda a gente tinha de andar atrás dele....», graceja. Mais algum tempo e já não terá este problema. «Vão ficar jeitosinhas», perspectiva. E sorri. Mais uma vez.
No hospital, criam-se laços de solidariedade
Não há consenso sobre a relação entre o estado psicológico e a evolução da doença. Mas certo é que a motivação ajuda na colaboração com o tratamento, o que é muito importante.
Joaquina sorri. Sorri muito e de uma forma descontraída, que lhe faz aparecer duas covinhas na cara. Garante que só chorou uma vez desde que descobriu que tinha cancro de mama. Sofreu com a queda do cabelo, talvez mais do que com a ausência de um seio. Agora está a fazer reconstrução e já mostrou a «mama nova» ao marido, que sempre esteve ao seu lado. Tem 51 anos.
Ao tomar banho descobriu um talo. Como não sentia dores, adiou a ida ao centro de saúde. Por mostrar ao médico estavam uns exames feitos há dois anos, quando uma operação ao pulmão se tornou a prioridade do momento. Um mês depois, foi ao médico. E foi fazer exames. Ao fazer a ecografia mamária, disseram-lhe que tinham detectado qualquer coisa. Chamaram outro profissional. Perguntaram-lhe se queria fazer imediatamente a biopsia. Disse que sim. Ficou na sala a aguardar.
Uma amiga da filha que trabalhava naquele centro de diagnóstico viu-a e foi saber mais pormenores. Ficou transtornada. Tentou telefonar à amiga. Como não conseguiu, ligou a uma colega, que por sua vez conseguiu falar com a outra filha de Joaquina. A jovem telefonou para o centro e, a chorar, falou com a mãe. Joaquina apercebeu-se de que algo estava errado. E chorou. Foi a única vez.
Passou o fim-de-semana. Segunda-feira foi ao Hospital de S. Marcos. Terça voltou para fazer uma biopsia. Fez três biopsias e nada. Não havia diagnóstico. Acabou por ser internada por causa de uma anemia. Voltou para casa para acabar de recuperar. Regressou, depois, à unidade de saúde para ser «operada ao peito e à barriga». «Explicaram-me tudo. Disseram que iam tirar o nódulo para analisar. Se fosse mau, que tiravam a maminha toda e que se não fosse que só tiravam o talo. Eu disse que estava preparada para tudo. Nem chorei», conta.
Tiraram-lhe o peito todo. Joaquina sublinha que nunca se deixou ir abaixo, porque sempre encarou tudo com força. Viu outras mulheres irem-se abaixo. E sentiu no interior de um peito dilacerado a importância do apoio das voluntárias do movimento Vencer e Viver. Criou-se uma rede de solidariedade. Muitas vezes brincavam. «Nem parecia que estávamos num hospital», admite. Acabou por ficar internada mais tempo por causa de complicações na área da urologia.
Oriunda de uma família com um longo historial de doença oncológicas – desde cancros de rim até cancro no cérebro, passando pelo cancro cólon-rectal – encarou a doença com a serenidade possível. «Sou uma lutadora, uma ganhadora», diz, sem falsas modéstias. Foi com esta atitude que encarou a doença. «Isto é para vencer», eis o lema.
Seguiu-se a quimioterapia. «A pior coisa foi perder o cabelo. A médica tinha-me prevenido para cortar o cabelo pequenino para não notar tanto, mas mesmo assim foi um choque quando comecei a ver a almofada cheia de cabelo e quando ele começou a cair às manadas durante o banho», relata. Estava surpreendida. Era suposto o cabelo só cair ao fim de dois meses e ainda só tinha passado um. Ficou a tremer, perante o riso carinhoso de uma das filhas.
Arranjaram-lhe uma cabeleira parecida com o cabelo dela. Houve até quem não se apercebesse e elogiasse o penteado impecável. Joaquina sentia-se incomodada. Andava sempre a puxar a peruca com medo de que estivesse fora do sítio. Em casa, preferia os «lenços bonitos» que arranjou. Se por infelicidade tiver de voltar a passar pelo mesmo, dispensa a peruca.
Olhar-se ao espelho foi doloroso. «Ai meu Deus, que cena. Pareço um ET: careca, sem peito e com uma cicatriz em forma de cruz na barriga», foi o que lhe passou pela cabeça. Não deixou que o marido a visse assim. Não tirou fotografias. Mas lamenta não ter uma recordação de quando o cabelo começou a crescer e ficou cheio de caracóis. Ela, que tem o cabelo liso, sentia-se «tão bonita» com os caracóis...
Às vezes, quando estava sozinha, questionava-se sobre o motivo da doença nela, que nunca tinha feito mal a ninguém. Suspeitava que Deus lhe queria mostrar alguma coisa. Havia momentos mais tristes, que combatia com energia. Varria os «maus pensamentos» e seguia em frente.
Pensou em não fazer reconstrução mamária. Afinal, já tinham passado quatro anos desde a operação. Hesitou, mas avançou. Como sempre faz. Com a mesma determinação. Só depois do início da reconstrução é que se mostrou ao marido. Confessa que está ansiosa por ter «mamas novas». Sim, porque também lhe vão retocar a outra para ficarem iguais. Lembra-se do busto de uma das voluntárias e sorri.
Com sentido de humor, conta que se recusou a ir para a piscina com a prótese. «O fato de banho é composto, mas mesmo assim imagine-se que o silicone caía na piscina e que toda a gente tinha de andar atrás dele....», graceja. Mais algum tempo e já não terá este problema. «Vão ficar jeitosinhas», perspectiva. E sorri. Mais uma vez.
No hospital, criam-se laços de solidariedade
Falta de privacidade dificulta ajuda espiritual
O capelão do S. Marcos, padre Dias Pereira, refere que a falta de privacidade é um dos obstáculos à ajuda espiritual aos doentes, tanto no Hospital de Dia, onde as cadeiras estão colocadas em fila, como noutros sectores daquela unidade. Uma vez que as pessoas estão todas juntas, é difícil conversar com cada uma delas.
«O grande problema com que nos debatemos é encontrar um espaço que nos facilite o diálogo mais profundo com os doentes, para que eles abram a sua interioridade», afirma este sacerdote, que, juntamente com o padre Miguel Ângelo Oliveira, percorre diariamente a unidade de saúde.
O padre Dias Pereira sublinha que este é um problema da generalidade das unidades de saúde e não apenas do S. Marcos, que se sente de uma forma ainda dramática quando os doentes estão prestes a falecer. «Os momentos de agonia são muito complicados para os doentes e para as respectivas famílias, notando-se aí a falta de privacidade. As pessoas precisavam de mais espaço para chorar, para expressar os seus sentimentos, para estar mais à vontade», sublinha.
O sacerdote recorda que, «cada vez mais, as pessoas morrem no hospital», pelo que «a sociedade tem de pensar numa questão que «embora não sendo agradável é inevitável»: a morte. «Temos de dar dignidade à morte. É incómodo falar dela, mas é uma realidade que não podemos descurar», adverte.
Em relação ao trabalho de apoio espiritual, o capelão explica que a notícia de uma doença com o cancro «pode fazer abalar a fé». «Numa primeira reacção, muitas pessoas põem em dúvida a veracidade do diagnóstico, pensando que está errado. Se a pessoa é crente, questiona-se sobre que mal é que fez a Deus. Há uma revolta inicial. Depois, a pouco e pouco, há uma interiorização do problema», relata.
«As doenças fazem com que as pessoas parem para reflectir e repensar a sua vida. É um momento de se encontrarem consigo próprias, com a família e com Deus. Tenho encontrado pacientes que dizem que estão a fazer o exame de consciência à sua vida. A doença não é um castigo, uma desgraça, mas uma ocasião para reflectir, para valorizar ainda mais a vida», refere.
No tocante ao papel dos capelães, sublinha que «não é sacramentalista», mas sobretudo manter uma relação de amizade com os doentes. «Mais do que fazer prelecções, importa escutar as pessoas, valorizar os gestos, muitas vezes até um olhar, a presença, o silêncio», explica.
«O nosso papel era tido como a pessoa que vinha anunciar a morte, que trazia uma espécie de passaporte para o outro mundo. Com a nossa actividade do dia-a-dia, conseguimos alterar essa imagem. Não se nega a Santa Unção, mas tem havido menos pedidos, uma vez que também as paróquias têm trabalhado nesta área», acrescenta.
Em seu entender, «por vezes, confunde-se espiritualidade com religiosidade». «Todo o ser humano tem espiritualidade, ainda que não tenha uma relação com uma religião. A pessoa não pode ser compartimentada. A medicina pode cair no perigo de compartimentar o ser humano e esquecer-se de que os exames são importantes e a tecnologia dá uma ajuda preciosa, mas o doente não se resume à doença», adverte.
«O grande problema com que nos debatemos é encontrar um espaço que nos facilite o diálogo mais profundo com os doentes, para que eles abram a sua interioridade», afirma este sacerdote, que, juntamente com o padre Miguel Ângelo Oliveira, percorre diariamente a unidade de saúde.
O padre Dias Pereira sublinha que este é um problema da generalidade das unidades de saúde e não apenas do S. Marcos, que se sente de uma forma ainda dramática quando os doentes estão prestes a falecer. «Os momentos de agonia são muito complicados para os doentes e para as respectivas famílias, notando-se aí a falta de privacidade. As pessoas precisavam de mais espaço para chorar, para expressar os seus sentimentos, para estar mais à vontade», sublinha.
O sacerdote recorda que, «cada vez mais, as pessoas morrem no hospital», pelo que «a sociedade tem de pensar numa questão que «embora não sendo agradável é inevitável»: a morte. «Temos de dar dignidade à morte. É incómodo falar dela, mas é uma realidade que não podemos descurar», adverte.
Em relação ao trabalho de apoio espiritual, o capelão explica que a notícia de uma doença com o cancro «pode fazer abalar a fé». «Numa primeira reacção, muitas pessoas põem em dúvida a veracidade do diagnóstico, pensando que está errado. Se a pessoa é crente, questiona-se sobre que mal é que fez a Deus. Há uma revolta inicial. Depois, a pouco e pouco, há uma interiorização do problema», relata.
«As doenças fazem com que as pessoas parem para reflectir e repensar a sua vida. É um momento de se encontrarem consigo próprias, com a família e com Deus. Tenho encontrado pacientes que dizem que estão a fazer o exame de consciência à sua vida. A doença não é um castigo, uma desgraça, mas uma ocasião para reflectir, para valorizar ainda mais a vida», refere.
No tocante ao papel dos capelães, sublinha que «não é sacramentalista», mas sobretudo manter uma relação de amizade com os doentes. «Mais do que fazer prelecções, importa escutar as pessoas, valorizar os gestos, muitas vezes até um olhar, a presença, o silêncio», explica.
«O nosso papel era tido como a pessoa que vinha anunciar a morte, que trazia uma espécie de passaporte para o outro mundo. Com a nossa actividade do dia-a-dia, conseguimos alterar essa imagem. Não se nega a Santa Unção, mas tem havido menos pedidos, uma vez que também as paróquias têm trabalhado nesta área», acrescenta.
Em seu entender, «por vezes, confunde-se espiritualidade com religiosidade». «Todo o ser humano tem espiritualidade, ainda que não tenha uma relação com uma religião. A pessoa não pode ser compartimentada. A medicina pode cair no perigo de compartimentar o ser humano e esquecer-se de que os exames são importantes e a tecnologia dá uma ajuda preciosa, mas o doente não se resume à doença», adverte.
«Se ele fizesse exames regularmente, ainda hoje estaria aqui»
Sinais de alerta permitem detectar a doença a tempo
Há pessoas que continuam a ignorar os sinais persistentes da doença, permitindo que ela se desenvolva, o que diminui a possibilidade de cura.
Alberto não era «homem de se entregar a doenças». Desde novo que tinha problemas intestinais e sempre sofreu de obstipação, algo que se foi agravando com o passar dos anos. Trabalhador incansável, só ia ao médico para acompanhar a mulher e, mesmo assim, raramente entrava com ela. Aos 66 anos, começou a emagrecer, a andar mais cansado e a ficar com uma coloração amarelada na pele.
Um dia, a mulher marcou uma consulta para ela e insistiu para que ele também entrasse. A médica notou logo que ele estava doente, só pela avaliação visual. Na sequência da consulta, fez uma colonoscopia e nem foi necessário fazer o exame completo, porque o tumor estava logo nos primeiros centímetros. Depois, fez uma tomografia axial computorizada (TAC), que detectou metástases em cerca de 75 por cento do fígado. A icterícia justificava a pele amarelada.
