O sociólogo Pedro Nunes considera que a sociedade também tem um papel a desempenhar na superação da perda gestacional. «A sociedade deve ter uma componente de entreajuda, uma dimensão social que não se deve esgotar quando falamos de perda gestacional», afirma.
Este especialista sublinha que, «se a sociedade ocidental actual insiste no hedonismo e em tornar tabu a morte, a doença, a perda, não se deve virar as costas àqueles que em determinado momento das suas vidas perdem um pouco de si, mas continuam vivos, pelo menos têm de aprender a voltar a lutar e a acreditar».
«A sociedade é também reserva de esperança e havendo portas abertas é o ideal para que nos sintamos parte de algo, encontremos um sentido que nos ajudará a projectar a nossa esfera pessoal no futuro, redesenhando novos sonhos», afirma.
Pedro Nunes adverte, contudo, que «quando a mulher sente que a sociedade não lhe dá respostas nem vê nela fonte de um sentido para a vida, essa mesma mulher arriscase a concentrar em si as expectativas e crenças afundadas por depressões e outras fragilidades».
Num texto publicado do boletim informativo da Artémis, o sociólogo defende que «a perda gestacional não pode ser vista como menor por se tratar de uma criança que parte prematuramente».
Em seu entender, «o sofrimento mexe com diversos grupos, não se mantém numa cela individual: sofre a pessoa acabando esta por projectar o seu sofrimento naquilo que a rodeia».
«Não devemos pensar que perder um filho se esgota num sofrimento privado, há também o sofrimento colectivo aquando a morte de alguém, verificado através dos rituais e outras manifestações colectivas como o luto», frisa.
O especialista vinca que a perda gestacional provoca «períodos de mudanças nas diversas relações sejam estas familiares, entre colegas de trabalho ou outras pessoas próximas que estejam inseridas nos círculos sociais de determinada pessoa».
«Após a perda, o regresso ao trabalho é diferente, mudam os olhares, mudam as palavras, muda muita coisa. Muda a relação com o seu corpo porque perdeu um pouco de si, mudam os sonhos e procuramse novos portos de abrigo. A própria família sofre um abalo porque sente a perda de um dos “seus”», especifica.
[Publicado no Diário do Minho, a 20 de Agosto de 2008]
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