domingo, 29 de agosto de 2010

Património natural e cultural espera visitantes na Serra d’Arga

Património natural e cultural são os trunfos que a Serra d’Arga tem para atrair os visitantes. Com a reabertura do Centro de Interpretação da Serra d’Arga esta área ficou ainda mais atractiva, uma vez que os turistas têm apoio para planear as suas actividades, que podem ir desde um percurso pedestre até desportos radicais. Vale a pena partir à descoberta... 


© Luísa Teresa Ribeiro

«Dem saúda-vos». É assim que o visitante que acaba de deixar a A28, na saída Arga São João/Dem, é recebido ao chegar à Serra d’Arga. Este é o ponto de partida para uma subida em direcção às Argas (São João d’Arga, Arga de Baixo e Arga de Cima), no concelho de Caminha.

Os olhos vão-se acostumando à paisagem à medida que se sobe na estrada com bastantes curvas que serpenteia o monte. O amarelo do tojo e das plantas invasoras – austrálias ou mimosas – destacam-se numa paisagem onde predomina o cinzento das rochas, pincelado pelo verde da vegetação, muita dela rasteira.

Do outro lado do “pai Minho”, que corre lá ao fundo em direcção ao Atlântico, o monte galego de Santa Tecla olha para a denominada “montanha santa”, uma designação que, segundo o guia de bolso da Serra d’Arga, com textos de Emanuel de Oliveira e Pedro Rita, advirá de, durante séculos, ter «permanecido inacessível e afastada dos olhares humanos» ou de «ter servido de abrigo a eremitas e anacoretas».

O primeiro objectivo é chegar ao Centro de Interpretação da Serra d’Arga (CISA), em Arga de Baixo, uma estrutura que reabriu no ano passado, depois de quatro anos encerrada. Na sequência dos grandes incêndios que atingiram o concelho de Caminha em 2005, o CISA foi encerrado e assim permaneceu até Junho de 2009.

A Câmara Municipal de Caminha procedeu à realização das obras necessárias para reabrir a antiga casa florestal, que foi adaptada em 2001 para o apoio aos visitantes da Serra d’Arga. A intervenção incluiu a substituição dos sistemas de abastecimento de energia eléctrica e de água, bem como da rede de comunicações.

Ao mesmo tempo, o projecto foi ampliado, com a criação de uma horta pedagógica e de um espaço para as ervas aromáticas junto àquele edifício, áreas que são importantes instrumentos para o trabalho com o público escolar.

O centro é, segundo a edilidade, uma estrutura «orientada para o desenvolvimento de actividades de educação ambiental, divulgação e promoção do património ambiental e cultural da Serra d’Arga, bem como para o turismo de natureza».

Este é o ponto de partida ideal para quem quer explorar a Serra, pois concentra todas as informações sobre as actividades que se podem desenvolver neste espaço, promovendo ele próprio iniciativas regulares, como trilhos pedestres (actualmente estão sinalizados os trilhos do “Cabeço do Meio Dia”, da “Pedra Alçada”, da “Chã Grande” e da “Chã da Franqueira”) ou visitas para as escolas.

Serra d’Arga integrada na Rede Natura 


Depois de alguns quilómetros, surge a dúvida sobre qual o caminho certo para chegar ao CISA e se ainda faltará muito. Eis que junto a um ribeiro se avistam três idosas, de enxada na mão, momentaneamente em posição de descanso da árdua tarefa de cortar mato, enquanto põem a conversa em dia. Certamente que poderão ajudar.

Pára-se o carro. Ao abrir a porta tem-se consciência do profundo silêncio no qual o monte está mergulhado, surpreendente para ouvidos habituados ao bulício da cidade.

A ligeira brisa provoca um arrepio, enquanto os pulmões se habituam ao ar puro. A Serra d’Arga está integrada na Rede Natura (PTCON 0039), sendo que este sítio abrange os concelhos de Caminha, Ponte de Lima e Viana do Castelo, ocupando 4.500 hectares.