Maria, a filha, conta que «foi um choque enorme» quando foram «buscar os resultados da colonoscopia, que indicava, sem margem para dúvidas, a neoplasia». «Procurei agarrar-me a todas as esperanças. Pensei: ele vai fazer a operação e ficar bem, nem que tenha de ser ostomizado (usar o chamado "saquinho"). Mas, depois, foi tudo cada vez mais duro: a TAC a revelar as metástases... Acho que foi o dia mais triste da minha vida. Ou talvez não, não sei. Talvez, depois disso, tenha havido muitos dias ainda mais tristes», afirma.
A família tentou esconder a doença. No dia em que chegaram os resultados da colonoscopia, e quando Alberto perguntou o que era uma neoplasia, o marido de Maria, enfermeiro, disse-lhe que era uma ferida no intestino. «Para quê dizer? Não lhe íamos dizer: Pai, tens um cancro, não tem cura e vais morrer em pouco tempo. Nem pensar. Nas consultas, médico e enfermeiro dialogavam à frente dele, mas sempre em termos especializados. Mas ele devia suspeitar», explica.
Já não havia tratamento possível. O problema não estava nos intestinos, uma vez esses seriam tratados de forma relativamente simples. O tumor estava junto de uma artéria, pelo que se espalhou facilmente até ao fígado. «Tivemos de acompanhá-lo sempre, em exames, em idas a médicos, sempre à procura de uma esperança, que era sempre anulada», recorda a filha.
A entrada no IPO deu-se com o recurso a um subterfúgio: Alberto caiu em casa e a família chamou uma ambulância particular para o levar lá. Assim, não podiam mandá-lo embora. De outra forma não o aceitariam, pois nada havia a fazer para reverter a doença. «Sei que não adiantou em termos de cura, mas, pelo menos, teve cuidados que não lhe podíamos dar em casa. Por exemplo, ainda lhe fizeram uma transfusão sanguínea. Não adiantou, mas tentou-se», diz.
Maria achava que a doença «parecia um castigo». «Será um castigo por ele se ter dedicado só ao trabalho? No momento em que se reforma, fica assim?», pensava. Católica por baptismo, mas sem se considerar «religiosa», não culpou Deus. «Deus é meu amigo e as coisas acontecem porque há uma série de factores que levam a isso. No caso do meu pai, havia a obstipação, terá havido alturas em que perdeu sangue sem que tivesse procurado um médico, muito trabalho, muito stress... Se ele fizesse os exames regularmente, o tumor poderia ter sido detectado a tempo, sem as metástases, e ainda hoje estaria aqui», afirma.
Alberto só sofreu fisicamente «mesmo no fim», quando «ficou muito agitado a seguir à transfusão e nos últimos dias, em que já não podia beber». A família humedecia-lhe os lábios e a boca com uma "boneca", uma espátula de madeira com uma gaze envolvida na ponta, que se mergulha em água.
Maria mudou o rumo da sua vida depois da morte do pai. Passou a trabalhar por conta própria. Agora, anda mais vigilante em relação à mãe, que sofre de Alzheimer. A nível pessoal, aprendeu que tem de «tentar aproveitar um bocadinho a vida, viver e não só trabalhar». «Mas, no fundo, estou a fazer o mesmo percurso do meu pai: trabalhar por conta própria, trabalhar ao máximo, não ir ao médico e deixar andar», admite.
Divulgar os sinais de alerta
O Lions Clube de Braga é o responsável pela organização do peditório para a Liga Portuguesa Contra o Cancro no distrito. A prevenção e o alerta para os sinais dos diferentes tipos de cancro fazem parte desta operação anual.
Manuel Braga defende que «a maioria dos casos de cancro é tratável», mas o problema é que «muitas vezes se vai demasiado tarde junto de quem se deve». «A nossa missão passa também por divulgar os sinais de alerta e consciencializar as pessoas para que devem procurar o médico quando houver problemas persistentes. Esta pode ser uma doença combatível, se for detectada precocemente», afirma.
António Tinoco, por seu turno, refere que «o cancro ainda marca como um ferrete», mas há pessoas que continuam a descurar a prevenção, mesmo quando confrontadas com sinais alarmantes.
Estes dois membros do movimento lionístico salientam que, aquando do peditório, há quem se recuse a pegar nos folhetos informativos sobre a doença.
Lions Clube de Braga organiza o peditório para a Liga Contra o Cancro no distrito
Há pessoas que continuam a ignorar os sinais persistentes da doença, permitindo que ela se desenvolva, o que diminui a possibilidade de cura.
Alberto não era «homem de se entregar a doenças». Desde novo que tinha problemas intestinais e sempre sofreu de obstipação, algo que se foi agravando com o passar dos anos. Trabalhador incansável, só ia ao médico para acompanhar a mulher e, mesmo assim, raramente entrava com ela. Aos 66 anos, começou a emagrecer, a andar mais cansado e a ficar com uma coloração amarelada na pele.
Um dia, a mulher marcou uma consulta para ela e insistiu para que ele também entrasse. A médica notou logo que ele estava doente, só pela avaliação visual. Na sequência da consulta, fez uma colonoscopia e nem foi necessário fazer o exame completo, porque o tumor estava logo nos primeiros centímetros. Depois, fez uma tomografia axial computorizada (TAC), que detectou metástases em cerca de 75 por cento do fígado. A icterícia justificava a pele amarelada.
Maria, a filha, conta que «foi um choque enorme» quando foram «buscar os resultados da colonoscopia, que indicava, sem margem para dúvidas, a neoplasia». «Procurei agarrar-me a todas as esperanças. Pensei: ele vai fazer a operação e ficar bem, nem que tenha de ser ostomizado (usar o chamado "saquinho"). Mas, depois, foi tudo cada vez mais duro: a TAC a revelar as metástases... Acho que foi o dia mais triste da minha vida. Ou talvez não, não sei. Talvez, depois disso, tenha havido muitos dias ainda mais tristes», afirma.
A família tentou esconder a doença. No dia em que chegaram os resultados da colonoscopia, e quando Alberto perguntou o que era uma neoplasia, o marido de Maria, enfermeiro, disse-lhe que era uma ferida no intestino. «Para quê dizer? Não lhe íamos dizer: Pai, tens um cancro, não tem cura e vais morrer em pouco tempo. Nem pensar. Nas consultas, médico e enfermeiro dialogavam à frente dele, mas sempre em termos especializados. Mas ele devia suspeitar», explica.
Já não havia tratamento possível. O problema não estava nos intestinos, uma vez esses seriam tratados de forma relativamente simples. O tumor estava junto de uma artéria, pelo que se espalhou facilmente até ao fígado. «Tivemos de acompanhá-lo sempre, em exames, em idas a médicos, sempre à procura de uma esperança, que era sempre anulada», recorda a filha.
A entrada no IPO deu-se com o recurso a um subterfúgio: Alberto caiu em casa e a família chamou uma ambulância particular para o levar lá. Assim, não podiam mandá-lo embora. De outra forma não o aceitariam, pois nada havia a fazer para reverter a doença. «Sei que não adiantou em termos de cura, mas, pelo menos, teve cuidados que não lhe podíamos dar em casa. Por exemplo, ainda lhe fizeram uma transfusão sanguínea. Não adiantou, mas tentou-se», diz.
Maria achava que a doença «parecia um castigo». «Será um castigo por ele se ter dedicado só ao trabalho? No momento em que se reforma, fica assim?», pensava. Católica por baptismo, mas sem se considerar «religiosa», não culpou Deus. «Deus é meu amigo e as coisas acontecem porque há uma série de factores que levam a isso. No caso do meu pai, havia a obstipação, terá havido alturas em que perdeu sangue sem que tivesse procurado um médico, muito trabalho, muito stress... Se ele fizesse os exames regularmente, o tumor poderia ter sido detectado a tempo, sem as metástases, e ainda hoje estaria aqui», afirma.
Alberto só sofreu fisicamente «mesmo no fim», quando «ficou muito agitado a seguir à transfusão e nos últimos dias, em que já não podia beber». A família humedecia-lhe os lábios e a boca com uma "boneca", uma espátula de madeira com uma gaze envolvida na ponta, que se mergulha em água.
Maria mudou o rumo da sua vida depois da morte do pai. Passou a trabalhar por conta própria. Agora, anda mais vigilante em relação à mãe, que sofre de Alzheimer. A nível pessoal, aprendeu que tem de «tentar aproveitar um bocadinho a vida, viver e não só trabalhar». «Mas, no fundo, estou a fazer o mesmo percurso do meu pai: trabalhar por conta própria, trabalhar ao máximo, não ir ao médico e deixar andar», admite.
Divulgar os sinais de alerta
O Lions Clube de Braga é o responsável pela organização do peditório para a Liga Portuguesa Contra o Cancro no distrito. A prevenção e o alerta para os sinais dos diferentes tipos de cancro fazem parte desta operação anual.
Manuel Braga defende que «a maioria dos casos de cancro é tratável», mas o problema é que «muitas vezes se vai demasiado tarde junto de quem se deve». «A nossa missão passa também por divulgar os sinais de alerta e consciencializar as pessoas para que devem procurar o médico quando houver problemas persistentes. Esta pode ser uma doença combatível, se for detectada precocemente», afirma.
António Tinoco, por seu turno, refere que «o cancro ainda marca como um ferrete», mas há pessoas que continuam a descurar a prevenção, mesmo quando confrontadas com sinais alarmantes.
Estes dois membros do movimento lionístico salientam que, aquando do peditório, há quem se recuse a pegar nos folhetos informativos sobre a doença.
Lions Clube de Braga organiza o peditório para a Liga Contra o Cancro no distrito
«É uma guerra para travar ao segundo»
Acompanhamento dos doentes é muito desgastante para a família
A família sofre com a luta contra o cancro, um inimigo alojado no interior do corpo. O acompanhamento permanente é muito desgastante, a ponto de só se aguentar quando se ama verdadeiramente.
Margarida (nome fictício) era uma mulher saudável, independente e com uma personalidade forte. Comia sopa e fruta, recusava hamburgers e frangos do aviário. Ia ao ginásio e à praia. Gostava de conduzir.
Em plena menopausa, aos 52 anos, os miomas que tinha nos ovários eram um problema controlado. Durante as férias na aldeia, no interior do Baixo Minho, começou a não conseguir apertar as calças, mas não valorizou o mal-estar. Até que um dia comeu ameixas e teve uma diarreia terrível, com sangue nas fezes. Estranhou porque nunca antes tinha tido problemas de intestinos.
Foi fazer exames. Disseram-lhe que era um pólipo, mas a carta fechada fez com que esta mulher habituada a lidar com médicos desconfiasse. Foi operada e ouviu os clínicos assegurarem-lhe que era um “tumorzinho”. Cortaram-lhe apenas uma parte do intestino e Margarida ficou feliz. Não queria andar com a “bolsinha” que exporia a sua doença. Fez quimioterapia. Pensava que ia ficar totalmente curada.
Depois, insistiu em ir trabalhar, mas sentiu dores muito fortes. Acabou por dar entrada no Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto. O tumor cólon-rectal tinha alastrado aos ovários. Apesar da angústia, a esperança mantinha-se. A operação foi adiada à espera de um médico que tinha ido aos EUA. A cirurgia, mesmo com o especialista, acabou por não ser a planeada. A doença estava com uma evolução galopante.
Por esta altura, o cancro de Margarida era também a principal preocupação da afilhada, Catarina (nome fictício), que se recusava a aceitar a evolução da patologia. Foi tirar satisfações com o médico, que friamente lhe tirou qualquer ilusão de possível cura. Chegou a agarrar-lhe o braço. Era insuportável ouvir que “a segunda mãe” tinha uma doença terrível, das piores, em avanço acelerado. Conteve-se a custo para não ser rude, mas nunca mais conseguiu olhá-lo nos olhos.
«Foi um golpe profundo, senti a dor da perda. Senti uma revolta contra tudo e contra todos. Deixa-se de acreditar em Deus, nos médicos, na vida, nas pessoas... Mas, ao mesmo tempo, precisava de acreditar em tudo e em todos. Senti que iria encontrar forças nalgum lado para mudar tudo. Há uma força que nos diz para continuar», relata Catarina.
«Luta contra o inimigo dentro de ti»
Ao todo, foram dois anos e meio de luta. Catarina começa a ficar cada vez mais emocionada. Os olhos claros humedecem e a pele da cara fica ainda mais branca. «É uma luta contra o inimigo que está dentro de ti. É uma guerra para travar ao segundo. É uma doença que muda tudo. Pensa-se em recorrer ao estrangeiro, mobilizam-se todos os contactos. Vai-se à procura de toda a informação possível, desde as enciclopédias até à Internet», afirma.
