sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Uma opção de vida definida em frente à televisão

Marina Gonçalves é uma jovem médica formada pela Escola de Ciências da Saúde

«Ser médico é uma opção de vida. Uma vida que não é para dedicar apenas a nós próprios, mas também aos outros, mesmo que isso implique sair mais tarde do trabalho, seja porque se esteve numa medida interventiva terapêutica ou a passar a mão pela cabeça de um paciente. Ser médico é dar uma parte de nós à pessoa que está à nossa frente».

É assim que Marina Gonçalves encara a profissão que escolheu e tem a certeza de ser uma opção «para a vida inteira». Esta bracarense de 26 anos terminou no passado dia 31 de Julho o Mestrado Integrado em Medicina na Escola de Ciências da Saúde da Universidade do Minho, pelo que está no grupo dos diplomados de 2008 que foram apresentados na cerimónia que assinalou o dia deste estabelecimento de ensino.

A jovem admite que tem uma «visão idealista da medicina», mas espera mantê-la ao longo de toda a carreira profissional, que pode passar pela cirurgia plástica, pela ginecologia/obstetrícia ou pela medicina geral e familiar, dependendo da nota do exame de acesso à especialidade.

A área da saúde sempre fez parte das aspirações de Marina Gonçalves, que chegou a querer ser enfermeira. Foi em frente à televisão, a ver a série “Chicago Hope”, que descobriu o que queria fazer. «É isto que eu quero para a minha vida», exclamou em frente ao programa que passava na SIC.

Pensou em desistir da ideia de entrar em Medicina, ainda antes de concorrer ao ensino superior: diziam-lhe que ia ter muito trabalho para fazer o curso e que ia deixar de ter vida própria. Contudo, as boas referências em relação à formação, a proximidade da universidade e o conhecimento das infra-estruturas da academia minhota foram factores decisivos para Marina Gonçalves ter voltado a tentar Medicina, mesmo depois de já ser aluna de outro curso da UM, por não ter conseguido vaga no primeiro ano em que concorreu.

A jovem notou, de facto, a diferença entre o ritmo de trabalho do 12.º ano, que se faz «a brincar», e o 1.º ano do curso de Medicina. «Desisti das actividades no 1.º ano, porque não as conseguia conciliar com uma carga horária muito grande. No 2.º ano retomei-as, porque não conseguia viver sem elas», explica, sublinhando que, ao contrário do que algumas pessoas ainda pensam, os alunos de Medicina são iguais aos outros universitários: também saem, namoram, vão ao ginásio, andam na tuna ou participam no Enterro da Gata...

Pôr em prática o que aprendeu


Marina Gonçalves sentiu-se bem recebida nas Unidades de Saúde por onde passou. Depois de terminado o curso, a jovem admite que «a realidade não é a adrenalina que se vê nas séries de televisão», mas sublinha que, à medida que a formação avança, os alunos começam a «ter a noção do que podem fazer». «Mesmo na enfermaria, é muito gratificante ver a evolução clínica dos doentes», afirma.

Ao fim de seis anos de formação, a médica diz «aleluia!». A fase que se segue é «tentar pôr em prática da melhor maneira possível o que se aprendeu, quer do ponto de vista teórico, quer das relações interpessoais, pois ser médico não é apenas pôr em prática o que se aprendeu de medicina».

O futuro profissional será determinado pelo Exame de Acesso à Especialidade, conhecido entre os alunos por “Exame Harrison”, que consiste em responder a perguntas sobre cinco temas de um livro.

Esta clínica defende que o teste deveria permitir «uma abordagem mais abrangente do que se aprende ao longo do curso», à semelhança do que acontece, por exemplo, com o exame do “National Board of Medical Examiners”, dos EUA, que, para além de questões sobre as áreas básicas e sobre os temas incluídos no "Exame Harrison", contempla perguntas sobre psiquiatria, pediatria, ginecologia, obstetrícia ou cirurgia, áreas fundamentais que não são abordadas na prova portuguesa.

«Se um aluno não sabe responder a pelo menos metade das perguntas daquele exame [National Board], provavelmente não deveria estar a concluir a sua formação», sustenta.

Num país com tradições no uso do «factor c», a jovem não vê com bons olhos a possibilidade de fazer depender o acesso à especialidade de uma entrevista.

Em relação ao mercado de trabalho, a Marina Gonçalves mostra-se reticente em relação às directivas “produtivistas”, que fazem depender o salário do médico da sua produtividade. «Uma consulta de medicina geral e familiar, por exemplo, não se faz em cinco minutos. É preciso ter tempo para dar atenção ao paciente. Será muito negativo se as pessoas se sentirem corridas e que ninguém lhes presta atenção», declara, lembrando, no entanto, que a casa dos médicos também chegam contas para pagar, pelo que se irão adaptar às regras que forem definidas.

[Publicado no Diário do Minho, a 8 de Outubro de 2008]

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