© Luísa Teresa Ribeiro

Desfeitas as dúvidas – «sempre em frente, que ainda falta», tinham dito as senhoras –, prossegue-se a marcha. Mais à frente, olhando para o lado esquerdo, avista-se ao longe o Mosteiro de S. João, um dos elementos mais conhecidos da Serra d’Arga, sobretudo pela romaria que tem o seu ponto alto de 28 para 29 de Agosto e que atrai milhares de visitantes, rodeado por uma das maiores e mais ricas manchas florestais destas montanhas.

Mesmo na berma da estrada, do lado esquerdo, uma antiga casa florestal degradada quebra a harmonia da paisagem. Quantas construções deste género haverá espalhadas pelos montes a degradarem-se mais a cada dia que passa? 


© Luísa Teresa Ribeiro
(Foto com algum tempo, pelo que a casa deve estar ainda mais degrada)

Finalmente, avista-se a placa a indicar o CISA, onde minuto depois há-de chegar a EB1 de Vilar de Mouros, para uma visita à serra. O vice-presidente da Câmara Municipal de Caminha, Flamiano Martins, refere que, depois da reabertura, o centro de interpretação tem apostado no relacionamento com as escolas, preferencialmente com as do concelho, mas está igualmente aberto a todos os estabelecimentos de ensino que ali queiram desenvolver actividades.

Para além das actividades para as escolas, que podem ir desde o ciclo do pão até à floresta autóctone, esta estrutura desenvolve iniciativas para o público em geral. Depois da realização de quatro percursos pedestres, desde Janeiro, o CISA promove a 22 de Maio um ateliê de plantas comestíveis, a 6 de Junho assinalou o aniversário da reabertura e a 26 de Junho realizou um ateliê de plantas aromáticas.

A turma alinha-se em frente à antiga casa florestal para um dia diferente de aprendizagem. Depois de uma explicação prévia, entra-se no CISA, que apresenta painéis sobre o território, a paisagem, o património, a população, a fauna e a flora.

A chefe de Divisão do Ambiente da autarquia caminhense, Angelina Cunha, que lidera a visita, juntamente com Ventura Gonçalves, apresenta numa linguagem adaptada aos mais pequenos uma panorâmica sobre este território, desde as características geológicas até à ocupação humana, sem esquecer os usos e costumes.

A partir de um tear, de produtos típicos, como os enchidos ou o mel, que podem ser adquiridos, e de uma vitrina com minerais, os visitantes ficam a conhecer os usos e costumes da envelhecida população serrana, desde os tempos em que vivia quase em isolamento, subsistindo sobretudo à custa do que a terra produzia, passando pelos tempos áureos da exploração mineira.

Segue-se uma visita à horta pedagógica, criada no local onde antigamente existia a horta do guarda florestal, que tem um edifício de apoio que inclui um forno, que permite cozer pão ou assar o típico cabrito segundo os moldes tradicionais.

Moinhos testemunham antigo modo de vida


© Luísa Teresa Ribeiro

 No terreno, depois do lanche, os meninos da EB1 de Vilar de Mouros, muitos dos quais nunca tinham ido à Serra d’Arga, vão ver sobretudo moinhos, que antigamente eram muito abundantes, com intensa utilização, mas que agora estão quase todos votados ao abandono.

Segundo a documentação do CISA, a ocupação da montanha começou na época dos Descobrimentos portugueses, condicionando a paisagem. Nos finais do século XV e inícios do século XVI, quando Caminha e Viana se transformam em portos importantes, é introduzida no Alto Minho a cultura do milho, proveniente do continente americano. Com este novo alimento, surgiu a necessidade de construir moinhos junto aos principais cursos de água e, geralmente, em locais de difícil acesso.