Aguenta-se, apesar da exaustão. Há momentos em que se perde o norte e se acaba a andar à deriva em zonas proibidas do IPO. Há alturas em que faltam as forças para subir as escadas. Há situações em que reconhecer os familiares mais próximos exige um esforço desmesurado. «Só se consegue estar do primeiro ao último momento se se gostar muito, muito, muito daquela pessoa. Caso contrário, é impossível aguentar. É nestas alturas que se vêem os verdadeiros sentimentos», conta. As palavras tornam-se desnecessárias. Pela cabeça passam mil interrogações. «Só podia ser maldição para ter acontecido a Margarida, que sempre teve tantos cuidados com a saúde», era o que pensava.
No horizonte continuava a esperança. «Tens de acreditar. Se achas que os médicos são falíveis, também são eles que têm a chave de tudo», refere. Procurou todos os caminhos, mas não foi por isso que passou a ir mais à missa. «Nunca fui à bruxa nem nada do género. Esta era uma questão médica. Não vamos ser estúpidos», afirma. Foi uma vez a Montariol à procura do xarope de aloé vera. O momento acabou por ser decisivo. Catarina sentia que «tinha de correr uma maratona, mas não tinha sapatilhas para continuar». Foi aí que um frade lhe disse que, quando uma casa está a arder, devemos tentar apagar as chamas, em vez de avançarmos para elas. E, de repente, a lucidez voltou.
«Faz-se tudo para amenizar o sofrimento»
A degradação física da madrinha era uma realidade. Catarina queria resguardar Margarida de tudo e de todos. A doença passou a ser vivida por um núcleo muito restrito de pessoas. Começaram a jogar um jogo com a doente, para que ela não desistisse. «Se vomita, diz-se que a comida está estragada. Se está cansada, a culpa é do estado do tempo. Se não há mais tratamentos, assegura-se que é apenas uma interrupção. Faz-se tudo para amenizar o sofrimento», conta.
Não havia vagas nas camas de retaguarda do Porto. Rumaram ao «hotel da morte» de Coimbra. É assim que chama àquela unidade de cuidados paliativos. A versão oficial é que iam de férias para a “cidade dos estudantes”. Margarida sofreu uma oclusão. A maior preocupação era, por essa altura, a sua qualidade de vida. Catarina tirou uma semana de férias. O trabalho era a sua salvação. A doença absorvia todos os segundos, todas as energias.
Só no último mês de vida é que Margarida se confrontou com a morte. Continuando a ser a mulher de armas que sempre foi, queria manter a autonomia possível, mesmo quando já era um «cadáver andante». Só meteu baixa quando não podia mesmo trabalhar. Só deixou de conduzir quando não podia mesmo conduzir. Só deixou de tomar banho quando não podia mesmo tomar banho. Só deixou de falar dois dias antes de morrer. Esperou o dia de aniversário da filha de uma médica amiga, ligou o telemóvel e deu-lhe os parabéns. Depois, entrou num sono profundo.
Catarina vinha de Coimbra quando os peregrinos se dirigiam para Fátima, para celebrar o 13 de Outubro. Pediu a Nossa Senhora que levasse a madrinha. Ninguém aguentava mais. Margarida morreu «no dia em que tinha de morrer». Catarina viveu «a grande experiência» da sua vida. Continua a chorar. Com lágrimas que lhe caem pelo rosto, mas sobretudo com a alma. Para ela, o cancro é um monstro. O pior inimigo. O inimigo que está dentro de nós.
A família sofre com a luta contra o cancro, um inimigo alojado no interior do corpo. O acompanhamento permanente é muito desgastante, a ponto de só se aguentar quando se ama verdadeiramente.
Margarida (nome fictício) era uma mulher saudável, independente e com uma personalidade forte. Comia sopa e fruta, recusava hamburgers e frangos do aviário. Ia ao ginásio e à praia. Gostava de conduzir.
Em plena menopausa, aos 52 anos, os miomas que tinha nos ovários eram um problema controlado. Durante as férias na aldeia, no interior do Baixo Minho, começou a não conseguir apertar as calças, mas não valorizou o mal-estar. Até que um dia comeu ameixas e teve uma diarreia terrível, com sangue nas fezes. Estranhou porque nunca antes tinha tido problemas de intestinos.
Foi fazer exames. Disseram-lhe que era um pólipo, mas a carta fechada fez com que esta mulher habituada a lidar com médicos desconfiasse. Foi operada e ouviu os clínicos assegurarem-lhe que era um “tumorzinho”. Cortaram-lhe apenas uma parte do intestino e Margarida ficou feliz. Não queria andar com a “bolsinha” que exporia a sua doença. Fez quimioterapia. Pensava que ia ficar totalmente curada.
Depois, insistiu em ir trabalhar, mas sentiu dores muito fortes. Acabou por dar entrada no Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto. O tumor cólon-rectal tinha alastrado aos ovários. Apesar da angústia, a esperança mantinha-se. A operação foi adiada à espera de um médico que tinha ido aos EUA. A cirurgia, mesmo com o especialista, acabou por não ser a planeada. A doença estava com uma evolução galopante.
Por esta altura, o cancro de Margarida era também a principal preocupação da afilhada, Catarina (nome fictício), que se recusava a aceitar a evolução da patologia. Foi tirar satisfações com o médico, que friamente lhe tirou qualquer ilusão de possível cura. Chegou a agarrar-lhe o braço. Era insuportável ouvir que “a segunda mãe” tinha uma doença terrível, das piores, em avanço acelerado. Conteve-se a custo para não ser rude, mas nunca mais conseguiu olhá-lo nos olhos.
«Foi um golpe profundo, senti a dor da perda. Senti uma revolta contra tudo e contra todos. Deixa-se de acreditar em Deus, nos médicos, na vida, nas pessoas... Mas, ao mesmo tempo, precisava de acreditar em tudo e em todos. Senti que iria encontrar forças nalgum lado para mudar tudo. Há uma força que nos diz para continuar», relata Catarina.
«Luta contra o inimigo dentro de ti»
Ao todo, foram dois anos e meio de luta. Catarina começa a ficar cada vez mais emocionada. Os olhos claros humedecem e a pele da cara fica ainda mais branca. «É uma luta contra o inimigo que está dentro de ti. É uma guerra para travar ao segundo. É uma doença que muda tudo. Pensa-se em recorrer ao estrangeiro, mobilizam-se todos os contactos. Vai-se à procura de toda a informação possível, desde as enciclopédias até à Internet», afirma.
Aguenta-se, apesar da exaustão. Há momentos em que se perde o norte e se acaba a andar à deriva em zonas proibidas do IPO. Há alturas em que faltam as forças para subir as escadas. Há situações em que reconhecer os familiares mais próximos exige um esforço desmesurado. «Só se consegue estar do primeiro ao último momento se se gostar muito, muito, muito daquela pessoa. Caso contrário, é impossível aguentar. É nestas alturas que se vêem os verdadeiros sentimentos», conta. As palavras tornam-se desnecessárias. Pela cabeça passam mil interrogações. «Só podia ser maldição para ter acontecido a Margarida, que sempre teve tantos cuidados com a saúde», era o que pensava.
No horizonte continuava a esperança. «Tens de acreditar. Se achas que os médicos são falíveis, também são eles que têm a chave de tudo», refere. Procurou todos os caminhos, mas não foi por isso que passou a ir mais à missa. «Nunca fui à bruxa nem nada do género. Esta era uma questão médica. Não vamos ser estúpidos», afirma. Foi uma vez a Montariol à procura do xarope de aloé vera. O momento acabou por ser decisivo. Catarina sentia que «tinha de correr uma maratona, mas não tinha sapatilhas para continuar». Foi aí que um frade lhe disse que, quando uma casa está a arder, devemos tentar apagar as chamas, em vez de avançarmos para elas. E, de repente, a lucidez voltou.
«Faz-se tudo para amenizar o sofrimento»
A degradação física da madrinha era uma realidade. Catarina queria resguardar Margarida de tudo e de todos. A doença passou a ser vivida por um núcleo muito restrito de pessoas. Começaram a jogar um jogo com a doente, para que ela não desistisse. «Se vomita, diz-se que a comida está estragada. Se está cansada, a culpa é do estado do tempo. Se não há mais tratamentos, assegura-se que é apenas uma interrupção. Faz-se tudo para amenizar o sofrimento», conta.
Não havia vagas nas camas de retaguarda do Porto. Rumaram ao «hotel da morte» de Coimbra. É assim que chama àquela unidade de cuidados paliativos. A versão oficial é que iam de férias para a “cidade dos estudantes”. Margarida sofreu uma oclusão. A maior preocupação era, por essa altura, a sua qualidade de vida. Catarina tirou uma semana de férias. O trabalho era a sua salvação. A doença absorvia todos os segundos, todas as energias.
Só no último mês de vida é que Margarida se confrontou com a morte. Continuando a ser a mulher de armas que sempre foi, queria manter a autonomia possível, mesmo quando já era um «cadáver andante». Só meteu baixa quando não podia mesmo trabalhar. Só deixou de conduzir quando não podia mesmo conduzir. Só deixou de tomar banho quando não podia mesmo tomar banho. Só deixou de falar dois dias antes de morrer. Esperou o dia de aniversário da filha de uma médica amiga, ligou o telemóvel e deu-lhe os parabéns. Depois, entrou num sono profundo.
Catarina vinha de Coimbra quando os peregrinos se dirigiam para Fátima, para celebrar o 13 de Outubro. Pediu a Nossa Senhora que levasse a madrinha. Ninguém aguentava mais. Margarida morreu «no dia em que tinha de morrer». Catarina viveu «a grande experiência» da sua vida. Continua a chorar. Com lágrimas que lhe caem pelo rosto, mas sobretudo com a alma. Para ela, o cancro é um monstro. O pior inimigo. O inimigo que está dentro de nós.
Lições
«A primeira lição que aprendi é que aquilo que preocupa as pessoas que estão doentes é diferente daquilo que elas imaginam quando estão saudáveis. Eu tive uma preocupação que nunca tinha imaginado poder vir a ter quando pensava que um dia poderia ter uma doença grave: acabar o curso era mais importante do que ficar curado. Causava-me alguma angústia saber se ia terminar a licenciatura naquele ano ou não, uma vez que estava a começar o último ano do curso quando fiquei doente.
A segunda lição é que o sofrimento dos que estão à nossa volta é muito superior ao sofrimento percepcionado pelos doentes, que têm maior controlo sobre a situação.
A terceira lição é que o único milagre que existe é o conhecimento científico que nos permite conhecer e tratar com cada vez maior eficácia estas doenças. Não havia mais nada que a sociedade me pudesse oferecer para além do tratamento altamente potenciador de esperança, que foi sedimentado ao longo de anos de descobertas. Não acredito em Deus. Aquilo em que acreditava antes de estar doente é aquilo em que acredito hoje. Não precisei de apoio espiritual ao longo da doença».
Sobrevivente a um linfoma
«Nada acontece por acaso. A lição que eu aprendi é que temos de fazer um percurso. Nem sempre o entendemos ou aceitamos, mas temos de percorrê-lo. Descobrimos forças que desconhecemos e somos capazes de coisas que julgamos impossíveis. Só em situações-limite percebemos o verdadeiro valor do afecto. Só em casos extremos vemos que a vida vale, ao mesmo tempo, tanto e tão pouco. Não somos donos dela».
Familiar de uma mulher que morreu de cancro cólon-rectal
A segunda lição é que o sofrimento dos que estão à nossa volta é muito superior ao sofrimento percepcionado pelos doentes, que têm maior controlo sobre a situação.
A terceira lição é que o único milagre que existe é o conhecimento científico que nos permite conhecer e tratar com cada vez maior eficácia estas doenças. Não havia mais nada que a sociedade me pudesse oferecer para além do tratamento altamente potenciador de esperança, que foi sedimentado ao longo de anos de descobertas. Não acredito em Deus. Aquilo em que acreditava antes de estar doente é aquilo em que acredito hoje. Não precisei de apoio espiritual ao longo da doença».
Sobrevivente a um linfoma
«Nada acontece por acaso. A lição que eu aprendi é que temos de fazer um percurso. Nem sempre o entendemos ou aceitamos, mas temos de percorrê-lo. Descobrimos forças que desconhecemos e somos capazes de coisas que julgamos impossíveis. Só em situações-limite percebemos o verdadeiro valor do afecto. Só em casos extremos vemos que a vida vale, ao mesmo tempo, tanto e tão pouco. Não somos donos dela».
