O investigador Sérgio Denicoli constata que o processo de implementação da televisão digital terrestre (TDT) em Portugal está muito atrasado. No entanto, este doutorando em Ciências da Comunicação sustenta que o país tem de levar a sério a meta de 2012 fixada pela União Europeia para o desaparecimento do sistema analógico, de forma a acompanhar os seus parceiros.
Avançar para a TDT é um caminho inevitável?
É, porque esta é uma evolução tecnológica. Talvez não seja uma revolução tecnológica, uma vez que essa surge com o mundo em rede, quando as pessoas se conectaram online através da Web. O facto de se passar da televisão analógica para a digital é uma evolução porque permite que usemos de melhor forma o espectro que temos. Este é um processo evolutivo.
Portugal está atrasado neste processo?
A Comissão Europeia prevê que o apagão analógico seja em 2012. Portugal está muito atrasado em relação aos outros países, mas ainda está dentro do prazo estabelecido. O primeiro concurso para a TDT portuguesa, realizado em 2001, acabou por ser anulado por questões de dificuldades tecnológicas e também devido à ausência de um modelo de mercado. Isso acabou por atrasar bastante o processo e só agora é que ele voltou a arrancar. Até 2012, todas as pessoas do país que vêem a TV terrestre terão de ter um descodificador. Como é que isso pode ser feito? Pode ser que o quinto canal já anunciado incentive as pessoas a comprarem o aparelho. Imaginemos que o novo canal vai para o grupo do Joaquim Oliveira, que detém a Controlinveste, dona da SporTV. Este canal poderia oferecer mais desporto, o que, em Portugal, seria um grande atractivo para que as pessoas comprassem o aparelho. É preciso, no entanto, ser muito optimista, porque o prazo é apertado.
O que é que Portugal pode aprender com os que avançaram primeiro?
Portugal já aprendeu com a experiência dos outros. Quando foi lançado o primeiro concurso, havia a imagem de que a TDT seria a grande galinha dos ovos de ouro. Com a evolução tecnológica, verificou-se que a TDT já não é aquela grande evolução em termos económicos que em tempos se chegou a prever. Alguns modelos televisão tiveram um fracasso inicial, como em Espanha e no Reino Unido, pelo que esses países tiveram de fazer um grande esforço para que o modelo se afirmasse.
No Reino Unido, quando a TDT foi lançada, as pessoas tinham uma imagem de qualidade inferior porque a tecnologia ainda não estava muito desenvolvida. Para além disso, tinham de comprar o descodificador, que era muito caro. Os telespectadores não queriam esse modelo porque pelo preço do descodificador pagavam a televisão por assinatura, ainda por cima com muito mais qualidade. O Reino Unido precisou de fazer uma reestruturação, sendo que a BBC incentivou a TDT.
Em Espanha, a questão da televisão é muito complicada porque está dividida por regiões e a televisão regional tem um peso muito grande. Eles estão a começar a encontrar o modelo e as pessoas já estão habituadas, mas a primeira grande operadora de televisão digital terrestre, a Quiero TV, acabou por falir.
Em Portugal, temos metade da população com televisão por subscrição. A TDT vai abranger directamente a outra metade da população. Mas agora já há, noutros países, modelos de negócio definidos e que podem ser, de certa forma, copiados ou pelo menos estudados. Obviamente, é preciso ter em conta as peculiaridades de cada mercado e pode ser que alguns modelos bem sucedidos lá fora não dêem certo aqui, mas pelo menos há indicativos.
A meta de 2012 é para levar a sério?
O mercado europeu é um mercado único e é importante que Portugal esteja junto dos outros países. Não faz sentido que os outros acabem com a televisão analógica e que Portugal continue com esse modelo, porque isso também envolve questões como a produção de equipamentos, uma vez que há todo um mercado que circula em torno da TDT. Se Portugal quiser acompanhar os demais países e se até quiser produzir equipamentos é importante que esteja ao mesmo nível de desenvolvimento tecnológico do que os outros.
Este será também um factor de dinamização da economia?
Todas as mudanças têm um impacto económico, ou positivo ou negativo. Se nos canais regionais houver realmente exigências por exemplo ao nível da produção local e em língua portuguesa isso irá certamente gerar um mercado, com implicação nas produtoras.
Mas não podemos esquecer o outro lado: será que o mercado português, que é pequeno, suporta tantos canais? Eu não sei dar esta resposta, mas se ela for não, isso vai fazer com que as televisões tenham menos dinheiro para investir em produções e fazer com que haja uma internacionalização ainda maior na programação. Certamente que o mercado de descodificadores e de aparelhos televisivos vai crescer, pelo menos num primeiro momento.
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