Actualmente, o único moinho em funcionamento é o do Ribeiro, em Arga de Baixo. Os moinhos da Gândara ou Gandra, situados na margem do regato da Fraga, em frente ao lugar de Gandra, foram recuperados, mas ainda não moem. Entre os moinhos mais conhecidos estão os do Covão, tendo um o telhado em lajes de granito e outro em lajes de xisto, havendo a data “1898” gravada no seu interior. Este interessante núcleo aguarda obras de recuperação.

© Luísa Teresa Ribeiro

O CISA está a incentivar a recuperação dos moinhos, mas a dispersão dos herdeiros, o envelhecimento da população e o local onde muitos deles estão implantados tem dificultado a concretização deste objectivo.

Também ligada à cultura do milho está à construção dos espigueiros ou canastros de pedra, que se encontram dispersos pela serra e que são um dos pontos de interesse para quem quiser ficar a conhecer a Serra d’Arga. Estas construções têm características que variam de freguesia para freguesia.

Embora alguns estivessem à espera de plantar árvores e de mexer na terra, os meninos mostram-se entusiasmados com a rota dos moinhos. Beatriz diz que estava com «curiosidade» sobre o que a esperava na Serra d’Arga e que não ficou defraudada. «Estou a aprender», assegura. Também Andreia destaca a descoberta de «plantas e árvores novas» nesta aula ao ar livre, em plena montanha. Para as duas, foi uma novidade a entrada num moinho e a descoberta do engenho que faz com que a força da água transforme o milho em farinha.

Construções com engenho e arte

Quem percorre estes montes depressa fica consciente da importância da pecuária na vida das populações. Uma vaca ou um rebanho de ovelhas a andar estrada fora ou garranos a pastar no monte, com as “pás” do parque eólico em pano de fundo, ainda hoje são uma realidade na Serra D’Arga.

Da mesma forma, também é possível encontrar idosas a carregar um carrinho cheio de tojo ou a conduzir um tractor, uma vez que a agricultura e a pecuária são essenciais neste espaço desertificado e envelhecido.

Ali existe uma série de “abrigos” – construções toscas, arredondadas, feitas de pedras sobrepostas – que serviam para os caçadores que andavam no encalço dos lobos – neste território há vestígios da existência de quatro fojos do lobo – ou para os pastores pernoitarem.

Ao percorrer os núcleos habitacionais é obrigatório reparar na estrutura das casas típicas, resultado daquilo que, no guia de bolso da Serra d’Arga, é apelidado de «arquitectura sem arquitectos». Muitas habitações estão degradadas, mas há bons exemplos de como é possível actualizar o legado histórico sem o adulterar de forma irreparável.

As vedações das quintas e dos campos são feitas de xisto encastelado, o que dá uma rara beleza à paisagem, a juntar ao efeito dado pelas zonas onde há socalcos.

A serra muda com as estações do ano, apresentando a vegetação rasteira florida na Primavera e um aspecto mais agreste no Inverno, quando a água dos ribeiros se enfurece e o seu barulho faz eco na montanha.

Outro dos motivos de atracção desta serra são os pontões (destinados apenas à passagem de pessoas e animais) e as pontes (travessias que permitissem também a passagem de carros de bois). Uma das mais emblemáticas é a Ponte das Traves, em Arga de Baixo, feita com enormes lajes, tanto na base como nos lados, que se apoiam em penedos. Ainda em Arga de Baixo, perto do moinho do Ribeiro, existe a ponte Porto Carro.

Em Arga de Cima, existe o Pontão do Lobo. Esta travessia é feita de grandes pedras encaixadas umas nas outras, de tal maneira que o redondo formado pelas rochas se assemelha à curvatura do lombo de um lobo.

Quem ruma até à Serra d’Arga pode fazer actividades mais radicais, como rafting ou escalada. No Verão pode-se ver arte, na Casa do Marco, em Arga de Baixo, com a iniciativa “Arte na Leira”.
 © Luísa Teresa Ribeiro

Deixando as Argas para trás, parte-se à descoberta de Dem, com paragem obrigatória na capela da Senhora da Serra ou Senhora das Neves, que tem nas imediações um parque de merendas e proporciona uma vista magnífica sobre a parte litoral.