Familiar de uma mulher que morreu de cancro cólon-rectal
Produtos da Fábrica Confiança evocam memórias e fazem sonhar
Empresa aposta em artigos de valor acrescentado para competir no mercado
Não são apenas sabonetes. São imagens e cheiros que evocam memórias. São pretextos para sonhos passados noutros tempos e lugares. É nesta magia que a Confiança aposta para afirmar os seus produtos no mercado. A par das linhas vendidas em supermercados, a empresa bracarense com 113 anos tem comercializado produtos com maior valor acrescentado, maioritariamente feitos à mão. Depois da linha de homem, está a ser preparada uma gama de tratamento dedicada ao público feminino. A fábrica tem 30 funcionários e um volume de negócios de um milhão e 800 mil euros. Trinta por cento da produção é para exportação, para destinos como os EUA, Japão, Nova Zelândia ou Escandinávia. (Reportagem publicada a 12 de Novembro de 2007 no Diário do Minho. Foto Avelino Lima/Diário do Minho)
O pavilhão fica ligeiramente escondido no Parque Industrial de Sobreposta, ao lado de empresas clássicas de Braga como a Cachapuz, a Pachancho e a Império. Apesar de lá estar o nome, nada no edifício faz lembrar a imponência do imóvel que outrora ocupou na Rua Nova de Santa Cruz. Só quando José Peixoto abre as portas é que se começa a perceber pelo cheio e pelas imagens que ali é a fábrica Confiança.
Na parede, o certificado de qualidade está colocado ao lado de relíquias como o Diploma de Honra conseguido em 1927 na V Exposição das Caldas da Rainha ou o documento comprovativo da participação na Feira de Amostras de Aromas de 1932. Os relógios, com múltiplas formas, testemunham a longevidade desta empresa: 113 anos.
A responsável de vendas e marketing, Cristina Maia, e o encarregado de produção, José Peixoto, os cicerones, simbolizam o presente desta firma, que une gerações diferentes em torno de um objectivo comum. Com um longo percurso, a Confiança foi adquirida em 2005 pela Change Partners, uma sociedade de capital de risco que assumiu a missão de relançar a empresa. A mudança de instalações, que na altura já estava em curso, foi terminada.
A certificação foi um ponto de honra para a nova gestão. O objectivo foi atingido em Abril deste ano, com a obtenção da certificação pela ISO 9001:2000, tornando-se assim na única empresa do sector em Portugal que vê reconhecidos os seus métodos de produção e qualidade dos produtos.
Esta nova etapa da empresa implicou também mudanças na forma de trabalhar os produtos e nos mercados-alvo. José Peixoto, há décadas na Confiança, já trabalhou com dez administrações. Este funcionário começou a fabricar sabão, passou por todos os sectores e agora lidera a produção. «Muita coisa mudou ao longo dos anos. Mudou a mentalidade, a forma de trabalhar. Os nossos produtos estão diferentes. Estão diferentes na imagem e nos perfumes», afirma.
A prova daquilo que diz está em alguns armários que contêm os produtos que a fábrica foi produzindo ao longo dos anos. Actualmente a empresa lança no mercado fundamentalmente sabonetes, sabão, glicerinas, água de colónia, pó de talco, sais de banho, creme de barbear e ceras, produzidos por uma equipa de 30 pessoas, que se traduz numa facturação anual de 1,8 milhões de euros.
História de Portugal em sabonetes
Dentro daqueles escaparates estão sobretudo sabonetes de várias épocas, com invólucros para todos os gostos. É que para além dos sabonetes propriamente ditos, a fábrica sempre apostou muito na imagem que os envolvia. A juntar à função prática de lavar e perfumar, aquelas peças são também objectos de decoração. «Pode fazer-se a história de Portugal em sabonetes. A partir daqui podemos ter uma ideia do que se usava e do que ia sendo o gosto colectivo», constata Cristina Maia.
Rótulos de 1920/30, uma elegante boneca pintada à mão concebida para assinalar as bodas de ouro da fábrica e um sabonete evocativo da exposição de 1940 surgem ao lado dos sabonetes da Académica, do Benfica, do Porto ou do Salgueiros. Mas há também sabonetes personalizados com o nome de farmácias, uma iniciativa que foi lançada há cerca de uma década e que teve boa aceitação no mercado, especialmente no Norte.
Se na lista de produtos estão os que são feitos através de processos mecanizados – e a máquina tem capacidade para fazer cinco mil sabonetes por hora – também estão os que são acabados e embalados à mão. A massa que serve de base é a mesma para todos os sabonetes, mas há uns que depois são mais trabalhados do que outros. A responsável de marketing admite que a aposta nos produtos de maior valor acrescentado permite superar uma das limitações da fábrica: a falta de dimensão.
«Somos uma fábrica pequenina, que nunca poderá competir com sabonetes em supermercado ou em linear de supermercado. Esse é um segmento que nós prezamos, e ainda temos alguns bons clientes, pois vendemos para o Modelo e Continente, para uma série de grandes superfícies de distribuição, mas no qual é difícil competir devido ao nosso tamanho», explica Cristina Maia. O sabonete “Alfazema” é o mais vendido na linha “mass market”.
Os sabonetes acabados à mão exigem mais investimento do que os produzidos numa máquina que faz cinco mil à hora. «Exige outro investimento, pois implicam uma manualidade e um cuidado em termos de preparação muito maiores. Esses sabonetes não custam, logicamente, o mesmo que custa um sabonete de supermercado. Mas não se pretende aqui uma coisa para se tomar banho; é mais um bocadinho do que isso. É tomar banho e sonhar. É conseguir fazer uma viagem», diz a responsável de marketing.
Novos produtos, velhas memórias
Nas vitrinas estão também os produtos que foram relançados ou reajustados ao gosto dos nossos dias. Em breve chegará mais uma colecção. Cristina Maia revela que, no próximo ano, será lançada uma gama de tratamento com três sabonetes de base coco: «É uma gama tipicamente feminina, mais para a Primavera e para quando as preocupações com o corpo são grandes. O produto inclui um sabonete exfoliante, um hidratante e um anti-celulítico».
Os projectos revelam a preocupação de explorar mercados e colmatar lacunas, como a que havia nos produtos destinados aos homens. «Fizemos também uma linha de homem, chamada “O Melhor”, que inclui um creme de barbear, um sabonete exfoliante e um bálsamo “after shave”. Essa era uma grande falha no mercado. Toda a gente ficou apaixonada pela linha que lançámos e resultou muito bem», conta a comercial.
Para o Natal, a Confiança fez o relançamento da linha “Mimosa”, uma gama antiga que foi retomada. «Lançámos também uma linha mais moderna, mais “clean” do que as nossas linhas clássicas e retro, que também tem algum lugar no mercado, mais associada às linhas saúde e spas», conta.
Só que o mercado tem, por vezes, razões misteriosas. «Nós achávamos que esta linha mais “clean” iria sair muito melhor do que as outras em alguns dos segmentos, mas por uma questão de moda pura as outras saíram tão bem como esta. Isto tem muito de sentimento e de emoção. A experiência de compra deste tipo de produto passa sempre por aí», afirma a mesma responsável.
«Eu passei algum tempo a ver as pessoas a comprarem os produtos e constatei que as linhas mais clássicas evocam memórias. As pessoas lembram-se de coisas, como a casa onde passavam férias quando eram pequenas ou a avó com a qual conviviam», sustenta. Em seu entender, é correcto dizer que se compra um sabonete e uma recordação. «Compra-se mesmo uma memória. É como se tivéssemos uma imagem mental do cheiro», acrescenta.
Diversificação de mercados
Cristina Maia salienta o trabalho que tem sido feito no sentido de «trazer para Portugal as linhas clássicas que estavam só a ser trabalhadas e vendidas no exterior».
Os clientes da Confiança estão em Portugal, mas também no estrangeiro. «São mercados igualmente importantes e igualmente trabalhados. Vendemos cerca de 30 por cento para exportação, mas temos muito orgulho em vender para Portugal este tipo de produto. Somos uma empresa portuguesa que se orgulha de o ser», explica.
A firma já está implantada nos mercados dos EUA, Japão, Nova Zelândia e Escandinávia, entre outros. «Em 2008 vamos trabalhar alguns mercados de exportação. Os mercados querem-se cuidados e bem tratados. Vamos continuar a trabalhá-los um de cada vez», adianta a mesma responsável.
Para o próximo ano perspectiva-se também a continuação do trabalho de divulgação da empresa, que já permitiu a entrada nos Parques de Sintra e na Fundação Gulbenkian. «Este ano as apostas vão ser num trabalho muito focado no marketing e nas vendas. Vamos tentar lançar a Confiança em força, trazer algumas novidades em termos de produtos, mas também algumas novidades em termos de maneira de estar», refere.
«A visibilidade da Confiança é muito reservada. Somos muito discretos. A ideia não é passarmos a ser exageradamente mediáticos, mas pelo menos marcarmos presença no sector e não passarmos despercebidos. Queremos pegar nas pessoas que aqui estão e na história que elas têm, juntá-la em sabonetes e mostrar o resultado final aos que ainda não nos conhecem. Essa é a nossa aposta forte», declara.
Não são apenas sabonetes. São imagens e cheiros que evocam memórias. São pretextos para sonhos passados noutros tempos e lugares. É nesta magia que a Confiança aposta para afirmar os seus produtos no mercado. A par das linhas vendidas em supermercados, a empresa bracarense com 113 anos tem comercializado produtos com maior valor acrescentado, maioritariamente feitos à mão. Depois da linha de homem, está a ser preparada uma gama de tratamento dedicada ao público feminino. A fábrica tem 30 funcionários e um volume de negócios de um milhão e 800 mil euros. Trinta por cento da produção é para exportação, para destinos como os EUA, Japão, Nova Zelândia ou Escandinávia. (Reportagem publicada a 12 de Novembro de 2007 no Diário do Minho. Foto Avelino Lima/Diário do Minho)
O pavilhão fica ligeiramente escondido no Parque Industrial de Sobreposta, ao lado de empresas clássicas de Braga como a Cachapuz, a Pachancho e a Império. Apesar de lá estar o nome, nada no edifício faz lembrar a imponência do imóvel que outrora ocupou na Rua Nova de Santa Cruz. Só quando José Peixoto abre as portas é que se começa a perceber pelo cheio e pelas imagens que ali é a fábrica Confiança.
Na parede, o certificado de qualidade está colocado ao lado de relíquias como o Diploma de Honra conseguido em 1927 na V Exposição das Caldas da Rainha ou o documento comprovativo da participação na Feira de Amostras de Aromas de 1932. Os relógios, com múltiplas formas, testemunham a longevidade desta empresa: 113 anos.
A responsável de vendas e marketing, Cristina Maia, e o encarregado de produção, José Peixoto, os cicerones, simbolizam o presente desta firma, que une gerações diferentes em torno de um objectivo comum. Com um longo percurso, a Confiança foi adquirida em 2005 pela Change Partners, uma sociedade de capital de risco que assumiu a missão de relançar a empresa. A mudança de instalações, que na altura já estava em curso, foi terminada.
A certificação foi um ponto de honra para a nova gestão. O objectivo foi atingido em Abril deste ano, com a obtenção da certificação pela ISO 9001:2000, tornando-se assim na única empresa do sector em Portugal que vê reconhecidos os seus métodos de produção e qualidade dos produtos.
Esta nova etapa da empresa implicou também mudanças na forma de trabalhar os produtos e nos mercados-alvo. José Peixoto, há décadas na Confiança, já trabalhou com dez administrações. Este funcionário começou a fabricar sabão, passou por todos os sectores e agora lidera a produção. «Muita coisa mudou ao longo dos anos. Mudou a mentalidade, a forma de trabalhar. Os nossos produtos estão diferentes. Estão diferentes na imagem e nos perfumes», afirma.
A prova daquilo que diz está em alguns armários que contêm os produtos que a fábrica foi produzindo ao longo dos anos. Actualmente a empresa lança no mercado fundamentalmente sabonetes, sabão, glicerinas, água de colónia, pó de talco, sais de banho, creme de barbear e ceras, produzidos por uma equipa de 30 pessoas, que se traduz numa facturação anual de 1,8 milhões de euros.
História de Portugal em sabonetes
Dentro daqueles escaparates estão sobretudo sabonetes de várias épocas, com invólucros para todos os gostos. É que para além dos sabonetes propriamente ditos, a fábrica sempre apostou muito na imagem que os envolvia. A juntar à função prática de lavar e perfumar, aquelas peças são também objectos de decoração. «Pode fazer-se a história de Portugal em sabonetes. A partir daqui podemos ter uma ideia do que se usava e do que ia sendo o gosto colectivo», constata Cristina Maia.
