sexta-feira, 25 de julho de 2008

«Assinaria uma petição que reclamasse mais presença do país na RTP»

Iniciativas como a petição lançada pelos blogues Avenida Central e Vimaranes podem ter algum reflexo na forma como a RTP é conduzida?


Eu acho muito positivo este tipo de petição, embora defenda que estas iniciativas deveriam ser mais do que reparos pontuais à TV que temos. Era preciso que se dissesse: nós não gostamos da TV que temos, precisamos de uma TV que nos desse isto ou aquilo. Enquanto cidadãos, temos a obrigação de apontar caminhos à RTP. O país real deveria ser mais ruidoso junto da RTP. Por seu turno, a RTP também tem de ouvir os cidadãos, e este é um exercício que merece aprendizagem de ambas as partes. Não é só através do Provedor que a RTP pode ouvir aquilo que os telespectadores pensam.

Eu não assinaria esta petição tal como ela está, mas assinaria uma que reclamasse mais presença do país que somos na antena da RTP. E quando digo o país, digo o país a Norte. Nota-se que ultimamente que a RTPN tem feito um grande esforço para fomentar o debate público com convidados diversificados. É preciso continuar esse caminho. É muito importante. A RTP, como a SIC e a TVI, tem tendência a estar centralizada em Lisboa e tem de haver um esforço para uma maior descentralização. A este nível, a força dos cidadãos é fulcral.

A RTP emite para todo o país, mas cobre apenas uma parte do território?

Eu acho que há algo que deveria merecer mais atenção dos poderes político, cultural, económico… e também dos cidadãos em geral: a reivindicação de canais de TV com redacções fora de Lisboa. Pelo contrato de concessão do serviço público, a RTPN deve ser um canal de vocação regional. E é importante que a sua sede continua a norte. Se a RTPN tiver sede em Lisboa, os debates e as entrevistas vão ser feitos com interlocutores da capital. Isso significaria o empobrecimento da diversidade que este canal tem à noite. Mais do que me preocupar se a RTP transmite jogos do Sporting ou do Benfica, eu preocupar-me-ia em perceber a importância da localização das redacções dos canais de TV. Será que precisamos de um canal por cabo com sede no Porto? Será que isso é importante para o Norte, para o Minho?

Olhando para o Canal 1, a cobertura que faz do país é equilibrada?


O "Jornal da Tarde" é mais equilibrado. Sendo um programa emitido a partir de Gaia, as reportagens são feitas sobretudo no Norte. O local onde a redacção está é importante. Às vezes não percebemos isso, mas como o noticiário trabalha com horários muito apertados, o factor proximidade é importante. Isto faz com o Jornal da Tarde seja mais equilibrado do que o dos outros canais.

Fica-se com ideia de que as delegações regionais da RTP não existem ou passam muito tempo sem produzir...

Eu também tenho essa percepção. Creio que as delegações regionais poderiam dar mais eco do país real.

Há queixas de diversas localidades em relação à cobertura da RTP....


Uma coisa que eu acho bacoca é, por exemplo, dizer-se que a RTP não liga ao São João de Braga. Alguém disse que, em Braga, se passa alguma coisa que merece ser notícia? O que Braga deveria pensar é em ser notícia e fazê-la chegar da melhor forma aos meios de comunicação social nacionais. Braga tem de ser mais pró-activa. Braga nunca mostra que pode ter uma palavra a dizer em relação ao serviço público de TV. Não sei se para a RTP Braga conta muito. Não há muita coisa em Braga que seja promovida à escala nacional. Também Braga não tem elites muito pró-activas. Quando se começou a falar numa eventual saída da RTPN para Lisboa, autarcas, forças económicas, elites culturais movimentaram-se muito em oposição a essa medida. Não vi ninguém de Braga a fazer isso. Posso ter andado distraída… Por outro lado, Braga ainda olha para os canais de TV como se estes estivessem noutra dimensão. Os jornalistas de órgãos regionais e os jornalistas de órgãos nacionais, especialmente os da TV, não são tratados da mesma maneira. É um sinal de algum provincianismo que ainda nos afecta de quando em vez.

Os que reivindicam a atenção do serviço público também têm de fazer alguma coisa para ser notícia...

Achar que a RTP enquanto serviço público deve vir cobrir as iniciativas mais anedóticas e insignificantes é bacoco. Um serviço público existe para ter programas de informação que tenham notícias e não para responder a quotas, embora as algumas directivas da ERC apontam nesse sentido... Enquanto sociedade, devemos ter um escrutínio muito atento em relação ao que a RTP faz relativamente ao poder político que está a governar o país, mas não faz sentido ditar quotas ao serviço público de televisão sem ter em conta se o que está em causa é ou não notícia. Dividir o noticiário por quotas é um mau princípio.

Temos uma audiência muito amorfa?
Um pouco. Faz falta que os telespectadores digam à RTP que existem enquanto público. A intervenção dos blogues pode ser muito positiva, mas estes também devem ser mais pró-activos relativamente à RTP: fazer com que os textos que publicam sejam conhecidos do operador público. É necessário que a RTP saiba o que os blogues andam a fazer.

Há um certo autismo da RTP em relação ao que o público tem a dizer?

Também é verdade. A RTP deveria apostar mais em canais de ligação com as pessoas. Por exemplo, disponibilizar os e-mails dos jornalistas ou pensar em programas com maior interactividade. Um programa em directo deveria disponibilizar um endereço electrónico que permitisse às pessoas dizerem o que pensam. O jornalista Carlos Daniel experimentou isso no "Trio de Ataque" e recebia muitos e-mails. Poderia experimentar-se noutros programas.

O provedor é importante, mas não resolve tudo?

É verdade. A intervenção do provedor é circunscrita. O programa é semanal e tem uma duração reduzida. Os temas não se esgotam e a opinião dos cidadãos acaba por ter um espaço pequeno porque as questões são complexas e é preciso ouvir as duas partes, existindo ainda o condicionalismo de o programa ser feito a partir de Lisboa. O local onde os programas são pensados é de tal forma importante que é preciso uma grande reflexão sobre isso.

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