Santa com trajes minhotos


Depois da passagem pelo ateliê de Lurdes das Carvalhas, que se notabilizou a fazer trajes tradicionais, ruma-se a São Lourenço da Montaria, já no concelho de Viana do Castelo. O objectivo é subir, para chegar à Senhora do Minho, local obrigatório para quem vai para aquelas paragens.

As atracções principais deste local – para além da paisagem e da experiência de subir o monte – são a pequena ermida e o santuário de Nossa Senhora do Minho, um sonho que levou quase sete décadas a concretizar e que custou cerca de meio milhão de euros.

A imagem de Nossa Senhora do Minho enverga um tradicional “traje à vianesa” – fato vermelho de festa da lavradeira minhota –, com um manto azul pelas costas, e tem na mão duas espigas de milho.

O alojamento na serra é escasso, mas há uma casa de turismo de habitação em São João d’Arga – a Casa das Pires – e o refúgio de montanha, dos Celtas do Minho. Espaço imperdível é a Taberna do Horácio, em Arga de Baixo, um espaço já mítico na Serra d’Arga. Um farnel é algo a não esquecer para quem tenciona ficar algum tempo nas montanhas, a par de roupa e calçado apropriado. E, depois, pés ao caminho...

Reportagem publicada no Diário do Minho, de 19 de Abril de 2010. Mais fotos aqui.

Aproveitar potencialidades turísticas


 © Luísa Teresa Ribeiro

 A existência de uma rede composta por quatro trilhos facilita a descoberta da Serra d’Arga em condições de maior segurança, mas as actividades neste espaço não se limitam aos percursos.

A actividade mineira que foi desenvolvida nestas montanha – e ainda há empresas a manifestarem o interesse de estudar a viabilidade da exploração – é uma das área que tem potencial para ser aproveitada.

Da mesma forma, a Serra d’Arga é uma formação interessante do ponto de vista geológico, uma área que poderá atrair público especializado.

O trabalho “Serra d’Arga: a marca como vector de desenvolvimento”, apresentado por Andreia Pereira, Madalena Silva e Ricardo Pereira, no VII Congresso Ibérico de Estudos Rurais, que decorreu em Coimbra, defende que a potencialidade turística da Serra d’Arga se encontrava «subaproveitada».

Estes especialistas aconselhavam à aplicação «uma estratégia de marketing que privilegie a procura de novos consumidores sem descurar os poucos, mas sempre importantes, já existentes; o desenvolvimento de novos produtos turísticos e o aperfeiçoamento dos actuais, bem como uma boa divulgação de ambos».

«Defendemos que no posicionamento estratégico da Serra d’Arga face ao mercado deve constar uma atitude de líder naquilo em que única e inovadora (paisagem construída, riqueza patrimonial, a título exemplificativo) e uma atitude de seguidora em outros produtos onde o factor novidade não está tão presente (rede de trilhos pedestres, valores ambientais)», afirmam.

Reportagem publicada no Diário do Minho, de 19 de Abril de 2010. Mais fotos aqui.

Câmaras planeiam projecto para valorizar a Serra d’Arga

As câmaras municipais de Caminha, Viana do Castelo e Ponte de Lima estão a elaborar um projecto que tem por objectivo valorizar os recursos da Serra d’Arga. A revelação é feita pelo vice-presidente da autarquia de Caminha. Em entrevista ao Diário do Minho, Flamiano Martins (FM) lamenta ainda não ter obtido resposta em relação ao pedido feito para a cedência das casas da floresta, que estão cada vez mais degradadas. Este responsável também defende alterações à legislação relativa à organização da floresta.