Rótulos de 1920/30, uma elegante boneca pintada à mão concebida para assinalar as bodas de ouro da fábrica e um sabonete evocativo da exposição de 1940 surgem ao lado dos sabonetes da Académica, do Benfica, do Porto ou do Salgueiros. Mas há também sabonetes personalizados com o nome de farmácias, uma iniciativa que foi lançada há cerca de uma década e que teve boa aceitação no mercado, especialmente no Norte.
Se na lista de produtos estão os que são feitos através de processos mecanizados – e a máquina tem capacidade para fazer cinco mil sabonetes por hora – também estão os que são acabados e embalados à mão. A massa que serve de base é a mesma para todos os sabonetes, mas há uns que depois são mais trabalhados do que outros. A responsável de marketing admite que a aposta nos produtos de maior valor acrescentado permite superar uma das limitações da fábrica: a falta de dimensão.
«Somos uma fábrica pequenina, que nunca poderá competir com sabonetes em supermercado ou em linear de supermercado. Esse é um segmento que nós prezamos, e ainda temos alguns bons clientes, pois vendemos para o Modelo e Continente, para uma série de grandes superfícies de distribuição, mas no qual é difícil competir devido ao nosso tamanho», explica Cristina Maia. O sabonete “Alfazema” é o mais vendido na linha “mass market”.
Os sabonetes acabados à mão exigem mais investimento do que os produzidos numa máquina que faz cinco mil à hora. «Exige outro investimento, pois implicam uma manualidade e um cuidado em termos de preparação muito maiores. Esses sabonetes não custam, logicamente, o mesmo que custa um sabonete de supermercado. Mas não se pretende aqui uma coisa para se tomar banho; é mais um bocadinho do que isso. É tomar banho e sonhar. É conseguir fazer uma viagem», diz a responsável de marketing.
Novos produtos, velhas memórias
Nas vitrinas estão também os produtos que foram relançados ou reajustados ao gosto dos nossos dias. Em breve chegará mais uma colecção. Cristina Maia revela que, no próximo ano, será lançada uma gama de tratamento com três sabonetes de base coco: «É uma gama tipicamente feminina, mais para a Primavera e para quando as preocupações com o corpo são grandes. O produto inclui um sabonete exfoliante, um hidratante e um anti-celulítico».
Os projectos revelam a preocupação de explorar mercados e colmatar lacunas, como a que havia nos produtos destinados aos homens. «Fizemos também uma linha de homem, chamada “O Melhor”, que inclui um creme de barbear, um sabonete exfoliante e um bálsamo “after shave”. Essa era uma grande falha no mercado. Toda a gente ficou apaixonada pela linha que lançámos e resultou muito bem», conta a comercial.
Para o Natal, a Confiança fez o relançamento da linha “Mimosa”, uma gama antiga que foi retomada. «Lançámos também uma linha mais moderna, mais “clean” do que as nossas linhas clássicas e retro, que também tem algum lugar no mercado, mais associada às linhas saúde e spas», conta.
Só que o mercado tem, por vezes, razões misteriosas. «Nós achávamos que esta linha mais “clean” iria sair muito melhor do que as outras em alguns dos segmentos, mas por uma questão de moda pura as outras saíram tão bem como esta. Isto tem muito de sentimento e de emoção. A experiência de compra deste tipo de produto passa sempre por aí», afirma a mesma responsável.
«Eu passei algum tempo a ver as pessoas a comprarem os produtos e constatei que as linhas mais clássicas evocam memórias. As pessoas lembram-se de coisas, como a casa onde passavam férias quando eram pequenas ou a avó com a qual conviviam», sustenta. Em seu entender, é correcto dizer que se compra um sabonete e uma recordação. «Compra-se mesmo uma memória. É como se tivéssemos uma imagem mental do cheiro», acrescenta.
Diversificação de mercados
Cristina Maia salienta o trabalho que tem sido feito no sentido de «trazer para Portugal as linhas clássicas que estavam só a ser trabalhadas e vendidas no exterior».
Os clientes da Confiança estão em Portugal, mas também no estrangeiro. «São mercados igualmente importantes e igualmente trabalhados. Vendemos cerca de 30 por cento para exportação, mas temos muito orgulho em vender para Portugal este tipo de produto. Somos uma empresa portuguesa que se orgulha de o ser», explica.
A firma já está implantada nos mercados dos EUA, Japão, Nova Zelândia e Escandinávia, entre outros. «Em 2008 vamos trabalhar alguns mercados de exportação. Os mercados querem-se cuidados e bem tratados. Vamos continuar a trabalhá-los um de cada vez», adianta a mesma responsável.
Para o próximo ano perspectiva-se também a continuação do trabalho de divulgação da empresa, que já permitiu a entrada nos Parques de Sintra e na Fundação Gulbenkian. «Este ano as apostas vão ser num trabalho muito focado no marketing e nas vendas. Vamos tentar lançar a Confiança em força, trazer algumas novidades em termos de produtos, mas também algumas novidades em termos de maneira de estar», refere.
«A visibilidade da Confiança é muito reservada. Somos muito discretos. A ideia não é passarmos a ser exageradamente mediáticos, mas pelo menos marcarmos presença no sector e não passarmos despercebidos. Queremos pegar nas pessoas que aqui estão e na história que elas têm, juntá-la em sabonetes e mostrar o resultado final aos que ainda não nos conhecem. Essa é a nossa aposta forte», declara.
Experiência garante produtos de qualidade superior
A Confiança aposta em métodos de trabalho que asseguram produtos de qualidade
superior. Um quadro de pessoal experiente, habituado a fazer um trabalho de excelência, é uma das mais-valias da fábrica. «A qualidade dos nossos produtos é claramente superior à de outros idênticos e do que se vende num supermercado. Mesmo os nossos produtos que são vendidos em supermercado têm qualidade superior», afirma a responsável comercial e de marketing.
Cristina Maia considera que «a experiência e a tradição» de quem trabalha na empresa há muitos anos são os pontos fortes da Confiança, entre os quais se encontra também a «parte mais jovem» da firma e a «vontade de trabalhar». «As pessoas têm orgulho em fazer um sabonete Confiança. Tratam a Confiança como tratam a sua casa, até porque muitos já aqui trabalham há mais de 30 anos. Têm plena consciência da importância daquilo que fazem. E isso é um orgulho para quem está na parte de gestão», assegura.
Ainda em relação aos recursos humanos, esta engenheira defende que «são pessoas muito elásticas e muito habituadas a trabalhar e a trabalhar bem», por isso «quando se lhes pede para trabalharem bem, não é nada de complicado porque têm orgulho em fazer bem feito aquilo que fazem». «São pessoas que já mudaram tantas vezes e tanto que estão habituadas à mudança. E quando as mudanças são bem explicadas e todos percebem a razão de ser das coisas não há qualquer obstáculo», acrescenta.
Uma parte importante dos métodos de trabalho manteve-se inalterada ao longo dos anos. «Há coisas que é estratégico que se conservem iguais. Faz parte do segredo do negócio e da maneira de estar no mercado», afirma Cristina Maia.
Fábricas produz vários artigos
Uma grande parte do espaço do pavilhão é dedicada à produção de sabonetes. A massa de sabão, que outrora era feita na Confiança, é adquirida na Malásia. São pequenos grãos que servirão de base para todos os sabonetes. A este produto serão juntados os aditivos e os óleos essenciais, que diferenciarão os sabonetes.
Este granulo vai para dentro de uma máquina para ser moído e laminado cinco vezes, antes de ser extrudida duas vezes. No caso dos sabonetes topo de gama, a massa sai do compressor e vai para moldes individuais, que darão a forma e as inscrições específicas a cada produto.
Nos artigos destinados a “mass market”, a pasta sai do compressor num fluxo ininterrupto, em forma de barra, sendo outra máquina que corta os sabonetes à medida pré-determinada. Os sabonetes, já com a forma final, passam por um controlo de qualidade. Funcionárias, de luvas, inspeccionam os sabonetes e rejeitam os que têm imperfeições, que voltam à fase inicial de triturar a massa. Segue-se, depois, a embalagem.
Numa sala ao lado, põem-se as águas de colónia em frascos, onde depois são colocados os rótulos. A Confiança tem um projecto para uma água de colónia topo de gama, depois de ter experimentado uma parceria com os Parques de Sinta, que vai ser repetida. Para além disso, está na forja a aposta em produtos como champôs, sabonetes e géis de banho para hotéis de luxo, bem como sabonetes líquidos para a gama alta.
Noutro espaço é feita a embalagem do pó de talco. A fábrica compra este minério, perfuma-o e embala-o. A imagem deste produto vai mudar a breve prazo.
Uma sala de dimensões consideráveis é dedicada ao fabrico do sabão – aqui a unidade também faz a parte da saponificação –, das glicerinas e das ceras.
Num espaço climatizado, com filtragem da água e do ar, é feito o creme de barbear, seguindo exactamente os mesmos procedimentos que em 1920. Este é um produto vendido em grandes superfícies, mas que começa a ser valorizado em mercados como os EUA e a Inglaterra.
A qualidade dos produtos é testada num laboratório, embora algum do trabalho seja feito por entidades externas. É neste espaço que também são feitos testes para novos produtos.
Quem pensa numa fábrica de cosméticos provavelmente não imaginará que lá dentro existe uma tipografia. Mas existe e a funcionar. «Desde o início que a embalagem era muito cuidada, por isso a preocupação de ter uma tipografia», explica Cristina Maia, referindo que, na actualidade, este serviço permite dar resposta a solicitações de pequenas séries, como por exemplo encomendas para casamentos.
superior. Um quadro de pessoal experiente, habituado a fazer um trabalho de excelência, é uma das mais-valias da fábrica. «A qualidade dos nossos produtos é claramente superior à de outros idênticos e do que se vende num supermercado. Mesmo os nossos produtos que são vendidos em supermercado têm qualidade superior», afirma a responsável comercial e de marketing.
Cristina Maia considera que «a experiência e a tradição» de quem trabalha na empresa há muitos anos são os pontos fortes da Confiança, entre os quais se encontra também a «parte mais jovem» da firma e a «vontade de trabalhar». «As pessoas têm orgulho em fazer um sabonete Confiança. Tratam a Confiança como tratam a sua casa, até porque muitos já aqui trabalham há mais de 30 anos. Têm plena consciência da importância daquilo que fazem. E isso é um orgulho para quem está na parte de gestão», assegura.
Ainda em relação aos recursos humanos, esta engenheira defende que «são pessoas muito elásticas e muito habituadas a trabalhar e a trabalhar bem», por isso «quando se lhes pede para trabalharem bem, não é nada de complicado porque têm orgulho em fazer bem feito aquilo que fazem». «São pessoas que já mudaram tantas vezes e tanto que estão habituadas à mudança. E quando as mudanças são bem explicadas e todos percebem a razão de ser das coisas não há qualquer obstáculo», acrescenta.
Uma parte importante dos métodos de trabalho manteve-se inalterada ao longo dos anos. «Há coisas que é estratégico que se conservem iguais. Faz parte do segredo do negócio e da maneira de estar no mercado», afirma Cristina Maia.
Fábricas produz vários artigos
Uma grande parte do espaço do pavilhão é dedicada à produção de sabonetes. A massa de sabão, que outrora era feita na Confiança, é adquirida na Malásia. São pequenos grãos que servirão de base para todos os sabonetes. A este produto serão juntados os aditivos e os óleos essenciais, que diferenciarão os sabonetes.
Este granulo vai para dentro de uma máquina para ser moído e laminado cinco vezes, antes de ser extrudida duas vezes. No caso dos sabonetes topo de gama, a massa sai do compressor e vai para moldes individuais, que darão a forma e as inscrições específicas a cada produto.
Nos artigos destinados a “mass market”, a pasta sai do compressor num fluxo ininterrupto, em forma de barra, sendo outra máquina que corta os sabonetes à medida pré-determinada. Os sabonetes, já com a forma final, passam por um controlo de qualidade. Funcionárias, de luvas, inspeccionam os sabonetes e rejeitam os que têm imperfeições, que voltam à fase inicial de triturar a massa. Segue-se, depois, a embalagem.
Numa sala ao lado, põem-se as águas de colónia em frascos, onde depois são colocados os rótulos. A Confiança tem um projecto para uma água de colónia topo de gama, depois de ter experimentado uma parceria com os Parques de Sinta, que vai ser repetida. Para além disso, está na forja a aposta em produtos como champôs, sabonetes e géis de banho para hotéis de luxo, bem como sabonetes líquidos para a gama alta.
Noutro espaço é feita a embalagem do pó de talco. A fábrica compra este minério, perfuma-o e embala-o. A imagem deste produto vai mudar a breve prazo.
Uma sala de dimensões consideráveis é dedicada ao fabrico do sabão – aqui a unidade também faz a parte da saponificação –, das glicerinas e das ceras.
Num espaço climatizado, com filtragem da água e do ar, é feito o creme de barbear, seguindo exactamente os mesmos procedimentos que em 1920. Este é um produto vendido em grandes superfícies, mas que começa a ser valorizado em mercados como os EUA e a Inglaterra.
A qualidade dos produtos é testada num laboratório, embora algum do trabalho seja feito por entidades externas. É neste espaço que também são feitos testes para novos produtos.
Quem pensa numa fábrica de cosméticos provavelmente não imaginará que lá dentro existe uma tipografia. Mas existe e a funcionar. «Desde o início que a embalagem era muito cuidada, por isso a preocupação de ter uma tipografia», explica Cristina Maia, referindo que, na actualidade, este serviço permite dar resposta a solicitações de pequenas séries, como por exemplo encomendas para casamentos.
Empresa quer mostrar espólio num museu
A fábrica Confiança vai apresentar à Câmara Municipal de Braga um projecto para a criação de um museu. «Há um projecto para um museu, para uma exposição e estamos a trabalhar com o Turismo para, numa das ofertas de Braga, para além dos farricocos, dos galos de Barcelos e dos azulejos, se passar a ter também uma colecção de sabonetes da Fábrica Confiança», revela a responsável comercial e de marketing.
Moldes, rótulos, sabonetes, frascos, fotografias e algumas máquinas são o núcleo duro do espólio que está a aguardar divulgação. «Ninguém consegue passar por aqui sem ficar com a ideia de que um museu faz todo o sentido», afirma Cristina Maia.
A empresa guarda os moldes e cunhos que usou ao longo da sua história, alguns dos quais estão a ser reutilizados para o relançamento de linhas.
Noutro espaço, estão guardados os rótulos dos diferentes produtos e os frascos em que eram vendidos os líquidos, alguns dos quais remontam o início da história da fábrica.
A mesma responsável admite que a criação do museu seria uma forma de dar outra visibilidade à fábrica, na cidade onde existe há 113 anos e onde chegou a constituir um dos grandes pólos empregadores.
«Acho que Braga se esqueceu da Confiança, com muita pena minha que sou bracarense, também por culpa da Confiança, que sempre teve uma postura discreta, tirando nos anos 40/50, altura em que seria um dos maiores empregadores da região. A imagem da Confiança foi-se diluindo no tempo e desapareceu», admite.
No entanto, salienta que «ainda há quem valorize a Confiança, em Braga e noutros lados». «Há muita gente que ainda reconhece a marca. Ainda há muita gente que se lembra e que tem alguém da família que trabalhou ou que de alguma forma esteve ligado à Confiança. O sabão rosa Confiança é um ícone, um marco, e há-de ser sempre. As pessoas associam sabão rosa à Confiança. Nos sabonetes, eu espero que o reconhecimento também seja igual dentro em breve», completa.
A empresa chegou a ser um ponto de cultura, com uma biblioteca muito grande e com encontros de funcionários, viagens e visitas. «As pessoas sempre foram um ponto muito importante na Confiança e isso ainda hoje continua a ser um ponto de honra com os actuais donos. As pessoas são um ponto muito importante e fundamental na evolução da Confiança. Foram as pessoas que permitiram que a Confiança continuasse a existir ao longo de 113 anos, apesar das crises que foram sendo atravessadas», assegura Cristina Maia.
Moldes, rótulos, sabonetes, frascos, fotografias e algumas máquinas são o núcleo duro do espólio que está a aguardar divulgação. «Ninguém consegue passar por aqui sem ficar com a ideia de que um museu faz todo o sentido», afirma Cristina Maia.
A empresa guarda os moldes e cunhos que usou ao longo da sua história, alguns dos quais estão a ser reutilizados para o relançamento de linhas.
Noutro espaço, estão guardados os rótulos dos diferentes produtos e os frascos em que eram vendidos os líquidos, alguns dos quais remontam o início da história da fábrica.
A mesma responsável admite que a criação do museu seria uma forma de dar outra visibilidade à fábrica, na cidade onde existe há 113 anos e onde chegou a constituir um dos grandes pólos empregadores.
«Acho que Braga se esqueceu da Confiança, com muita pena minha que sou bracarense, também por culpa da Confiança, que sempre teve uma postura discreta, tirando nos anos 40/50, altura em que seria um dos maiores empregadores da região. A imagem da Confiança foi-se diluindo no tempo e desapareceu», admite.
No entanto, salienta que «ainda há quem valorize a Confiança, em Braga e noutros lados». «Há muita gente que ainda reconhece a marca. Ainda há muita gente que se lembra e que tem alguém da família que trabalhou ou que de alguma forma esteve ligado à Confiança. O sabão rosa Confiança é um ícone, um marco, e há-de ser sempre. As pessoas associam sabão rosa à Confiança. Nos sabonetes, eu espero que o reconhecimento também seja igual dentro em breve», completa.
A empresa chegou a ser um ponto de cultura, com uma biblioteca muito grande e com encontros de funcionários, viagens e visitas. «As pessoas sempre foram um ponto muito importante na Confiança e isso ainda hoje continua a ser um ponto de honra com os actuais donos. As pessoas são um ponto muito importante e fundamental na evolução da Confiança. Foram as pessoas que permitiram que a Confiança continuasse a existir ao longo de 113 anos, apesar das crises que foram sendo atravessadas», assegura Cristina Maia.
Do sabão à cosmética de luxo
A Saboaria e Perfumaria Confiança foi fundada a 12 de Outubro de 1894. Começou por fabricar sabão do tipo “offenbach”, mas acabou por se aventurar a vender produtos de cosmética de elevada qualidade, fabricados em Portugal, numa altura em que estes produtos eram maioritariamente importados. Em 1910, foram lançadas as primeiras marcas próprias, com designs e fórmulas originais adaptadas.
Depois da I Grande Guerra, a empresa teve um período de forte expansão, com a ampliação das instalações fabris, que incluíam uma tipografia e uma cartonagem, onde se produziam todas as embalagens.
Em 1919, a gama de produtos da Confiança estendia-se a sabonetes perfumados, finos, transparentes, pó de arroz, águas de colónia, sabonetes medicinais, extractos extrafinos e óleos provenientes das então colónias portuguesas.
Em 1928, a unidade de produção fabricava cerca de 150 marcas diferentes de sabonetes, pó de arroz, cremes, pastas dentífricas, stiques de barbear, águas de colónia, loções e essências.
As influências artísticas da Art Nouveau e da Art Déco que se fizeram sentir nos anos 20, estão ainda hoje bem patentes nos produtos clássicos da Confiança, todos eles recuperados do rico portfólio de designs e receitas da unidade fabril. Como exemplos, a empresa aponta as gamas como o “Alfazema de Portugal”, “O Meu Sabonete”, “Mariposa” ou “O Melhor”.
«A combinação da forma, características do sabonete e embalagem é uma arte passada entre gerações, que permite à Confiança preservar toda a sua essência. Para a Confiança, cada um dos seus produtos é mais do que um cosmético. É um pedaço de história, uma memória e um bocadinho de cada um dos seus colaboradores», sublinham os responsáveis pela empresa.
A firma faz questão de destacar que os ingredientes usados são de origem natural vegetal e não são testados em animais. Os sabonetes são manipulados obedecendo às melhores práticas de fabrico na indústria cosmética. Com o controlo de qualidade feito em todas as fases de fabrico e envolvendo todos os participantes no processo, os produtos finais são, depois, avaliados por laboratórios externos certificados.
Depois da I Grande Guerra, a empresa teve um período de forte expansão, com a ampliação das instalações fabris, que incluíam uma tipografia e uma cartonagem, onde se produziam todas as embalagens.
Em 1919, a gama de produtos da Confiança estendia-se a sabonetes perfumados, finos, transparentes, pó de arroz, águas de colónia, sabonetes medicinais, extractos extrafinos e óleos provenientes das então colónias portuguesas.
Em 1928, a unidade de produção fabricava cerca de 150 marcas diferentes de sabonetes, pó de arroz, cremes, pastas dentífricas, stiques de barbear, águas de colónia, loções e essências.
As influências artísticas da Art Nouveau e da Art Déco que se fizeram sentir nos anos 20, estão ainda hoje bem patentes nos produtos clássicos da Confiança, todos eles recuperados do rico portfólio de designs e receitas da unidade fabril. Como exemplos, a empresa aponta as gamas como o “Alfazema de Portugal”, “O Meu Sabonete”, “Mariposa” ou “O Melhor”.
«A combinação da forma, características do sabonete e embalagem é uma arte passada entre gerações, que permite à Confiança preservar toda a sua essência. Para a Confiança, cada um dos seus produtos é mais do que um cosmético. É um pedaço de história, uma memória e um bocadinho de cada um dos seus colaboradores», sublinham os responsáveis pela empresa.
A firma faz questão de destacar que os ingredientes usados são de origem natural vegetal e não são testados em animais. Os sabonetes são manipulados obedecendo às melhores práticas de fabrico na indústria cosmética. Com o controlo de qualidade feito em todas as fases de fabrico e envolvendo todos os participantes no processo, os produtos finais são, depois, avaliados por laboratórios externos certificados.
«A interactividade na TDT é de certa forma limitada»
Todos os canais da televisão digital vão ser de alta definição
Sérgio Denicoli, que está a fazer o doutoramento em Ciências da Comunicação na Universidade do Minho, desfaz o mito de que a Televisão Digital Terrestre (TDT) é sinónimo de televisão interactiva. O novo modelo vai permitir que, a partir 2012, todos os canais sejam de alta definição, mas também vai ter implicações no bolso dos telespectadores, que vão ser obrigados a comprar um descodificador. (A entrevista foi publicada em Março de 2008 no Diário do Minho. Há parte já ultrapassadas que não são aqui reproduzidas)
O que é a Televisão Digital Terrestre?
A televisão é a emissão de um sinal que chega a um receptor, que o converte em imagens e sons. Existem vários tipos de transmissões: na televisão por cabo o sinal chega a nossa casa por fibra óptica, na televisão por satélite o sinal vem pelo satélite e nós temos uma pequena antena que o recebe, na IPTV o sinal vem por cabo de cobre (pela linha telefónica) e na televisão terrestre o sinal chega pelo ar através de ondas de rádiodifusão. A televisão de que falamos agora é a TDT. Com o digital, deixamos de ter ondas analógicas e passamos a usar a linguagem binária, que é a mesma dos computadores. Na televisão digital, o sinal é comprimido porque é a linguagem é binária, o que nos permite ter mais espaço no espectro.
O que é que se pode fazer com o espectro remanescente?
Em Portugal, optou-se por lançar mais um canal de televisão aberta e diversos canais de televisão paga, de âmbito nacional e regional. Também ficou decidido que, a partir de 2012, com o apagão analógico, todos os canais de televisão digital vão ser de alta definição, isto é, terão imagens formadas por mais pontos. Na televisão analógica temos a imagem formada por linhas, enquanto que na televisão digital é formada por pontos. A televisão de alta definição permite perceber melhor a imagem.
Vamos ter de possuir um descodificador para receber a TDT?
Os aparelhos de televisão que temos hoje são analógicos e para termos a conversão do sinal digital precisaremos de uma “set-top-box” que será ligada aos televisores, tanto para ver a televisão aberta e gratuita como para ver os canais pagos. Os telespectadores vão ter de comprar esse descodificador porque o Governo já disse que não vai subsidiar a sua aquisição.
Essa tecnologia tem mais potencialidades?
Sim. Podemos ter descodificadores com alguns serviços de interactividade, como a possibilidade de gravar a programação, de exibir a proogramação no ecrã, etc. O sinal analógico é algo intermitente. O sinal digital chega em blocos e é armazenável. Se o nosso descodificador gravar aquela informação, poderemos ver o programa na hora que quisermos. As pessoas dizem que isso vai ser uma revolução, porque vão poder ver os programas à hora que quiserem. Só que pode não ser exactamente assim, uma vez que também se dizia o mesmo com as cassetes de vídeo e, na verdade, em alguns casos as pessoas passaram a gravar os programas, mas isso não influenciou decisivamente o mercado televisivo. Para além disso, pode ser que surjam grandes novidades em termos tecnológicos, mas que ainda não existem.