 © Luísa Teresa Ribeiro

DM – O Centro de Interpretação da Serra d’Arga (CISA) esteve encerrado durante vários anos. Esta reabertura é definitiva e com novo fôlego?
FM – É uma reabertura definitiva e com a possibilidade de desenvolvimento de um projecto mais abrangente para a Serra d’Arga e até alargado a outros municípios. Estamos em contacto com os municípios de Viana do Castelo e de Ponte de Lima para, em conjunto, fazermos um projecto para a Serra d’Arga, que privilegie a oferta dos produtos que esta área tem.

DM – Em que consiste o projecto?

FM – Ainda não é projecto. Para já, ainda está em pré-projecto. Os técnicos das três câmaras estão a trabalhar para desenharem o projecto. O objectivo é avançar o mais depressa possível. Pensamos que no final deste ano já haja uma proposta do que se quer para esta área. Estamos também a ver formas de financiamento que podemos obter, nomeadamente do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) e de outros instrumentos financeiros à disposição dos municípios.

Basicamente, o projecto consistirá em dar a conhecer os produtos que a Serra pode oferecer: circuito natural (que é o que salta mais à vista), religioso, mineiro – esta também é uma área importante e que também engloba o concelho de Vila Nova de Cerveira –, de costumes e tradições. A meta é valorizar tudo o que está ligado à Serra d’Arga, que pode ser um produto turístico bastante interessante no futuro.

DM – Um estudo levado a cabo pela Valimar defendia que a Serra d’Arga reunia condições para ser classificada como Área de Paisagem Protegida de Interesse Local. Essa ideia ainda existe?
FM – Esse é um assunto que vai ser discutido e que está a ser amadurecido. Isso terá de passar também pelo contacto com a população. A população faz parte da serra e, como parte da serra, tem uma palavra a dizer em relação a isso.

DM – Como é que a serra está em termos populacionais?

FM – É uma população muito idosa, mas vamos tentar que haja um rejuvenescimento e que se fixe população jovem com estes projectos que estamos a desenvolver. Já se nota, aliás, mais algum movimento.

DM – Que importância é que tem o CISA para a estratégia turística do concelho?

FM – É importantíssimo porque temos o mar, o rio e o monte. As nossas praias são ventosas e o monte pode servir de complemento à praia, quando esta não estiver convidativa. É também importante para combater a sazonalidade do turismo, pois permite atrair outros visitantes e noutras épocas do ano que não apenas no Verão, para além de proporcionar um dia diferente a quem procura o concelho pelas suas praias.

DM – Existe capacidade de alojamento?

FM – O alojamento é uma lacuna na parte interior do concelho. Temos bastante oferta – talvez ainda não chegue – no litoral, mas na zona interior não temos. Esta é uma área onde temos de apostar.

DM – Essa será uma área onde a Câmara vai investir ou deixará que seja a iniciativa privada a avançar?

FM – Preferia que existisse iniciativa privada, uma vez que as câmaras municipais não estão vocacionadas para explorar espaços hoteleiros. A Câmara tem um papel de sensibilizar o tecido empresarial para que existe uma área de negócio que não está explorada no interior do concelho. Poderá ainda ajudar a encontrar programas de financiamento, na elaboração do projectos ou na tramitação processual.

DM – Há espaços emblemáticos que poderão ser recuperados, como as casas da floresta?
FM – Há muitas casas da floresta, propriedade da antiga Direcção Geral de Florestas, agora Autoridade Florestal Nacional, que se têm vindo a degradar. As pedras grandes estão a ser roubadas. As casas estão praticamente em ruínas, mas poderiam ser recuperadas para a área do alojamento.

DM – Mas é preciso que alguém tome a iniciativa...

FM – Temos solicitado essas casas, e todos os municípios têm feito o mesmo, normalmente para projectos ligados ao turismo. Simplesmente, não dizem sim, nem não. Temos andado nisto durante anos e não temos conseguido obter respostas concretas ou da Direcção Geral do Património ou da Autoridade Florestal Nacional.

DM – A Câmara está interessada em alguma casa florestal?