Que implicações é que a TDT vai ter para quem recebe televisão por cabo ou satélite?
Quem assina esses serviços não sofrerá muitas consequências. O que pode ocorrer é algo positivo. Como a televisão digital terrestre trará mais canais, as actuais empresas que fornecem serviços por cabo, satélite e IPTV poderão fazer acordos com o operador de distribuição da TDT e oferecer aos seus assinates também esses canais que surgirão. É possível que uma “set-top-box” tenha entrada para mais de uma plataforma, ou seja, o telespectador poderia receber, por exemplo, sinais da TV digital terrestre e do satélite. Ao accionar o comando a tecnologia de recepção mudaria, mas isso seria automático e imperceptível para quem estivesse à frente do ecrã. É o mercado que vai responder a isso.
A TDT é sinonimo de interactividade?
A interactividade na TDT é de certa forma limitada. Para haver uma interactividade plena é preciso um canal de retorno; é preciso que nós, enquanto telespectadores, tenhamos um canal para podermos enviar informações para essa emissora. Na IPTV, no cabo e no satélite é muito mais fácil, porque cada casa tem ali um teminal que permite um contacto directo com quem está a emitir a informação. Na TDT, a interactividade é mais limitada. Se por exemplo existir um canal para a língua gestual, a interactividade resume-se a accionar o comando para pôr em funcionamento esse canal. O concurso lançado pelo Governo obriga as empresas a apresentarem soluções de interactividade, que depois vão ser avaliadas. Não há exigências específicas neste sentido.
Há exemplos na área da interactividade?
Na Universidade de Aveiro, o engenheiro Jorge Ferraz desenvolveu uma plataforma muito interessante, que não é exclusivamente para a TDT, pois pode ser usada na televisão analógica. Ele aliou a tecnologia da Web e a recepção televisiva por meio de uma placa de computador colocada numa “set-top-box” e conseguiu criar uma sobreposição da imagem, que deixa o espaço para interacção. O telespectador consegue saber se alguém conhecido está a ver o mesmo canal e pode comunicar-se com essas pessoas, conversar, enviar vídeos, etc.
Sérgio Denicoli, que está a fazer o doutoramento em Ciências da Comunicação na Universidade do Minho, desfaz o mito de que a Televisão Digital Terrestre (TDT) é sinónimo de televisão interactiva. O novo modelo vai permitir que, a partir 2012, todos os canais sejam de alta definição, mas também vai ter implicações no bolso dos telespectadores, que vão ser obrigados a comprar um descodificador. (A entrevista foi publicada em Março de 2008 no Diário do Minho. Há parte já ultrapassadas que não são aqui reproduzidas)
O que é a Televisão Digital Terrestre?
A televisão é a emissão de um sinal que chega a um receptor, que o converte em imagens e sons. Existem vários tipos de transmissões: na televisão por cabo o sinal chega a nossa casa por fibra óptica, na televisão por satélite o sinal vem pelo satélite e nós temos uma pequena antena que o recebe, na IPTV o sinal vem por cabo de cobre (pela linha telefónica) e na televisão terrestre o sinal chega pelo ar através de ondas de rádiodifusão. A televisão de que falamos agora é a TDT. Com o digital, deixamos de ter ondas analógicas e passamos a usar a linguagem binária, que é a mesma dos computadores. Na televisão digital, o sinal é comprimido porque é a linguagem é binária, o que nos permite ter mais espaço no espectro.
O que é que se pode fazer com o espectro remanescente?
Em Portugal, optou-se por lançar mais um canal de televisão aberta e diversos canais de televisão paga, de âmbito nacional e regional. Também ficou decidido que, a partir de 2012, com o apagão analógico, todos os canais de televisão digital vão ser de alta definição, isto é, terão imagens formadas por mais pontos. Na televisão analógica temos a imagem formada por linhas, enquanto que na televisão digital é formada por pontos. A televisão de alta definição permite perceber melhor a imagem.
Vamos ter de possuir um descodificador para receber a TDT?
Os aparelhos de televisão que temos hoje são analógicos e para termos a conversão do sinal digital precisaremos de uma “set-top-box” que será ligada aos televisores, tanto para ver a televisão aberta e gratuita como para ver os canais pagos. Os telespectadores vão ter de comprar esse descodificador porque o Governo já disse que não vai subsidiar a sua aquisição.
Essa tecnologia tem mais potencialidades?
Sim. Podemos ter descodificadores com alguns serviços de interactividade, como a possibilidade de gravar a programação, de exibir a proogramação no ecrã, etc. O sinal analógico é algo intermitente. O sinal digital chega em blocos e é armazenável. Se o nosso descodificador gravar aquela informação, poderemos ver o programa na hora que quisermos. As pessoas dizem que isso vai ser uma revolução, porque vão poder ver os programas à hora que quiserem. Só que pode não ser exactamente assim, uma vez que também se dizia o mesmo com as cassetes de vídeo e, na verdade, em alguns casos as pessoas passaram a gravar os programas, mas isso não influenciou decisivamente o mercado televisivo. Para além disso, pode ser que surjam grandes novidades em termos tecnológicos, mas que ainda não existem.
Que implicações é que a TDT vai ter para quem recebe televisão por cabo ou satélite?
Quem assina esses serviços não sofrerá muitas consequências. O que pode ocorrer é algo positivo. Como a televisão digital terrestre trará mais canais, as actuais empresas que fornecem serviços por cabo, satélite e IPTV poderão fazer acordos com o operador de distribuição da TDT e oferecer aos seus assinates também esses canais que surgirão. É possível que uma “set-top-box” tenha entrada para mais de uma plataforma, ou seja, o telespectador poderia receber, por exemplo, sinais da TV digital terrestre e do satélite. Ao accionar o comando a tecnologia de recepção mudaria, mas isso seria automático e imperceptível para quem estivesse à frente do ecrã. É o mercado que vai responder a isso.
A TDT é sinonimo de interactividade?
A interactividade na TDT é de certa forma limitada. Para haver uma interactividade plena é preciso um canal de retorno; é preciso que nós, enquanto telespectadores, tenhamos um canal para podermos enviar informações para essa emissora. Na IPTV, no cabo e no satélite é muito mais fácil, porque cada casa tem ali um teminal que permite um contacto directo com quem está a emitir a informação. Na TDT, a interactividade é mais limitada. Se por exemplo existir um canal para a língua gestual, a interactividade resume-se a accionar o comando para pôr em funcionamento esse canal. O concurso lançado pelo Governo obriga as empresas a apresentarem soluções de interactividade, que depois vão ser avaliadas. Não há exigências específicas neste sentido.
Há exemplos na área da interactividade?
Na Universidade de Aveiro, o engenheiro Jorge Ferraz desenvolveu uma plataforma muito interessante, que não é exclusivamente para a TDT, pois pode ser usada na televisão analógica. Ele aliou a tecnologia da Web e a recepção televisiva por meio de uma placa de computador colocada numa “set-top-box” e conseguiu criar uma sobreposição da imagem, que deixa o espaço para interacção. O telespectador consegue saber se alguém conhecido está a ver o mesmo canal e pode comunicar-se com essas pessoas, conversar, enviar vídeos, etc.
Portugal está muito atrasado mas tem de cumprir meta de 2012
O investigador Sérgio Denicoli constata que o processo de implementação da televisão digital terrestre (TDT) em Portugal está muito atrasado. No entanto, este doutorando em Ciências da Comunicação sustenta que o país tem de levar a sério a meta de 2012 fixada pela União Europeia para o desaparecimento do sistema analógico, de forma a acompanhar os seus parceiros.
Avançar para a TDT é um caminho inevitável?
É, porque esta é uma evolução tecnológica. Talvez não seja uma revolução tecnológica, uma vez que essa surge com o mundo em rede, quando as pessoas se conectaram online através da Web. O facto de se passar da televisão analógica para a digital é uma evolução porque permite que usemos de melhor forma o espectro que temos. Este é um processo evolutivo.
Portugal está atrasado neste processo?
A Comissão Europeia prevê que o apagão analógico seja em 2012. Portugal está muito atrasado em relação aos outros países, mas ainda está dentro do prazo estabelecido. O primeiro concurso para a TDT portuguesa, realizado em 2001, acabou por ser anulado por questões de dificuldades tecnológicas e também devido à ausência de um modelo de mercado. Isso acabou por atrasar bastante o processo e só agora é que ele voltou a arrancar. Até 2012, todas as pessoas do país que vêem a TV terrestre terão de ter um descodificador. Como é que isso pode ser feito? Pode ser que o quinto canal já anunciado incentive as pessoas a comprarem o aparelho. Imaginemos que o novo canal vai para o grupo do Joaquim Oliveira, que detém a Controlinveste, dona da SporTV. Este canal poderia oferecer mais desporto, o que, em Portugal, seria um grande atractivo para que as pessoas comprassem o aparelho. É preciso, no entanto, ser muito optimista, porque o prazo é apertado.
O que é que Portugal pode aprender com os que avançaram primeiro?
Portugal já aprendeu com a experiência dos outros. Quando foi lançado o primeiro concurso, havia a imagem de que a TDT seria a grande galinha dos ovos de ouro. Com a evolução tecnológica, verificou-se que a TDT já não é aquela grande evolução em termos económicos que em tempos se chegou a prever. Alguns modelos televisão tiveram um fracasso inicial, como em Espanha e no Reino Unido, pelo que esses países tiveram de fazer um grande esforço para que o modelo se afirmasse.
No Reino Unido, quando a TDT foi lançada, as pessoas tinham uma imagem de qualidade inferior porque a tecnologia ainda não estava muito desenvolvida. Para além disso, tinham de comprar o descodificador, que era muito caro. Os telespectadores não queriam esse modelo porque pelo preço do descodificador pagavam a televisão por assinatura, ainda por cima com muito mais qualidade. O Reino Unido precisou de fazer uma reestruturação, sendo que a BBC incentivou a TDT.
Em Espanha, a questão da televisão é muito complicada porque está dividida por regiões e a televisão regional tem um peso muito grande. Eles estão a começar a encontrar o modelo e as pessoas já estão habituadas, mas a primeira grande operadora de televisão digital terrestre, a Quiero TV, acabou por falir.
Em Portugal, temos metade da população com televisão por subscrição. A TDT vai abranger directamente a outra metade da população. Mas agora já há, noutros países, modelos de negócio definidos e que podem ser, de certa forma, copiados ou pelo menos estudados. Obviamente, é preciso ter em conta as peculiaridades de cada mercado e pode ser que alguns modelos bem sucedidos lá fora não dêem certo aqui, mas pelo menos há indicativos.
A meta de 2012 é para levar a sério?
O mercado europeu é um mercado único e é importante que Portugal esteja junto dos outros países. Não faz sentido que os outros acabem com a televisão analógica e que Portugal continue com esse modelo, porque isso também envolve questões como a produção de equipamentos, uma vez que há todo um mercado que circula em torno da TDT. Se Portugal quiser acompanhar os demais países e se até quiser produzir equipamentos é importante que esteja ao mesmo nível de desenvolvimento tecnológico do que os outros.
Este será também um factor de dinamização da economia?
Todas as mudanças têm um impacto económico, ou positivo ou negativo. Se nos canais regionais houver realmente exigências por exemplo ao nível da produção local e em língua portuguesa isso irá certamente gerar um mercado, com implicação nas produtoras.
Mas não podemos esquecer o outro lado: será que o mercado português, que é pequeno, suporta tantos canais? Eu não sei dar esta resposta, mas se ela for não, isso vai fazer com que as televisões tenham menos dinheiro para investir em produções e fazer com que haja uma internacionalização ainda maior na programação. Certamente que o mercado de descodificadores e de aparelhos televisivos vai crescer, pelo menos num primeiro momento.
Avançar para a TDT é um caminho inevitável?
É, porque esta é uma evolução tecnológica. Talvez não seja uma revolução tecnológica, uma vez que essa surge com o mundo em rede, quando as pessoas se conectaram online através da Web. O facto de se passar da televisão analógica para a digital é uma evolução porque permite que usemos de melhor forma o espectro que temos. Este é um processo evolutivo.
Portugal está atrasado neste processo?
A Comissão Europeia prevê que o apagão analógico seja em 2012. Portugal está muito atrasado em relação aos outros países, mas ainda está dentro do prazo estabelecido. O primeiro concurso para a TDT portuguesa, realizado em 2001, acabou por ser anulado por questões de dificuldades tecnológicas e também devido à ausência de um modelo de mercado. Isso acabou por atrasar bastante o processo e só agora é que ele voltou a arrancar. Até 2012, todas as pessoas do país que vêem a TV terrestre terão de ter um descodificador. Como é que isso pode ser feito? Pode ser que o quinto canal já anunciado incentive as pessoas a comprarem o aparelho. Imaginemos que o novo canal vai para o grupo do Joaquim Oliveira, que detém a Controlinveste, dona da SporTV. Este canal poderia oferecer mais desporto, o que, em Portugal, seria um grande atractivo para que as pessoas comprassem o aparelho. É preciso, no entanto, ser muito optimista, porque o prazo é apertado.