FM – Estamos interessados e fizemos esse pedido à Direcção Geral do Património, mas ainda não obtivemos resposta. A casa poderia ser para alojamento tipo refúgio ou para outras actividades ligadas à floresta, como centros de interpretação ou como locais para receber os visitantes da montanha. Nós achamos que as casas não devem ser totalmente desligadas do fim para o qual foram construídas.

DM – É difícil manter esta floresta devido às espécies invasoras?

FM – Temos duas espécies invasoras para as quais não temos grandes soluções, que são a longifólia e a háquea. Estamos a desenvolver um projecto baseado no fogo controlado para ver se conseguimos controlar a háquea. A longifólia (austrália) é mais difícil, pois essa espécie exige um controlo contínuo, mas para isso precisávamos de apoios que não está a haver.

Nós estamos preocupados – e temos chamado diversas vezes a atenção da Autoridade Florestal Nacional – para ver se há alguma alteração na lei da criação das Zonas de Intervenção Florestal (ZIF), que são uma espécie de condomínio da floresta, em que a floresta poderá ser entendida num conjunto mais vasto, ou do concelho como um todo ou do concelho dividido em duas áreas, para que pudesse ser gerido de uma forma sustentável, pois com quintinhas pequenas não conseguimos gerir a floresta como deve ser.

Reportagem publicada no Diário do Minho, de 19 de Abril de 2010. Mais fotos aqui.

Família de Dem preserva tradição dos trajes “à lavradeira"

Antigamente, na Serra d’Arga, todas as casas tinham uma “máquina de fazer tecido”, designação que um menino usou ao ver um tear exposto no Centro de Interpretação.Com o fim da necessidade de tecer em casa, a maior parte dos teares formam abandonados ou mesmo desmontados. E, assim, esta actividade tradicional foi-se tornando cada vez menos frequente.

Há, contudo, um ateliê familiar que resistiu ao tempo e continuou a fazer do tear, da tesoura e da agulha uma ocupação complementar ao amanho da terra. A raridade e a qualidade dos trabalhos produzidos acabaram por fazer da oficina das irmãs Lurdes e Florinda Pires, de Dem, uma referência na produção de trajes tradicionais. A filha de Lurdes das Carvalhas (como é mais conhecida), Aida Martins, acabou por se juntar à equipa, dando um novo impulso ao negócio familiar.

Lurdes das Carvalhas, de 72 anos, conta que começou a trabalhar muito nova, obrigada pela necessidade de dar o seu contributo para o sustento da família. Só mais recentemente é que a artesã deixou de cultivar “as leiras” e se dedicou em exclusivo ao ateliê.

O trabalho ganhou fama e esta família mostra com indisfarçável orgulho o motivo pelo qual as peças se tornaram muito procuradas. A preocupação começa logo na procura da lã e dos tecidos mais genuínos e apropriados, mas estas artesãs desabafam que é «cada vez mais difícil arranjar os materiais». Apesar de seguirem os moldes tradicionais, cada peça é única e tem as suas próprias histórias para contar. «Tudo é feito à mão, fio por fio», sublinham.

Do tear da tecedeira Florinda Pires e das mãos de Lurdes e Aida saem fatos domingueiros ou de trabalho, que podem custar de 400 até 800 euros, dependendo do gosto do cliente. «Podem ser mais ou menos ricos», referem as artesãs, confidenciando que os ranchos folclóricos são clientes importantes.

Os vários tipos de fatos à lavradeira – os verdes, os vermelhos, os azuis e os cor de pinhão – são os mais procurados, mas também há quem queira adaptar os motivos tradicionais para peças mais actuais, como coletes bordados para usar com calças de ganga ou outras peças que dão um toque diferenciador, nomeadamente em festas. O ateliê já bordou vestidos de noiva, toalhas e outras peças. «Nota-se que as pessoas estão dar mais valor a este trabalho do que davam aqui há uns anos», assinala Aida Martins.

Reportagem publicada no Diário do Minho, de 19 de Abril de 2010.