O que é que Portugal pode aprender com os que avançaram primeiro?
Portugal já aprendeu com a experiência dos outros. Quando foi lançado o primeiro concurso, havia a imagem de que a TDT seria a grande galinha dos ovos de ouro. Com a evolução tecnológica, verificou-se que a TDT já não é aquela grande evolução em termos económicos que em tempos se chegou a prever. Alguns modelos televisão tiveram um fracasso inicial, como em Espanha e no Reino Unido, pelo que esses países tiveram de fazer um grande esforço para que o modelo se afirmasse.
No Reino Unido, quando a TDT foi lançada, as pessoas tinham uma imagem de qualidade inferior porque a tecnologia ainda não estava muito desenvolvida. Para além disso, tinham de comprar o descodificador, que era muito caro. Os telespectadores não queriam esse modelo porque pelo preço do descodificador pagavam a televisão por assinatura, ainda por cima com muito mais qualidade. O Reino Unido precisou de fazer uma reestruturação, sendo que a BBC incentivou a TDT.
Em Espanha, a questão da televisão é muito complicada porque está dividida por regiões e a televisão regional tem um peso muito grande. Eles estão a começar a encontrar o modelo e as pessoas já estão habituadas, mas a primeira grande operadora de televisão digital terrestre, a Quiero TV, acabou por falir.
Em Portugal, temos metade da população com televisão por subscrição. A TDT vai abranger directamente a outra metade da população. Mas agora já há, noutros países, modelos de negócio definidos e que podem ser, de certa forma, copiados ou pelo menos estudados. Obviamente, é preciso ter em conta as peculiaridades de cada mercado e pode ser que alguns modelos bem sucedidos lá fora não dêem certo aqui, mas pelo menos há indicativos.
A meta de 2012 é para levar a sério?
O mercado europeu é um mercado único e é importante que Portugal esteja junto dos outros países. Não faz sentido que os outros acabem com a televisão analógica e que Portugal continue com esse modelo, porque isso também envolve questões como a produção de equipamentos, uma vez que há todo um mercado que circula em torno da TDT. Se Portugal quiser acompanhar os demais países e se até quiser produzir equipamentos é importante que esteja ao mesmo nível de desenvolvimento tecnológico do que os outros.
Este será também um factor de dinamização da economia?
Todas as mudanças têm um impacto económico, ou positivo ou negativo. Se nos canais regionais houver realmente exigências por exemplo ao nível da produção local e em língua portuguesa isso irá certamente gerar um mercado, com implicação nas produtoras.
Mas não podemos esquecer o outro lado: será que o mercado português, que é pequeno, suporta tantos canais? Eu não sei dar esta resposta, mas se ela for não, isso vai fazer com que as televisões tenham menos dinheiro para investir em produções e fazer com que haja uma internacionalização ainda maior na programação. Certamente que o mercado de descodificadores e de aparelhos televisivos vai crescer, pelo menos num primeiro momento.
«A televisão sempre envolveu várias esferas»
Sérgio Denicoli lembra que a «questão da televisão sempre envolveu várias esferas», tais como «a económica, em que se incluem também os fabricantes de produtos e equipamentos, a da política e a dos telespectadores». «No caso da TDT não é diferente. Cada grupo interessado na TDT, seja em que esfera for, trabalha de acordo com a sua lógica», afirma o doutorando em Ciências da Comunicação.
Este jornalista brasileiro, que está a colaborar com o Departamento de Ciências da Comunicação da Universidade do Minho, explica que, «no caso do poder político, há um ciclo de trabalho periódico que culmina com as eleições. As questões políticas resolvem-se dentro desse período, muitas vezes prevendo a renovação de um mandato. Isso tem influências na TDT também».
Em relação ao mercado, refere que «é mais estável»: «As empresas que estão no mercado têm um período muito maior do que o político, mas também têm um prazo de estabelecimento».
«Quem é o alvo principal da televisão? O que é que os telespectadores esperam? Este factor também é muito importante, uma vez que não pode existir televisão sem espectadores», acrescenta.
Tendo em conta a existência destes actores, «o resultado virá a partir da forma como esses grupos se ajustam e dos lóbies mais ou menos fortes», sendo que «o produto final tem de agregar tudo e fazer com que flua da melhor forma».
«Neste momento, o grupo mais forte é o político porque é o que está à frente do processo. Futuramente pode ser ou não; podem ser as empresas ou os telespectadores. Há sempre uma influência mútua», argumenta.
Este jornalista brasileiro, que está a colaborar com o Departamento de Ciências da Comunicação da Universidade do Minho, explica que, «no caso do poder político, há um ciclo de trabalho periódico que culmina com as eleições. As questões políticas resolvem-se dentro desse período, muitas vezes prevendo a renovação de um mandato. Isso tem influências na TDT também».
Em relação ao mercado, refere que «é mais estável»: «As empresas que estão no mercado têm um período muito maior do que o político, mas também têm um prazo de estabelecimento».
«Quem é o alvo principal da televisão? O que é que os telespectadores esperam? Este factor também é muito importante, uma vez que não pode existir televisão sem espectadores», acrescenta.
Tendo em conta a existência destes actores, «o resultado virá a partir da forma como esses grupos se ajustam e dos lóbies mais ou menos fortes», sendo que «o produto final tem de agregar tudo e fazer com que flua da melhor forma».
«Neste momento, o grupo mais forte é o político porque é o que está à frente do processo. Futuramente pode ser ou não; podem ser as empresas ou os telespectadores. Há sempre uma influência mútua», argumenta.
Minho fica fora do mapa da televisão digital regional
A região Minho fica fora do mapa estabelecido para a televisão digital de âmbito regional, que vai ter acesso pago. O concurso lançado para a atribuição das três coberturas de âmbito parcial do território – Multiplexers D, E e F – estipula que a zona passível de cobertura é «a área litoral até cerca de 80 quilómetros da fronteira».
Esta é apenas uma vertente do concurso lançado pelo Governo para a atribuição de cinco direitos de utilização de frequências reservadas para o serviço de radiodifusão televisiva terrestre.
Se os prazos forem cumpridos, em 2012, o sinal deixará de ser transmitido por ondas analógicas e passará a ser 100 por cento em linguagem binária, a mesma que é utilizada pelos computadores, à semelhança do que acontecerá em todos os países europeus. Isso permitirá aumentar o número de canais disponíveis e melhorar a qualidade da imagem.
É justamente para definir quem são as empresas que vão ficar a operar no novo sistema que o Governo lançou um concurso, que se subdivide em dois. Um relativo ao Multiplexer A e outros relativo aos Multiplexers B, C, D, E e F. O investigador Sérgio Denicoli explica que «o Multiplexer é um mecanismo que permite transmitir os dados num mesmo canal de comunicação, neste caso vários canais de televisão nas mesmas frequências».
No Multiplexer A já está definido que irão operar as televisões que actualmente emitem em sinal aberto: RTP, RTP2, SIC e TVI. A estes quatro canais vai juntar-se um quinto, que só vai ser lançado para o ano, uma vez que o Governo definiu que ele avança 180 dias depois do concurso que está a decorrer.
O especialista em Televisão Digital Terrestre (TDT) explica que o «concurso para o Multiplexer A é para definir quem vai codificar e transmitir o sinal, porque as concessões já estão dadas». Como se trata somente de escolher quem será o radiodifusor, ou seja, quem terá o direito de utilização de frequências, este concurso foi lançado pela Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom).
Em relação os restantes multiplexers – B, C, D, E e F –, está definido que dois serão de âmbito nacional e três de âmbito regional. O doutorando em Ciências da Comunicação refere que neste concurso há duas vertentes: quem vai distribuir os sinais (serviços de radiodifusão) e quem vai ser responsável pelos conteúdos (agregação e fornecimento dos programas televisivos).
«Apenas uma empresa vai ganhar este concurso. A empresa que vencer vai gerir estes cinco multiplexers – sendo que dois são de âmbito nacional e três regional –, nas duas vertentes», sublinha o doutorando na Universidade do Minho. Este é um concurso «muito aberto», que está a suscitar o interesse de grupos portugueses e internacionais.
Sérgio Denicoli explica que «uma grande inovação que a TDT traz são os canais regionais» – os Multiplexeres D, E e F –, embora por questões técnicas eles tenham uma área de cobertura limitada. «Não se sabe ainda como é que vão ser geridos esses canais. Isso não está definido nem na regulamentação nem no caderno de encargos», refere o especialista.
O número de novos canais dependerá sobretudo da decisão da empresa ou consércio vencedor. «Se tivermos uma compressão muito grande, podemos ter mais canais, mas com baixa resolução, apesar de estar determinado que deveremos ter uma qualidade de imagem superior ao que temos hoje. Se for tudo de alta definição, que já ocupa mais espaço do espectro, haverá menos canais. O número de canais só está definido no Multiplexer A: serão cinco. Nos outro ainda não está definido», explica o mestre em Ciências da Comunicação. Por outro lado, é preciso também ter em conta o mercado português e saber quantos canais é que ele comporta.
Esta é apenas uma vertente do concurso lançado pelo Governo para a atribuição de cinco direitos de utilização de frequências reservadas para o serviço de radiodifusão televisiva terrestre.
Se os prazos forem cumpridos, em 2012, o sinal deixará de ser transmitido por ondas analógicas e passará a ser 100 por cento em linguagem binária, a mesma que é utilizada pelos computadores, à semelhança do que acontecerá em todos os países europeus. Isso permitirá aumentar o número de canais disponíveis e melhorar a qualidade da imagem.
É justamente para definir quem são as empresas que vão ficar a operar no novo sistema que o Governo lançou um concurso, que se subdivide em dois. Um relativo ao Multiplexer A e outros relativo aos Multiplexers B, C, D, E e F. O investigador Sérgio Denicoli explica que «o Multiplexer é um mecanismo que permite transmitir os dados num mesmo canal de comunicação, neste caso vários canais de televisão nas mesmas frequências».
No Multiplexer A já está definido que irão operar as televisões que actualmente emitem em sinal aberto: RTP, RTP2, SIC e TVI. A estes quatro canais vai juntar-se um quinto, que só vai ser lançado para o ano, uma vez que o Governo definiu que ele avança 180 dias depois do concurso que está a decorrer.
O especialista em Televisão Digital Terrestre (TDT) explica que o «concurso para o Multiplexer A é para definir quem vai codificar e transmitir o sinal, porque as concessões já estão dadas». Como se trata somente de escolher quem será o radiodifusor, ou seja, quem terá o direito de utilização de frequências, este concurso foi lançado pela Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom).
Em relação os restantes multiplexers – B, C, D, E e F –, está definido que dois serão de âmbito nacional e três de âmbito regional. O doutorando em Ciências da Comunicação refere que neste concurso há duas vertentes: quem vai distribuir os sinais (serviços de radiodifusão) e quem vai ser responsável pelos conteúdos (agregação e fornecimento dos programas televisivos).
«Apenas uma empresa vai ganhar este concurso. A empresa que vencer vai gerir estes cinco multiplexers – sendo que dois são de âmbito nacional e três regional –, nas duas vertentes», sublinha o doutorando na Universidade do Minho. Este é um concurso «muito aberto», que está a suscitar o interesse de grupos portugueses e internacionais.
Sérgio Denicoli explica que «uma grande inovação que a TDT traz são os canais regionais» – os Multiplexeres D, E e F –, embora por questões técnicas eles tenham uma área de cobertura limitada. «Não se sabe ainda como é que vão ser geridos esses canais. Isso não está definido nem na regulamentação nem no caderno de encargos», refere o especialista.
O número de novos canais dependerá sobretudo da decisão da empresa ou consércio vencedor. «Se tivermos uma compressão muito grande, podemos ter mais canais, mas com baixa resolução, apesar de estar determinado que deveremos ter uma qualidade de imagem superior ao que temos hoje. Se for tudo de alta definição, que já ocupa mais espaço do espectro, haverá menos canais. O número de canais só está definido no Multiplexer A: serão cinco. Nos outro ainda não está definido», explica o mestre em Ciências da Comunicação. Por outro lado, é preciso também ter em conta o mercado português e saber quantos canais é que ele comporta.
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